846 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 114
palavras de ordem do comunismo russo. O M.N.D. foi assim apenas mais um instrumento da política da traição à Pátria dos comunistas nascidos no solo pátrio.
Mas o predomínio da política soviética em relação ao movimento comunista português vai-se revelando cada vez mais forte. Gomo nos fins de 1948 Estaline impusesse a todos os partidos comunistas do Mundo um acto de submissão absoluta, logo os seus párias portugueses escrevem no Avante! da 2.ª quinzena de Março de 1949:
« O povo português não pegará em armas contra a URSS e o exército soviético», e ainda o se o exército soviético, perseguindo agressores, atravessar as fronteiras de outros estados será recebido como libertador».
Assim, os comunistas portugueses não hesitaram em afirmar claramente que, se Portugal se erguesse com armas na mão para a defesa das suas fronteiras contra o imperialismo totalitário soviético, eles, digo, as hordas comunistas, estariam completamente ao lado desse imperialismo.
Em 1948 Moscovo, temendo, porém, os preparativos de defesa do Ocidente, que nessa altura se começavam a esboçar, lançou o primeiro movimento dos partidários, da paz por meio da organização satélite comunista: o Conselho Mundial da Paz. Logo também a propaganda da paz passa a ser a palavra de ordem do comunismo português e também das suas duas organizações satélites
- o M.N.D. e o M.U.D.J.
E em Julho de 1950 constituiu-se em Portugal a Comissão Nacional para a Defesa da Paz, após uma assembleia magna realizada numa escola particular de Lisboa.
E conforme um dos arautos dessa época, «o partido comunista português ... apoia sem reservas a comissão nacional para a defesa da paz e incita todos os seus militantes e simpatizantes a apoiarem igualmente sem reservas todas as iniciativas, etc.».
Foi de facto como candidato da paz que um antigo professor da Universidade do Porto se apresentou às eleições presidenciais de Julho de 1951, o que levou S. Ex.ª o Presidente do Conselho a declarar então:
«Como se explica ser a paz almejada por todos e constituir bandeira apenas de alguns?»
Não pode negar-se a ânsia s necessidade de paz sentidas em todo o Mundo. Quem fez a guerra, quem viveu a guerra, quem directa ou indirectamente lhe sofreu as repercussões económicas ou assistiu e participou nos inenarráveis sofrimentos a que deu causa não pode deixar de querer varrê-la da face do Mundo.
Com uma ingenuidade, porém, que abona os seus sentimentos pacíficos, mas não por igual forma a clarividência da sua política, as chamadas potências ocidentais pensaram atingir aquele objectivo desarmando e desmobilizando, enquanto a Rússia adoptara o processo mais realista e seguro de multiplicar as armas e reforçar as posições, não já como política de paz, mas como base de uma política de expansionismo e de hegemonia. E, tendo acontecido que muitos factos se encarregaram de matar as últimas ilusões acerca do que ela pretenderia, o Ocidente teve de rever as suas atitudes e começou o reforço intensivo dos seus meios de defesa. Então o objectivo russo da paz passou a ser prosseguido por duas políticas contrárias: uma por força da qual a Rússia comunista e os seus satélites se armam ; outra por meio chi qual se pretende que o Ocidente desarme. Esta é a política da paz, e quando prosseguida para cá do pano de ferro sinal do comunismo, bandeira da sua expansão.
E desta posição-base que havia de derivar a acção resta ate. Ninguém conhecedor dos dados fundamentais destas questões pode acreditar na .possibilidade de um governo comunista em Portugal. Pouco importa; havia de fazer-se o que se pudesse. O comunismo teria de ser um dos grupos aglutinados em Frente Popular e esforçando-se através dela por dissolver e fazer ruir, desde a moral à economia, as defesas da Nação. Sem falar em comunismo, sem decretar comunismo, sem operar, as grandes reformas agrárias, possivelmente mesmo evitando as nacionalizações, se não visse preferência em promovê-las para arruinar os respectivos sectores da produção, desviando o comércio para rumos convenientes, deixando cair a força armada, abrindo as portas à espionagem organizada através de representação diplomática e consular, a política do «candidato da paz» constituiria, com graves consequências imediatas ou futuras a que nem quero aludir, o grande serviço a Moscovo. Ela abriria uma falha no dispositivo ocidental de defesa e constituiria potencialmente séria ameaça para os planos desta.
O candidato da paz é também pela liberdade, sem dúvida a liberdade de preparar a sujeição a Moscovo. Mas, preparando e aceitando esta, evitaria ao menos a guerra? Meu Deus! Não. Tal política colocava-nos, pela sua cegueira, precisamente dos objectivos da luta, com o gravíssimo inconveniente de nos colocar do lado contrário àquele em que se situam os nossos interesses permanentes.
Contudo, a recolha de assinaturas para a propaganda da paz não foi apoiada com interesse por outros sectores da oposição demo-liberal e o Avante!, na sequência rígida da- política moscovita, inicia, como era fatal, o ataque contra todos os políticos que se recusaram, diga--se de passagem, patrioticamente, a fazer o jogo soviético.
A luta entre comunistas e não comunistas no seio da oposição acentuou-se então no período eleitoral de Outubro e Novembro de 1953. Novamente conhecidos oposicionistas são insultados no Avante! e entre eles o candidato às eleições de Fevereiro de 1949 e que se tinha submetido por completo ti sua política.
Entretanto tinha-se dado um facto da maior transcendência para o movimento comunista internacional: a morte do grande ditador de todos as Rússias, o marechal Estaline, anunciada ao Mundo em 5 de Março de 1953.
Em toda a imprensa clandestina portuguesa, exactamente como na, imprensa soviética, Estaline tinha sido até então incensado com os mas extravagantes elogios.
Na mensagem de condolências que o comité central do movimento comunista português enviou ao comité central do partido comunista da União Soviética e publicado no número especial dedicado a Estaline (n.º 176, de Março de 1953) lia-se, por exemplo:
A vida radiosa do grande e amado filho do povo soviético, do forjador, juntamente com Lenine, do invencível partido comunista da União Soviética, do seguro condutor das massas revolucionárias nos dias decisivos do grande Outubro, do genial estrategista do exército soviético na luta vitoriosa contra os intervencionistas, guardas brancos e invasores hitlerianos, do incansável defensor da pureza dos sólidos princípios do marxismo-leninismo e do internacionalismo proletário, do sábio construtor da sociedade socialista e genial construtor do comunismo - a vida de Estaline é um exemple magnífico, um incentivo poderoso e uma força mobilizadora das vastas massas populacionais na luta pela paz e pelo comunismo».
E na mensagem acrescentava-se:
«O partido comunista português garante aos trabalhadores portugueses e aos partidos comunistas irmãos que se manterá fiel aos ensinamentos de Lenine e de Estaline ... e que o povo português não participará numa guerra contra a União Soviética».