858 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 217
correspondentes aos processos pendentes em mais de 500 000 contos. Quer dizer, se as dotações ornamentais se mantiverem na ordem dos 30 000 contos anuais, seriam necessários perto de vinte anos para se dar satisfação a todos os pedidos. E é preciso notar que constantemente estão chegando à mesma Repartição novos projectos e que muitos outros aguardam nas câmaras a oportunidade da sua remessa, o que julgam desnecessário fazer já por conhecerem de antemão a impossibilidade de serem considerados.
E os pavimentos, que dia a dia se vão arruinando na razão directa da intensidade do trânsito e do aumento de tonelagem dos veículos pesados?
Se continuássemos dentro do círculo vicioso em que temos vivido, chegávamos a uma altura - se não estamos já nela - em que o valor do desgaste produzido anualmente nas estradas era superior ao dos novos troços construídos.
É este mal, ou o seu agravamento, que a todo o transe se deve evitar.
Adiante direi o que penso sobre o assunto.
Sr. Presidente: os problemas abrangidos no aviso prévio em discussão são tantos e tão complexos que a sua apreciação não seria possível dentro do tempo prescrito no Regimento.
Considerando como o mais importante o que diz respeito à rede de estradas e caminhos rurais, é ele que mais detidamente vou apreciar.
O nosso ilustre e prezado colega Dr. Marques Teixeira, em certa passagem da sua brilhante intervenção, apresentou à Câmara números que eloquentemente demonstram a importância e a acuidade do problema em discussão.
Existem mais de sete mil povoações isoladas; cerca de um milhão de portugueses sofre as consequências desses isolamentos; a importância prevista para acabar com tal estado do coisas atinge mais de 1 500 000 contos. A extensão das estradas e caminhos a construir - acrescento eu - é da ordem de grandeza de 12 a 13 000 km.
Será com 30 000 contos anuais, concedidos pelo Estado, com a colaboração financeira dos municípios - na situação em que muitos se encontram - , que se pode enfrentar e satisfazer esta grande necessidade nacional?
Mas se tal solução não é de considerar, por impossível, qual então a mais aconselhável?
Segundo o meu modestíssimo parecer, o assunto só pode resolver-se desde que se conjuguem os seguintes factores:
a) Aumento das dotações do orçamento;
b) Conveniente aplicação das verbas concedidas ;
c) Melhoria da situação financeira dos municípios.
Ao apreciar o primeiro - aumento das dotações - vem-me à memória a sensação de contentamento e do justificado orgulho patriótico que senti ao tomar conhecimento do notável Plano de Fomento, aqui discutido e aprovado. Mas ao mesmo tempo lembro-me também da estranheza que me causou não ver nele incluída qualquer verba destinada a vias de comunicação, que, como todos sabem, são factores importantes do progresso económico.
No conjunto total dos investimentos, aquela verba representaria uma pequeníssima parcela, que em nada vinha prejudicar a execução integral do Plano.
Como assim não sucedeu, temos de aguardar confiadamente que o ilustre titular da pasta das Finanças ajude a resolver o problema, aumentando dentro das possibilidades as dotações orçamentais.
Devo informar VV. Ex.ªs de que não julgo necessário um aumento extremamente elevado, como já aqui se preconizou. Um aumento nessas condições daria, a meu ver, resultados contraproducentes, por as câmaras municipais não disporem de possibilidades financeiras e técnicas para acompanhar um acentuado aumento de construções. Conhecendo todos nós as dificuldades do Estado, não devemos ser ambiciosos no pedir. O óptimo é inimigo do bom, diz o povo. Peçamos pois o razoável, mesmo porque será mais fácil de alcançar.
Mas o que se considera, num trabalho de tamanha monta, o razoável? E, fixado ele, será esse razoável possível?
Permitirão as circunstâncias a inscrição no orçamento do Estado de uma verba anual de 80 000 a 100 000 contos pelo menos durante um quinquénio?
Francamente, não sei. Mas tenho a convicção de que, se fosse possível materializar este pensamento, o problema ficaria resolvido em meia dúzia de anos, pelo menos na sua parte essencial.
Confiemos, repito, na boa vontade e no espírito cheio de compreensão e de justiça do Sr. Ministro das Finanças.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Paralelamente ao aumento das dotações, é preciso dar a estas uma justa e criteriosa aplicação.
Não basta construir estradas o caminhos; torna-se igualmente necessário ir conservando os existentes.
As câmaras, assoberbadas com dificuldades de toda a ordem, não podem por si só manter nós seus concelhos um bom serviço de conservação. Um estudo levado a efeito pelos serviços de melhoramentos rurais em 1946 revelou que na conservação de 9 810 km de estradas municipais, ao tempo existentes no País, foram utilizados durante um ano 711 cantoneiros, 7 cabos de cantoneiros e 99 capatazes e encarregados, ou seja um homem para cada 12 km.
Num outro estudo, feito tempos depois, a extensão das estradas camarárias a cargo de cada cantoneiro baixou para - 10 km, o que é ainda inconcebível.
E quantas câmaras há que nem este sistema defeituoso podem manter, por carência de possibilidades?
O resultado é de todos conhecido. Abre-se uma estrada, na construção da qual o Estado e o município investiram avultadas quantias. Como a câmara não pode conservá-la convenientemente, ao fim de três anos começa a arruinar-se. Se o abandono persistir, a ruína total será inevitável, perdendo-se completamente as importâncias despendidas.
Infelizmente casos destes dão-se com frequência.
Impõe-se, portanto, que o Ministério das Obras Públicas, de posse dos moios financeiros que por corto lho serão facultados, estude e organize um sistema de reparação e conservação das estradas e caminhos municipais, comparticipando-os convenientemente.
Parece-me também que seria de grande utilidade a pavimentação a asfalto das estradas de grande movimento. Com a passagem frequente de viaturas pesadas de 12 t, 15 t e 20 t, não há pavimentos a macadame vulgar que se aguentem. O pavimento asfaltado, mais caro de princípio, resulta afinal económico, por ser mais duradouro.
Mas as câmaras não podem suportar semelhantes encargos, dirão VV. Ex.ªs Evidentemente que não, dentro do estado financeiro em que se encontram.
Há, portanto, que procurar melhorar a sua situação - como tantas vezes aqui tem sido solicitado -, não com o aumento das receitas, o que se me afigura dispensável, mas com a libertação dos encargos que fortemente as oneram e que são absolutamente estranhos à sua actividade.
Aliviem-se as câmaras das despesas efectuadas com a manutenção das escolas, com o fornecimento de mobi-