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2 DE JULHO DE 1959 1095

O Sr. Ramiro Valadão: - Estou inteiramente de acordo com o que V. Exa. acaba de dizer, mas o que não posso é aceitar a maneira como o faz ...

O Orador: - Eu não compreendo a intervenção de V. Exa., porque o não envolvi pessoalmente nas minhas considerações. Disse que se confunde, e tenho, visto aqui confundir representação e soberania.

O Sr. Ramiro Valadão: - Concordo com as conclusões de V. Exa., mas só não concordo quando V. Exa. diz que nós confundimos ...

O Sr. José Saraiva: - Só pedia a V. Exa., Sr. Dr. Cerqueira Gomes, que realmente harmonizasse essa doutrina, que é aliciante, com o preceito de que a soberania reside na Nação e tem por órgãos o Chefe do Estado, o Governo e a Assembleia Nacional.

O Orador: - Eu já lá vou.

O nosso regime não é uma monocracia absoluta nem um presidencialismo puro; é um presidencialismo bicéfalo, como diz o Prof. Marcelo Caetano. O Presidente governa por intermédio do Presidente do Conselho, a quem dá a liberdade de acção.

O Sr. Carlos Moreira: - Mas, então, é uma monocracia ou unia bicefalia?

O Orador: - Há uma ascendência do Presidente.

O Sr. Carlos Moreira: - Então é monocracia.

O Orador: - As coisas da política têm de ser vistas com aquilo que o grande Pascal chamava «espírito de subtileza». E monocracia, mas moderada.»

O Sr. Carlos Moreira: - O orador é tão subtil que eu raramente o entendo. Deve ser, com certeza, por deficiência minha.

O Orador: - Regimes temperados são aqueles que do algum modo atenuam o absolutismo do seu princípio. Tem pouco que entender.
Como disse e é, o que pretendo, antes de titulo, destacar, ó que o espírito e a linha geral das alterações propostas são abertamente contrários ao sentido político da nossa Revolução e ao espírito do Regime.
Foi contra a desordem que alastrava, desenfreada, em todos os planos da vida nacional que se ergueu o levante do 28 de Maio. E a desordem, ainda que decorrente de múltiplos factores, tinha como uma das causas primaciais a incapacidade do Estado, roído pelas taras s misérias do regime parlamentar.
Na lógica da nossa Revolução construtiva instaurou-se uma ordem constitucional, que deu ao Poder possibilidades de governar com eficiência e alto sentido nacional. A nossa estrutura de poderes perfila-se como uma pirâmide, que tem no vértice o Chefe do Estado. E uma monocracia moderada - temperada, aconselhada, fiscalizada, limitada.
Temperada, no seu princípio, pelo carácter bicéfalo da presidência ou, até, a fórmula mais moderada, ainda, Je presidencialismo do Primeiro-Ministro. O Chefe do Estado, ainda que órgão supremo do Poder, não o exerce por si, mas por intermédio de um governo da sua nomeação e perante ele responsável. Temperada ainda pela necessidade de referenda para quase todos os actos presidenciais e pela atribuição de algum poder soberano à Assembleia Nacional.
Aconselhada por diversos órgãos, alguns de alta qualidade e exercício regular - o Conselho de Estado, a Câmara Corporativa, a Assembleia Nacional e os vários conselhos técnicos que se dispõem à volta do Poder.
Fiscalizada pela Assembleia Nacional, em sessões públicas e divulgadas pela imprensa, e até pelos simples cidadãos, que, constitucionalmente, têm o direito de s representação ou petição, de reclamação ou queixa perante os órgãos da soberania ou quaisquer autoridades, em defesa dos seus direitos ou do interesse geral».
Limitada pela ordem corporativa, que reconhece, no plano territorial e das actividades sociais., a, existência de corpos autónomos, com as suas funções próprias e os seus direitos e instituindo, assim, em face da soberania política, pertencente ao Estado como órgão do bem público, uma verdadeira soberania social, salvaguarda das liberdades dos indivíduos e dos grupos primários.
As modificações propostas no projecto de lei em discussão alteram gravemente esta estrutura de poderes. Entra-se francamente na preponderância da Assembleia. Porque não é só a valorização da Assembleia Nacional que se sugere - e já seria muito.
JS uma o acentuada e consistente supremacia legislativa que permita interferir e influenciar a orientação governamental». E o primeiro inequívoco da função legislativa; mas é também a ingerência na direcção política do Estado, a subordinação do Governo ao poder da Assembleia.
E mais: porque o Governo é a projecção da autoridade do Chefe do Estado, por ele designado e perante ele responsável, é a autoridade e o prestígio do Chefe do Estado, a toda a hora, à mercê dos humores da Assembleia. Assim se desvirtua de forma e subverte toda a estrutura dos poderes, tal como se define na nossa ordem constitucional - ordem constitucional à sombra da qual temos fruído estes anos de paz. e segurança e nos deu a possibilidade de uma obra prodigiosa de restauração, em todos os planos da nossa vida pública -, consagração experimental da sua adequação ao condicionalismo da realidade portuguesa.
Não será com o meu voto que se irá entrar nesse caminho aventuroso.
Não será sem o meu clamor que se há-de inverter o sentido da nossa Revolução Nacional.
Tenho dito.

O Sr. Carlos Lima: - Sr. Presidente: a intervenção que acaba de fazer o Sr. Dr. Cerqueira Gomes foi concebida e orientada em termos que representaram a desnaturação deste debate.
S. Exa. não discutiu o problema que está em cansa, isto é, a questão de saber se a Assembleia Nacional deve ou não ter competência legislativa exclusiva em matéria de impostos. Pretendeu discutir vários princípios e ideias que estariam em conexão com o meu projecto, produzindo uma série de afirmações que não posso deixar de, imediatamente, analisar.
Já não é a primeira vez que, a propósito do projecto do alteração à Constituição que entendi dever apresentar, ouço as palavras a parlamentarismo», «demoliberalismo» e outras do mesmo género, ouço aludir aos perigos da desordem, ouço referências a uma série de alarmantes desgraças que, segundo parece, estariam inerentes às minhas modestas propostas.
É claro que, até este momento, apenas tenho ouvido afirmações, mais ou menos claras, de que o projecto tem tendências parlamentaristas, de que pode conduzir às desgraças do parlamentarismo, etc. Mas o que ainda ninguém demonstrou, nem mesmo tentou demonstrar, é porque é que ele tem tais tendências, como e onde é que elas se manifestam.
Procurei, além do mais, fazer um trabalho sério de interpretação constitucional, provando que o projecto