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1064 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 126

Imaginem VV. Ex.ªs aonde iríamos parar se, no estilo do parecer, retirássemos aos vários órgãos e organismos do Estado todas as atribuições que não desempenham com a desejável diligência!
Adiante...
Passemos a mais um argumento do parecer da Câmara Corporativa.
Em toda a parte onde há governos estáveis e eficientes - diz-se no parecer - a regra é serem eles a monopolizar a iniciativa fiscal, ficando aos Deputados, como na Inglaterra, o papel de apoiar às medidas legislativas propostas e a função de controlar a actividade financeira do Executivo.
Neste ponto, e antes de mais, o parecer confunde inexplicavelmente duas questões, que, aliás, anteriormente, tão bem começou por distinguir e autonomizar: a de saber a quem deve caber a iniciativa das leis fiscais e a de saber quem deve ter competência para as aprovar.
A razão de direito constitucional comparado, agora em causa, só poderia valer relativamente à primeira dessas questões, e nunca em relação à segunda, que é a única que está em discussão.
Realmente, a Câmara Corporativa limita-se a acentuar o facto de, em regra, a iniciativa, repito, a iniciativa, da legislação fiscal caber aos governos, ponto que agora não interessa e implica com um problema entre nós já resolvido no sentido que se reputou ser o mais indicado.

O Sr. Melo Machado: - Muito bem!

O Orador: - Todavia, a par disso, como se reconhece no parecer, igualmente constitui regra generalizada não só terem também os Deputados o direito de iniciativa de leis fiscais, mas ainda serem as assembleias quem aprova essas leis.
Ora, visando precisamente a minha proposta a fazer aplicação desta regra entre nós, logo se vê como é contraproducente para o ponto de vista da Câmara a invoção da mesma regra, e isto pela singela razão de que constitui mais um argumento em abono da minha posição.
Sendo assim, como é que pode dizer-se -e di-lo o parecer - que nos outros países se caminha neste ponto para a solução entre nós actualmente vigente?
Como é possível, se se afirma que nos outros países são as assembleias que aprovam as leis fiscais e se entre nós tal pode não acontecer, e não acontece quase sempre?
Contradizendo as conclusões do parecer as premissas de que parte, é evidente o vicio de raciocínio que o afecta e de que enferma.
Nem se diga, como se faz no parecer, que os Deputados na Inglaterra se limitam a apoiar as medidas propostas pelo Governo.
Afirmar isto é pretender fazer uma aproximação de dados políticos flagrantemente inconsistente.
Esquece-se que na Inglaterra o Governo é, no fundo, como que uma delegação ou comissão executiva do Parlamento. O Governo é, digamos, o próprio Parlamento enquanto intervém na gestão dos negócios do Estado que exigem acção constante, directa e mais incisiva.
E se os Deputados se limitam a apoiar as medidas legislativas governamentais, isso não sucede, evidentemente, porque ao Parlamento caiba um papel apagado, mas apenas porque, sendo, por virtude do próprio mecanismo constitucional, o Governo uma mera emanação da maioria parlamentar, não pode deixar de ter, em princípio, o apoio dessa maioria que nele delega.
Porém, por isso mesmo, porque é assim, o Governo está sempre em contacto com a maioria delegante, para ter em conta a sua posição e orientação política, porque
se o não fizer pode deixar de ter o seu apoio, e, em consequência, ver paralisada a respectiva acção e até deixar de ser Governo.
Acresce, além disto, que, decorrida a legislatura, todos, maioria e Governo, suportarão, no que respeita a posições de comando político, os efeitos de uma actuação porventura menos conforme à vontade da comunidade nacional.
Será talvez caso para dizer que o Parlamento não toma a iniciativa de certas medidas legislativas apenas porque, através do jogo das maiorias reflectido no Executivo, as toma todas.
Creio que não vale a pena ir mais longe nesta análise.
O termo de comparação escolhido pelo parecer, logo fixado num regime parlamentar, é de uma infelicidade manifesta.
É que os confrontos só podem elucidar alguma coisa quando encarados os respectivos textos constitucionais no conjunto das disposições que os integram, e, portanto, na mecânica global das correlativas estruturas políticas, por modo a obter-se uma visão exacta e correcta da posição relativa dos vários órgãos da soberania, na sua intensidade política, recíproco condicionamento e doseado equilíbrio.
Amputar artificialmente de todo uma disposição constitucional, ou uma determinada situação de facto que à sombra dela germinou e vive, é querer desconhecer um principio elementar e fundamental de direito - e até de toda a actividade do conhecimento - que manda ter em conta toda a sua contextura para, através da análise, aproximação, coordenação e confronto dos textos do sistema se poder determinar o exacto sentido e verdadeiro alcance das disposições legais que estiverem em causa. Em duas palavras: essas disposições não vivem em compartimentos estanques, mas dentro de um sistema, no rigoroso significado da expressão.
No parecer esqueceu-se isto, argumentando-se à base de uma superficialíssima análise e enganadora aparência resultante de se aproximarem dados políticos que se situam e movem em planos e esquemas políticos diferentes.
Aliás, se quisermos tomar o argumento em si mesmo, na sua configuração meramente formal, cumpre concluir que também ele redunda em benefício do meu ponto de vista.
Na verdade, a experiência mostra que a Assembleia, em regra, apoia as iniciativas do Governo. Sendo assim, porque não lhe dar competência exclusiva quanto à aprovação de leis fiscais para as coisas se passarem, formalmente, repito, tal qual como na Inglaterra, já que, segundo parece, se considera boa a solução adoptada nesse país?
É preciso ser-se coerente. Os sistemas políticos constituem um todo. Assim, afigura-se-me menos elegante repudiá-los e, de seguida, quando parece convir relativamente a um ponto concreto, ir «beliscá-los» aqui e ali para deles extrair argumento em beneficio próprio.
Derivo agora para mais uma das razões do parecer.
Acrescenta-se nele que, aprovada a minha proposta, o Governo poderia, durante o período de funcionamento da Assembleia, debater-se com a inércia ou demora desta na votação das medidas tributárias julgadas indispensáveis ao interesse público.
VV. Ex.ªs ajuizarão se valeria a pena perder tempo com argumentos deste teor.
No entanto, sempre direi qualquer coisa.
Já observei que a nossa experiência constitucional não fornece base a argumentos deste tipo e que, se quisermos falar de incúria, há sempre um pouco por toda a parte.
Assim, esta alusão é, além do mais, injusta, e quem reparar na maneira como é repetida pode ficar com a