844 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 114
E neste momento o império soviético está desferindo os seus mais rudes golpes de uma guerra fria sobre os principais baluartes da defesa ocidental.
Vejamos, assim, para melhor compreensão da estratégia e dos noções tácticas do inimigo -única forma de se organizar solidamente a nossa defesa-, o processo evolutivo em que se enxerta a acção comunista contemporânea.
Não constitui segredo para ninguém a existência de um movimento de índole comunista em Portugal. Qualquer observador atento às nossas realidades político-sociais pode verificar, na verdade, diversas manifestações dessas actividades subversivas.
Da leitura, mesmo que superficial, da imprensa clandestina comunista reconhece-se também imediatamente o grau de subserviência em que se encontram os seus agentes perante os dirigentes soviéticos.
Os panfletos clandestinos são na realidade, salvo raras excepções, simples traduções, por vezes inadaptadas ao nosso ambiente político-social, de publicações congéneres soviéticas, e em todas as palavras de ordem que difundem, declarações que proferem ou comentários que contêm encontra-se sempre marca inconfundível da direcção suprema do Kremelin. Os comunistas em Portugal não tentam assim, no prosseguimento de uma política subversiva, utilizar uma táctica de acção própria, não tomando qualquer posição definida sem terem prévio conhecimento da aprovação dos seus chefes moscovitas. E essa dependência total tem-se manifestado tanto mais claramente quanto mais decisiva se tem revelado a política nacional na intransigente defesa da civilização do Ocidente.
Vejamos um pouco de história deste movimento, para melhor nos apercebermos do sentido actual da sua evolução.
Desde que se constituiu, em 1921, o movimento comunista português procurou ligar-se desde logo estreitamente a Moscovo. E, assim, durante o período de 1921-1929 foram várias as delegações que partiram com rumo à capital da Rússia Soviética, quer por ocasião dos congressos do Komintern, quer ainda dos aniversários mais destacados da história do bolchevismo. Aí beberam as primeiras palavras de ordem. Como pagamento de visitas, o nosso país foi também visitado algumas vezes por vários agentes do aparelho internacional do Komintern.
Em 1929, depois da reorganização que o então secretário-geral Bento Gonçalves imprimiu ao movimento . comunista, este começou a intitular-se oficialmente Secção Portuguesa da Internacional Comunista (S.P.I.C.). As principais organizações satélites que criou então eram apenas secções portuguesas de organizações satélites comunistas internacionais: Comissão Intersindical (C.I.S. - secção portuguesa da Profintern), Federação Juvenil Comunista Portuguesa (F.J.C.P. - secção portuguesa da Internacional Juvenil Comunista), Liga dos Amigos da U.B.S.S., Liga contra a Guerra e contra o Fascismo e Socorro Vermelho Internacional. E em grande parte estas organizações satélites foram estruturadas com a ajuda eficaz de agentes estrangeiros. Em 1934, uma delegação portuguesa, presidida por Álvaro Cunhal, então secretário--geral da Federação Juvenil Comunista Portuguesa, foi de novo a Moscovo participar no VI Congresso da Internacional Juvenil Comunista e no ano imediato uma delegação presidida pelo secretário-geral Bento Gonçalves deslocou-se à U. B. S. S. para assistir ao Vil Congresso do Komintern e recebeu então pessoalmente de Dimitroff as directrizes para o trabalho subversivo a realizar em Portugal e, em especial, as normas para a criação de uma Frente Popular e ainda para a infiltração de elementos comunistas nos sindicatos nacionais e em outras instituições recém-criadas. A leitura da imprensa comunista da época revela bem como este movimento antinacional procurou atingir estas finalidades.
Com o desencadeamento da guerra civil de Espanha este movimento antinacional adquiriu, como era de prever, uma importância bastante maior no seio do comunismo internacional. Assim, o Bureau Latino do Komintern impôs, instruções precisas a respeito das tácticas a seguir em Portugal durante este agitado e crítico período para a civilização ocidental, período que o comunismo russo antevia como muito frutuoso para a sua estratégia.
Eram elas, entre outras, as seguintes:
a) Criar na opinião pública nacional um estado de espírito de simpatia pela luta dos vermelhos espanhóis, procurando esconder a origem comunista do movimento, para apenas realçar a luta pelos ideais democráticos;
b) Ajudar por todos os processos as milícias armadas dos comunistas espanhóis e as brigadas internacionais;
c) Sabotar qualquer eventual ajuda às tropas nacionalistas ;
d) Procurar estender ao nosso país a guerra revolucionária que se desenrolava já no país vizinho.
Para dar maior força a estas instruções, deslocaram-se especialmente a Portugal alguns agentes importantes do comunismo internacional, entre os quais um de pseudónimo «Pavel», que tomou virtualmente nas suas mãos a direcção do movimento comunista português. Por outro lado, outros dirigentes comunistas continuaram a seguir clandestinamente para a Espanha vermelha, e entre eles o Dr. Álvaro Cunhal, este tendo ido a Madrid especialmente com a missão de reunir os emigrados políticos portugueses numa única frente a favor do que dizia «a causa dos republicanos espanhóis». Aí tomou parte activa na noção das criminosas brigadas internacionais, que prenderam e assassinaram milhares de nacionalistas espanhóis. Que conste, foi essa então a única missão realizada com êxito por esse destacado dirigente.
Porém, continuava a ser preparada pelos comunistas portugueses, em grande parte, a execução das ordens moscovitas. E, assim, na madrugada de 8 de Setembro de 1936, rebentou a revolta de duas unidades navais roo Tejo e verificaram-se os atentados bombistas do dia 20 de Janeiro de 1937, bem como o planeado para o dia 4 de Julho do mesmo ano, todos eles decididos pela direcção internacional do movimento comunista. Dizemos em grande parte, porque nos dois últimos actos subversivos colaboraram também alguns elementos anarco-sindicalistas.
Mas a Polícia de Defesa do Estado estava vigilante. Foi prendendo, sucessivamente, todos os dirigentes do movimento antinacional português, quer nascidos em território pátrio, quer estrangeiros, e assaltando as sedes do movimento e as tipografias clandestinas. E assim é que no final do ano de 1938 podia considerar-se de facto que o movimento comunista em Portugal estava em grande parte desarticulado e tinha deixado de existir como um todo orgânico. No ano de 1939 o Komintern constatava este facto, isto é, que o movimento comunista português não tinha cumprido as intruções que lhe tinham sido dadas e não pudera assim defender, com suficiente vigilância revolucionária, o seu aparelho clandestino, e como consequência dessas faltas expulsa este partido do movimento comunista internacional.