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2 DE JULHO DE 1959 1099

extraordinário que a sua presença aqui representa, presença e contribuição dadas em condições da sua vida particular de tal maneira difíceis que podemos dizer que S. Exa., com este seu acto, muito se honra a si mesmo e muito nos honra a todos nós.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A primeira consideração é a de que este debate está a ser como os novelos: à medida que se desenrola, vai-se tornando mais emaranhado e mais confuso, afasta-se dos objectivos iniciais e perde até a sua utilidade.
Ouvi ontem -e já hoje também- as opiniões expenderem-se em perspectivas que, na realidade, o problema não comporta. Ontem houve oradores preocupados com saber se a intervenção obrigatória das assembleias representativas em matéria de impostos estaria ou não autorizada por uma constante tradição histórica.
Penso, realmente, que a lição do passado pode iluminar o presente, mas não julgo que a matéria esteja nesse caso. Num período curto da nossa Idade Média vemos que o rei pedia o assentimento dos povos quando queria lançar impostos novos, especialmente no caso de pedidos pecuniários, visto que quanto aos impostos indirectamente cobrados ou aos serviços nunca tal assentimento foi necessário. A exigência de assentimento processou-se em relação às quebras de moeda, e no respeitante a matéria tributária constitui mais uma aspiração dos povos que uma realidade. E durante os séculos XIV e XV que se podem encontrar afirmações desse direito popular, aliás intercaladas de episódios que, em sentido contrário, provam que os reis nunca plenamente o reconheceram.
Mas a explicação desse assentimento parece-me estar sobretudo no facto de, então, a Fazenda Real não ter rigorosamente o carácter de Fazenda Pública; era do erário real que saíam todas as despesas públicas, mas isso não excluía certo carácter de património particular. E, quando o rei precisava de dinheiro e de lançar novos impostos sobre a população, sentia por vezes a necessidade de explicar que eles se destinavam a fins de interesse público; os casos de recusa de autorização que conhecemos traduzem todos a ideia de que os povos não reconheciam que a despesa prevista correspondesse ao interesse nacional. Por isso mesmo, quando no século XVI se verificaram grandes progressos na administração financeira, deixou de se observar aquele pedido de autorização.
Portanto, não é na perspectiva histórica que encontramos a solução do problema.
No debate de hoje tentou-se encontrá-la num esmiuçar das perspectivas políticas. O rumo dado à discussão surpreendeu-me profundamente. Como novo que sou, vinha persuadido de que as normas a observar na discussão eram as que constam do Regimento, que diz no artigo 38.º:
(Leu)
Pareceu-me, portanto, que era matéria definitivamente ultrapassada - por constituir discussão na generalidade - aquela que hoje veio aqui pôr-se ao nosso espírito.
Penso mesmo que certas questões suscitadas não estão implícitas na economia do debate que nos está sujeito. Não se pode efectivamente pôr a questão, como ontem ouvi pô-la, de que quando o Governo propõe uma solução ela é, necessariamente, melhor que a da Assembleia, nem se pode dizer, em sentido contrário, que quando a Assembleia entende que uma solução é boa ela é, necessariamente, melhor que a do Governo. A única posição legítima a tal respeito é a de que o interesse nacional exige que todos os órgãos da soberania, nos seus respectivos planos, desempenhem as funções que a lei lhes confere.
Há que resumir e clarificar a questão.
Afinal, de que se trata? De votar se a criação de impostos deve, ou não deve, ser da competência exclusiva da Assembleia.
O problema não me parece tão complexo como tenho ouvido pô-lo.
Julgo que é líquido, e pode ser afirmado, como questão arrumada, que a função legislativa pertence hoje, em pé de igualdade, ao Governo e à Assembleia Nacional, apenas com a especialidade de que um certo conjunto de matérias - as do artigo 93.º - são de competência reservada da Assembleia Nacional.
O princípio é este: assente que toda a vasta zona sobre a qual a competência legislativa se pode exercer tanto pode ser disciplinada normativamente pelo Governo como pela Assembleia, pergunta-se se entre as matérias que deverão ficar reservadas à Assembleia se devem incluir os impostos.
A matéria dos impostos reúne a especialidade e importância suficientes para que deva ser incluída no artigo 93.º ou deverá, antes, ser mantida dentro do domínio geral?
E esta a questão posta, e mais nenhuma.
Por um lado, é certo que a matéria tributária, pela sua incidência económica e social, tem o mais vasto alcance, e nas revoluções que se fazem de cima para baixo a política fiscal pode ter importantíssimo papel a desempenhar.
Mas também é certo que há matérias cuja importância social não é menor, designadamente as bases do regime de família, toda a matéria contratual, das sucessões mortis causa, de propriedade, sobre as quais o Governo pode exercer amplamente a sua competência legislativa e que ninguém pretende sejam abrangidas pelo artigo 33.º E isto significa que não é o facto de essa matéria legislativa ser de grande importância que pode servir de critério para decidir se ela deve ser sujeita ou subtraída à competência exclusiva da Assembleia.
Mais que à importância, é à natureza especial de cada domínio que se deverá atender.
Terão os impostos especialidade, pela sua repercussão económica e social, para se entender que o orgão representativo deve ser o único a pronunciar-se a seu respeito? Quem entender que tem essa especialidade terá de votar a sua inclusão no artigo 93.º Para quem entender que não tem, ela ficará excluída.
Deste modo, fica posto o problema de forma simples e sistemática, excluindo essas vastas peregrinações pelas regiões da história ou da política, que, a pretexto de esclarecer, trazem o risco iminente de confundir.
Tenho dito.

Vozes: - Muito bem!

O Sr. Presidente: - Continua em discussão.

O Sr. Mário de Figueiredo: -Sr. Presidente: não vou demorar muito a exposição que entendo dever fazer à Câmara. Quero começar por cumprimentar o Sr. Deputado Carlos Lima pelo facto de ter trazido ao debate, a propósito da revisão constitucional, as questões que têm sido profusamente discutidas.
Desejaria cumprimentá-lo não olhando à pessoa, mas ao trabalho que produziu apenas; mas não quero deixar, ao mesmo tempo, de dizer que, se o trabalho não tivesse a altura que, na verdade, teve, as suas qualidades de simpatia pessoais eram capazes de me conduzir a dizer-lhe o mesmo que lhe disse, não considerando senão objectivamente o trabalho.