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226 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 70

Será de facto esta natureza complexa, pública e privada, a especial relevância assumida actualmente pela projecção política da nacionalidade e a compreensível restrição posta ao âmbito do futuro Código Civil que justificarão a solução agora preconizada, na peugada, aliás, do que se fez, por exemplo, em 1945, em França.
E passamos à segunda questão.
Abstraindo de terceiras fórmulas menos consagradas, como, por exemplo, a referida por Maury quanto a nacionalidade jure domicilii parentis, as duas fontes essenciais da nacionalidade originária são o jus sanguinis e o jus soli.
Todo o Estado, como escreveu o Prof. Ferrer Correia (in Revista de Direito e Estudos Sociais, ano m), sé forçado a preocupar-se com o número dos seus cidadãos, já que o seu poder e influência face aos demais dependerá em larga medida da massa da sua população. Mas a este problema da pura quantidade, de mais ou de menos, acresce sempre uma preocupação de qualidade; o número de súbditos raro interessará só de per si: há-de interessar também a homogeneidade e a coesão do agregado nacionais.
No dilema da quantidade-qualidade reside boa parte da diferença entre as legislações dos vários estados. Sabemos, por exemplo, da posição de uma Europa superlotada de população ou de uma América' Espanhola com largos espaços abertos ao labor do imigrante.
O sistema do Código Civil português não segue apenas o jus sanguinis. Para lá de certas- concessões ao jus soli, está mesmo uma utilização directa deste critério. Assim, são portugueses:

a) Os que nascerem em território português de pai estrangeiro, contanto que este não esteja ao serviço da sua nação (artigo 18.º, n.º 2);
b) Os que nascerem em território português de pais incógnitos de nacionalidade desconhecida (artigo 18.º, n.º 4).

No primeiro grupo estarão incluídos:

1) Os filhos legítimos de pais estrangeiros nascidos em Portugal;
2) Os filhos ilegítimos de pai estrangeiro, se apenas este os reconheceu ou os reconheceu simultaneamente com a mãe ou apenas em relação a ele foram judicialmente reconhecidos ;
3) Os filhos ilegítimos de mãe estrangeira que só por esta tenham sido reconhecidos (ou só em relação a ela judicialmente reconhecidos) ou tenham sido primeiramente reconhecidos pela mãe.

No segundo grupo estão:

1) Os filhos de pais incógnitos, operando aqui a presunção da nacionalidade portuguesa dos pais, e, portanto, reflexos do jus sanguinis;
2) Os filhos de pais de nacionalidade desconhecida, operando a presunção de que os pais são apólidas;
3) Os filhos de pais apólidas, numa aplicação indiscutível do jus soli.

A proposta agora em discussão mantém as linhas gerais do regime em vigor.
Ora, talvez seja oportuno trazer à discussão um aspecto que se me afigura de interesse: o da projecção no ultramar português do estatuto da nacionalidade.
Assistiremos nos tempos futuros a uma corrida mais acentuada para esses territórios.
O peso demográfico de certas regiões do globo- a começar pelo continente português e ilhas adjacentes-, a melhor adaptação do homem às regiões tropicais, a mais intensiva exploração dos recursos do continente africano, o próprio incremento aí do sector terciário, não só por razão das utilidades que cria, mas em consequência do progresso adicional que o desenvolvimento dos seus consumos pode gerar, estarão na base de maiores movimentos de população nacional e estrangeira para o ultramar.
Em que medida o novo. diploma poderá corresponder às exigências de tal condicionalismo?
Procuremos um exemplo que, além do mais, nos é querido: o caso do Brasil.
No período de 1851 a 1950 calcula-se terem entrado no Brasil cerca de quatro milhões e oitocentos mil imigrantes, dos quais um milhão quinhentos e quarenta mil italianos, um milhão quatrocentos e oitenta mil portugueses, seiscentos mil espanhóis, duzentos e trinta mil alemães e cento e noventa mil japoneses. Deste total, de cerca de cinco milhões de almas, calcula-se que um quarto retornou aos países de origem ou, de qualquer modo, voltou a sair do Brasil.
Proporcionando a nacionalidade brasileira a estes imigrantes ou, segundo o critério de lugar de nascimento, quanto aos seus filhos, o Brasil ajudou a cimentar aquela comunidade étnica que constitui para todos nós justificado motivo de orgulho.
O caminho seguido conheceu mesmo processos flagrantes de naturalização legal: o artigo 69.º, n.º 4.º, da Constituição Brasileira de 1891 decretou a nacionalização de todos os estrangeiros residentes no Brasil em 15 de Novembro de 1889, desde que não declarassem, no prazo de seis meses, após a entrada em vigor da Constituição, a vontade de conservar a nacionalidade originária.
Não curamos de discutir aqui estes expedientes excepcionais, que alguns autores, aliás, têm considerado como ofensivos do direito internacional e, consequentemente, extraterritorialmente inexequíveis.
Wollf, por exemplo, defende que «a liberdade dos estados em matéria de nacionalidade estaria limitada pelas formas tradicionais da sua aquisição e perda (aquisição pelo jus soli e o jus sanguinis, em razão de concessão de um cargo oficial; perda por imigração, pelo casamento, por aquisição de nacionalidade estrangeira, por sentença penal condenatória, etc.)».
Restringimo-nos, pois, aos processos normais.
Estará a proposta em discussão à altura de satisfazer os interesses nacionais, revelando-se ao mesmo tempo justa para os estrangeiros que, residentes no ultramar português, deram a estas províncias o contributo do seu esforço?
Ainda aqui a resposta se me afigura positiva.
A larga consagração do jus soli, feita na base I da proposta em discussão, permitirá aos filhos de- estrangeiros nascidos no ultramar a aquisição originária da nacionalidade portuguesa.
E quanto aos imigrantes estrangeiros?
A base XII mantém-se fiel à naturalização por concessão.
Dentro deste critério, não será difícil conciliar aquele espírito aberto que historicamente temos revelado nas relações com todos os povos e um mínimo de exigências que dão .dignidade à condição de qualquer homem que vem a este mundo.
O cuidado em salvaguardar esta dignidade estava já, por exemplo, patente na portaria do Ministério da Marinha de 28 de Janeiro de 1871 destinada aos governadores das províncias ultramarinas.

É com profundo agrado que vejo, de resto, consagrada [alínea e) da base XII] a necessidade de conhecimentos