3 DE JUNHO DE 1959 851
também tomar posição sobre as partes dos demais projectos que podem inserir-se no mesmo quadro de ideias fundamentais que o informam;
Devolver para a discussão na especialidade as considerações e reparos que julgue dever fazer sobre as várias soluções concretamente gizadas no articulado dos projectos.
Deste esquema de acção extraio e individualizo hoje, precisamente, o projecto por mim oportunamente enviado para a Mesa, com o objectivo de dizer alguma coisa sobre as ideias mais vastas que o suportam e com que implica.
Antes, porém, de me deixar envolver na teia de considerações que girarão à volta do projecto que apresentei, quero ainda tocar num ponto preliminar.
A propósito da deliberação tomada por esta Assembleia no sentido de antecipar a revisão da Constituição, foi suscitada a questão de saber qual o preciso alcance e exacta interpretação do respectivo artigo 176.º e seu § 1.º, que regulam precisamente a matéria da revisão constitucional.
Houve quem - contra a orientação pressuposta como boa e conforme à Constituição pela Assembleia Nacional - sustentasse, por um lado, que a deliberação tomada foi redundante, uma vez que, à face desse artigo 176.º, já dispunha a Assembleia de poderes constituintes independentemente de qualquer deliberação concretamente dirigida a assumi-los e, por outro lado, que, se porventura assim não fosse, isto é, se realmente devesse entender-se não dispor a Assembleia desses poderes por determinação do corpo do artigo 176.º, então a verdade é que não poderia assumi-los ao abrigo do respectivo § 1.º, e isto pela circunstância de se não verificar a situação de facto condicionadora da aplicação e funcionamento da revisão antecipada prevista e admitida nesse parágrafo.
Dada esta divergência de interpretações, chegou a pôr-se ao meu espírito a hipótese de procurar esclarecer o problema, suprimindo quanto possível a possibilidade de discussão mediante uma adequada e mais precisa redacção dos referidos preceitos.
No entanto, visto o texto constitucional mais de perto e mais atentamente, convenci-me sinceramente não só de que esta Assembleia tinha necessidade, à face da Constituição, de deliberar assumir - como deliberou - poderes constituintes, mas ainda de que podia fazê-lo precisamente com base no § 1.º do artigo 176.º
Quer porque o problema não apresenta de momento relevo prático, quer porque a sua análise em profundidade conduziria explicàvelmente a deslocá-lo para um plano acentuadamente técnico mais compatível com o respectivo estudo em revistas da especialidade, pareceu-me indicado que para estas fosse devolvida a sua análise e apreciação.
O Sr. Carlos Moreira: - Muito bem!
O Orador: - De qualquer modo - é este o ponto que pretendo deixar vincado - não me pareceu que a interpretação do artigo 176.º e § 1.º da Constituição suscitasse dúvidas suficientemente, consistentes. Daí ter-me abstido de propor alterações de redacção a tais preceitos.
Feitos os resumidos apontamentos preliminares que resultam do que fica exposto, é tempo, Sr. Presidente, de dizer alguma coisa sobre o projecto de lei de alteração à Constituição que apresentei.
Parece-me ser evidente o espírito que penetra e a orientação geral que molda esse projecto.
A ideia suporte e fundamental que com naturalidade e sem esforço dele se extrai é esta: alargamento do âmbito da competência e das possibilidades de acção da Assembleia Nacional.
É certo que, bem vistas e ponderadas as coisas, essa ideia apenas frutificou modestamente no limitado número de soluções concretas que integram o projecto.
Por isso mesmo é natural que, se me fosse possível reelaborá-lo neste momento, outras aplicações e desenvolvimentos fizesse da mesma ideia-base, com inevitáveis reflexos, é claro, no traçado constitucional da posição relativa, mormente no plano funcional, dos diversos órgãos da soberania.
Porém, o limitado prazo e as especiais circunstâncias da minha vida particular em que tive de conceber e apresentar o projecto não me deixaram a possibilidade de fazer aquele estudo e meditação que, em consciência, reputo indispensáveis para honestamente tomar posição em quaisquer problemas, e designadamente naqueles que, como o da revisão constitucional, se revestem de uma importância e melindre que se torna redundante vincar e pôr em relevo.
Assim, apenas propus alterações que se me afiguraram, desde logo e com espontaneidade, resultarem de elementares considerações de razoabilidade, de atendíveis exigências das realidades e até de naturais implicações de lógica jurídico-política.
E justamente porque tais alterações se alinham num plano de relativa modéstia é que, desde que entre nós existe - e deve continuar a existir - uma assembleia política, reputo a aprovação das minhas propostas ou de outras de significado semelhante, embora apresentadas sob forma diversa, como uma necessária contribuição mínima para o devido e justo relevo constitucional, indispensável força de convicção e desejável eficiência da Assembleia Nacional.
Todavia, para além do que as soluções concretas enquadradas no projecto possam valer pelo que envolvem e em si mesmas significam no plano de estrutura e coordenação dos órgãos da soberania, parece-me isento de dúvida que terão um outro alcance, o qual, conquanto reflexo, nem por isso deixará de ser porventura o mais relevante e significativo.
que, quer se queira quer não - é um ponto que ultrapassa os limites de comando e contrôle da vontade -, o projecto de lei que apresentei, como, aliás, os demais, terá ainda o específico alcance de implicações mais vastas, que lhe será emprestado por esta Assembleia ao tomar posição e ao votar sobre ele. Realmente, a orientação que vier a ser adoptada não esgotará os seus efeitos em aprovar ou rejeitar mais um projecto do lei, mas antes, e até por virtude da respectiva incidência em determinado condicionalismo de facto, ficará a constituir um índice ou sintoma que contribuirá para permitir inferir uma certa posição de princípio e um determinado espírito e concepção quanto à maneira de encarar dados e realidades que não podem deixar de ser meditados e tidos em conta.
Disse há pouco que a ideia directriz das soluções propostas se cifrava num alargamento das possibilidades de acção da Assembleia Nacional.
Quem desprevenidamente olhar esta afirmação pode ser, um tanto explicàvelmente, conduzido a supor que o projecto arrasta consigo e envolve um problema de formas políticas no sentido de poder pôr em causa a própria estrutura essencial e característica do sistema que entre nós foi adoptado como processo de repartição e exercício do poder político.
Tal visão não seria, porém, exacta, por lhe atribuir uma dimensão que, dados os termos em que está e teve de ser concebido, a sua recolhida importância não comporta nem legitima.
É que constitui a própria evidência ser possível introduzir alterações na contextura e potencialidades de acção