626 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 201
Nenhuma dúvida de que a racionalização e modernização se impõem nas indústrias básicas e essenciais, que se deve trabalhar a preços moderados e produzir para o mercado.
Quem garante, porém, os preços?
Como vai o Estado obter contrapartida dos seus favores, dos auxílios em crédito s até das suas intervenções e ajudas?
A resposta está nas leis e na ordem financeira, mas elas não chegariam para corresponder a uma operação de concentração tão poderosa e inquietante como é a proposta.
A concentração em maior grau e grande escala, além de perturbadora do equilíbrio social estabelecido, torna, reparáveis certos métodos - o autofinanciamento exagerado, a associação e consórcio de grupos, as sociedades afiliadas e afins de fornecimentos ou integração, que dão aos enormes capitais disponíveis possibilidades de irradiação.
Se o corporativismo contém uma fórmula de equilíbrio, se o Governo realiza continuamente o interesse nacional, dificilmente se adaptarão os dois aos desdobramentos de potência, à existência de sobre lucros e ao comando económico dum estado-maior económico fora do seu âmbito ou à sua revelia.
O País só deve obediência uma vez!
A posição do Ministério das Finanças não pode ser facilmente discutida, nem criticada, senão depois de conhecidas e examinadas as leis especiais, considerados os processos financeiros e a evolução do Estado moderno e assim mesmo, por fim, descortinar, não um enigma, mas o ajustamento hábil e delicado que aos dirigentes é permitido, no geral da sua gerência.
Vejamos, por exemplo, a questão dos excedentes de receita ordinária postos a custear despesas extraordinárias.
A classificação das receitas e das despesas ordinárias e extraordinárias não é arbitrária ou caprichosa.
Dita-a a lei: o Regulamento Geral da Contabilidade de 1881, o Decreto n.º 5519, o Decreto n.º 15 465 e o Decreto-Lei n.º 27 223. Não cito todos.
As despesas são ordinárias ou extraordinárias, segundo o critério da transitoriedade ou da permanência, que, em certa medida, corresponde ao critério do tempo.
Ao passo que um Ministro de qualquer departamento pode por despacho, por operação material administrativa, por portaria, fazer inúmeras e grandes coisas, o Ministro das Finanças vive apertado entre as malhas jurídicas da contabilidade pública.
Mas esta arrumação de despesas e consignação de receitas obedece ainda a uma técnica financeira mais complexa e difícil, pois que parte do balanceamento genérico de equilíbrio para a utilidade reprodutiva das verbas e a vigilância da execução.
Em terceiro lugar, depois do direito financeiro e da técnica orçamental, há ainda a táctica, que corresponde a critérios de habilidade e inteligência financeira.
A cobertura de despesas ordinárias com meios extraordinários anuncia falência. Mas a inversa denota segurança.
Há nas despesas extraordinárias algumas que estão evoluindo e estabilizando-se mais do que se previa e desejaria, pois que se prorrogam por vários anos.
É uma táctica resistir ao desejo dos departamentos e dos quadros de converter em permanentes os seus gastos extraordinários. Isto não pode deixar de merecer o voto daqueles que, desejando uma política de investimento na maior escala possível, estarão de acordo em que se resista a invasão do orçamento ordinário por despesas militares dadas como transitórias e trabalhos públicos que, embora se repitam, não suo de todos oa anos.
O orçamento extraordinário tornou-se importantíssimo como criador de emprego e de consumos, mas seria difícil e até desequilibrado alimentá-lo constantemente com novos empréstimos.
Lembremo-nos de que é a existência de excedentes que nos qualifica aos olhos dos credores potenciais, que noutra atitude estariam se lhe fôssemos bater à porta apertados pela necessidade, como eu já vi, há tantos anos, e de que os Deputados mais jovens não se podem dar conta.
São ainda medidas, como a economia de 10 por cento em certas verbas, as previsões com excessiva cautela, que, diversamente do que se pode pensar, asseguram e canalizam enormes sobras, destituídas do significado que se lhes pretende dar.
E lembremo-nos de que é a conservação dum orçamento elástico a este ponto, já dificultado pela existência de imponentes para finanças, que é garantia duma mudança de rota no fomento ou dum alargamento construtivo na política de desenvolvimento.
O que nós precisamos não é de medidas drásticas, mas de pedagogia social: educar a poupança, canalizá-la, levá-la brandamente para o destino social, sem a fazer passar pelas caixas centrais da Fazenda.
Se está ociosa, não rende nem pode render, e, se não rende, como há-de pagar imposto?
A coordenação do Ministério
Este, um primeiro ponto; mas agora devo dar um esclarecimento que tende a desfazer certa confusão na matéria.
Tem-se proposto, defendido, e alguns dos estados avançados entraram nesse caminho - e eu, em 1950, há sete anos, fiz-me eco desse aperfeiçoamento -, a existência duma técnica política que, em certo modo, responde à ideia duma coordenação geral: a organização dum orçamento económico geral e a criação dum sistema de contabilidade nacional ou social.
Tal instrumentação teria em vista substituir à simples disciplina financeira e contabilista um regime de vida administrativa folgado que apanhasse todo o circuito e toda a estratégia económica geral.
Esta maneira de conceber e organizar está ligada não somente no equilíbrio financeiro, mas ao equilíbrio geral, particularmente ao previsto no artigo 31.º da Constituição; lida com o pleno emprego e a valorização integral dos recursos e aplica processos e regras financeiras ao domínio mais genérico económico-social.
Mas teria politicamente consequências a contabilidade pública, que, além da natural disciplina, tem sido instrumento útil da governação, ficar subalternizada pela nova contabilidade nacional ou, pelo menos, deslocada do Ministério das Finanças para a Presidência, do mesmo modo que já o foi o Instituto Nacional de Estatística, que veio a desdobrar-se na Comissão Técnica de Cooperação Externa.
Como se vê, trata-se de reformas da máxima envergadura, de que se pôde dar apenas à Câmara ligeiro