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28 DE JANEIRO DE 1956 383

Se tivermos em linha de conta em relação à erosão das serranias do Sul as consequências nocivas que já se acentuam nas férteis campinas do Algarve e quanto ao assoreamento das várzeas do Centro e do Norte do País, litorais ou interiores, o que representa em delapidação para as encostas serranas em cultivo arvense ou de plantas arbustivas o arrastamento pelas águas das chuvas de parte apreciável dos mais ricos horizontes superficiais desses solos, então podemos aperceber-nos da grandeza da área delapidada ao património português, aspecto que toma, presentemente, fácies de verdadeira catástrofe nacional.
E não se pense, acentuo, que o recuperar do perdido poderá verificar-se por via de um movimento no sentido inverso, dotado de igual rapidez.
Quanto a este aspecto, apenas mais a seguinte observação: os prejuízos consequentes do arrastamento por águas doidas dos horizontes superficiais dum solo, durante horas ou mesmo poucos minutos de chuvadas violentas, só poderá ser reparado após muitos séculos de lenta meteorização de subsolos estéreis e no caso mais acentuado durante períodos ainda mais longos de recuperação a partir das rochas desnudadas.
E não se diminua a gravidade do mal com a afirmação infundada, posta por muitos, da existência de reservas ainda vastas de baldios e incultos, susceptíveis de fácil aproveitamento arvense, pecuário ou outro.
Os inquéritos levados a cabo pela Junta de Colonização Interna demonstram, com evidência, que o que existe sob essa designação é já insuficiente para manter o bom equilíbrio da paisagem agro-florestal desses territórios montanhosos.
De nada nos servirá, pois, criar no espirito público a doce ilusão quanto à possibilidade fácil de acrescer níveis de existência rural em ambiente já tão empobrecido.
Quando se atingiu, como no nosso caso, já menos de l ha cultivável por indivíduo, quaisquer novas reduções de área agricultável, qualquer que seja o seu destino, constituem sempre aspecto de grande prejuízo para a vida da população.
Não será também, decerto, a emigração desmedida de mais de trinta milhares por ano, roubando à nossa economia os melhores e mais jovens artífices, que constituirá a fórmula de salvação para resolver o problema do excesso de bocas em relação às possibilidades actuais do seu sustento em alimentos fundamentais.
A indústria e uma agricultura progressivas necessitam exactamente de uma mão-de-obra válida, mão-de-obra que está hoje passando, em larga escala, através das malhas apertadas da rodo que selecciona a nossa, corrente emigratória.
As crises periódicas de falta de trabalho, que confundem os mais desatentos sobre as verdadeiras causas do mal, não se solucionarão, decerto, por esta via, pois a sua origem não está, na realidade, nos braços que existem a mais no ambiente rural, mas tão-somente no facto de a máquina e as normas de instalação das empresas agrárias e do granjeio da terra não terem ainda realizado a necessária quebra do ciclo vicioso que hoje ainda impede o acréscimo sensível da produtividade da nossa agricultura.
E assim é que, quando o racional aproveitamento das águas das chuvas, especialmente nos territórios do Centro e do Sul do País, generalizando o frutuoso exemplo de alguns, embora poucos, já espalhados por toda essa extensa região, facultar a transformação dos ciclos pobres duma agricultura de sequeiro em ciclos ricos duma agricultura em que as folhas de regadio permitam o máximo aproveitamento das condições ecológicas do conjunto, então se verificará, decerto, perspectiva mais fácil de resolução dos problemas da excessiva densidade demográfica e do nível de existência da população portuguesa.
A máquina não despertará, então, crises de trabalho e a mão-de-obra rural terá valioso aproveitamento nos inúmeros e variados trabalhos de granjeio de uma agricultura dotada de maior intensidade. E assim se promoverá a progressiva transformação duma agricultura cerealífera e de uma pecuária de resultados aleatórios, dependentes em grande parte da forma como decorrem as estações e tendo como precária defesa apenas uma silvicultura e arboricultura dispersas e, por vezes, um gado transumante, em uma paisagem agrária de exploração muito menos sujeita à inclemência do fortuito.
Bastará para tal que a área de regadio em relação ao conjunto da exploração faculte aquele suplemento de forragem verde e de possibilidades de realização de culturas melhoradoras várias que permitam acréscimo substancial das disponibilidades de matéria orgânica fertilizante.
Assim se tornará, progressivamente, mais segura a cultura do cereal panificável, bem como a produção de carne e de leite.
E então, sim, terá possibilidades de completo êxito a louvável intenção denunciada pelo Sr. Ministro da Economia no notável despacho de 18 de Novembro de 1955. Mas para tal será necessário também que sejam concedidas aos lavradores as indispensáveis condições de segurança económica, para que o trabalho do criador não seja feito em vão, evitando as consequências nefastas de um mercado de consumo diminuto, anarquizado ainda por uma oferta irregular e parasitado por uma inúmera legião de intermediários inúteis.

(Nesta altura assumiu a Presidência o Sr. Deputado Augusto Cancella de Abreu, que logo interrompeu a sessão por alguns minutos. Eram 17 horas e 15 minutos. Reaberta a sessão às 17 horas e 20 minutos, continuou no uso da palavra o Sr. Deputado André Navarro).

Sr. Presidente: após estas considerações preambulares, definidoras, em síntese, do meio em que se desenvolve o problema agro-pecuário português, questão posta com excepcional relevo pelo aviso prévio apresentado pelo ilustre Deputado Nunes Mexia, consideremos, mais em particular, os vários aspectos do momentoso problema do deficit de proteínas de origem animal o da forma como encaramos a possibilidade da sua resolução com aspecto durador.
E disse propositadamente déficit de proteínas de origem animal, pois na realidade não poderemos isolar este aspecto particular da produção pecuária, da produção de leite e de ovos e do importante sector económico da pesca, incluindo o valioso subsídio que representa para a alimentação do povo português o bacalhau pescado pela moderna e bem apetrechada frota nacional.
Na realidade, a variedade dos gostos do nosso consumidor quanto a este aspecto - havendo zonas no País com tendência bem marcada quanto a proteínas animais mais apetecidas- obriga, na apreciação do conjunto, a não pôr de parte a observação feita.
A simples enumeração das possíveis fontes de proteína animal que poderemos utilizar para a resolução do problema alimentar do nosso povo dá-nos uma medida do largo horizonte de possibilidades de resolução e este mesmo notavelmente acrescido pelo facto de se poder antever um acréscimo apreciável da pecuária bovina feita em moldes de elevada produtividade em diversos territórios africanos e insulares.
E, a acentuar ainda as possibilidades referidas, devemos mencionar a variedade dos climas, que permite o concurso simultâneo com o bovino dos gados suíno e ovino. Já não falando, embora também de apreciável (...)