420 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 197
É já um estafadíssimo lugar-comum o afirmar-se que a situação financeira das câmaras municipais apresenta impressionantes aspectos de desoladora debilidade!
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - Está dito e redito que aos municípios se talhou e delimitou posição de tal maneira subordinada a artificiosos princípios de centralização e de telecomando que estes, vitimados pelas fortíssimas inibições emergentes de tal sistema, têm sido forçados a quedar-se em inércias de todo o ponto prejudiciais, deixando avolumar cada vez mais os grandes problemas que lhes cumpria resolver.
Vozes: - Muito bem!
O Orador: - A despeito de andarem completamente denunciados todos os grandes inconvenientes desse sistema insuportável, aliás reconhecíveis nas grandes manifestações da vida nacional em que tanto se estão patenteando, ainda não foi possível encontrar-se a solução harmónica que se impunha.
Tem-se persistido na política de deixar que os municípios resolvam os problemas próprios e os alheios, contando apenas com uma estrutura financeira que até para os primeiros já é manifestamente insuficiente, mas conferindo aos segundos uma inteira prevalência.
Assim se tem complicado toda a vida local e desencorajado iniciativas que eram absolutamente indispensáveis.
Daqui resultou, como consequência necessária, uma grande parte dos atrasos a que se chegou, não só no capítulo da viação rural como ainda no do abastecimento de água, redes de esgotos, electrificação e outros importantes capítulos que têm decisiva importância nos meios rurais.
Desprovidos dos meios necessários ao normal desempenho das suas importantíssimas missões específicas e sendo forçados a suportar encargos relacionados com es grandes problemas nacionais, os municípios não tem podido corresponder ao irreprimível desenvolvimento das crescentes necessidades da vida local.
Na verdade, as suas ancilosadas finanças, submetidas às torturas do apertado regime tributário que se lhes traçou e mercê do qual têm estado ausentes das grandes fontes do rendimento nacional, mostram que dos 303 municípios em que está integrado o território nacional apenas 25 têm arrecadado receitas ordinárias anuais superiores aos 5000 contos, tendo 150 rendimentos de 1000 até 5000 contos; e, finalmente, que 128 não superam aquela importância de 1000 contos.
Se se considerar que destes últimos 29 não atingiram 500 contos e que dos 99 restantes muitos em muito pouco os ultrapassaram, teremos uma primeira visão das grandes razões que se têm denunciado e para as quais não foi ainda tentada a solução eficaz. Se se considerar ainda que no número tão grande das câmaras que sofrem de maior debilidade financeira se encontram aquelas que governam em regiões ainda não suficientemente desenvolvidas e que as suas receitas normais se encontram comprometidas em metade ou em um pouco mais só no pagamento das despesas com pessoal, encontraremos as grandes fontes dos denunciados atrasos, que, a não se eliminarem as causas que os originaram, se avolumarão cada vez mais até atingirem uma situação difícil de prever!
Mas, a par do pequeno volume das suas receitas, condicionado pelas restrições que o Estado lhes impõe para que não sofra diminuição a forte concentração fiscal que a seu favor decretou e teima em manter inalterado, sofrem ainda as câmaras municipais em geral e as mais modestas muito especialmente de um avantajado número de exigências que perturbam o normal e desejado ritmo da sua vida.
Bem conhecidas são elas para que se torne necessário enumerá-las.
Na verdade, a cargo das câmaras se tem deixado a satisfação de encargos que de nenhuma maneira lhes deviam pertencer, dado que eles não cabem na sua estrutura específica; são grandes necessidades nacionais que não podem ser desigualmente tratadas segundo o poderio financeiro das autarquias.
É entre todos o caso flagrantíssimo dos encargos com a hospitalização e tratamento de doentes pobres.
A luta contra o sofrimento e o melhoramento das condições dos doentes não podem ficar à mercê da pequenez das receitas municipais.
Onde quer que a doença se manifeste, há que combatê-la com a plena eficiência dos modernos métodos de luta de que a medicina dispõe.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Ora, no estado actual deste importante problema, porque se está a exigir aos municípios uma percentagem muito avultada das suas minguadas receitas, restringe-se-lhes danosamente a sua capacidade de realização.
Mas às despesas com a saúde pública outras, muitas outras, acrescem, igualmente fora do âmbito das possibilidades da vida local.
O Estado isentou-se do pagamento de impostos aos municípios, mas exige que estes lhe paguem muitos e variados tributos e concorram com substanciais prestações para a manutenção dos serviços que vai criando.
Como exemplos típicos deste singular tratamento está o regime da instalação dos serviços de finanças, dos serviços de justiça e de mais alguns outros da estrutura do Estado.
São as câmaras que têm de providenciar para que em cada concelho a secção de finanças e a tesouraria da Fazenda Pública e os restantes serviços fiquem instalados e a funcionar da melhor maneira possível.
As câmaras municipais instalam-nos, mobilam-nos, dão-lhes energia eléctrica e o mais que é necessário e até tiveram de, ainda há pouco, montar telefone aos serviços de finanças!
Em contrapartida, quando nessas repartições se faz a cobrança dos adicionais que sobre as contribuições e impostos gerais da Nação pertencem aos municípios, e constituem até a fonte mais importante dos seus réditos, ali se cobra e desconta para os cofres do Estado, além de outras alcavalas de variada configuração, uma percentagem sobre os rendimentos ilíquidos arrecadados que varia entre 4 e 2 por cento segundo o volume dessas cobranças e a percentagem fixa de 5 por cento sobre a contribuição predial rústica que se destina ao conhecido Fundo de Cadastro, pelo qual se suportam os encargos das avaliações da propriedade rústica já feitas e a fazer.
Por outro lado, como já sucedera com o levantamento aerofotogramétrico do País, que foi pago pelos municípios segundo um sistema de repartição inexoravelmente fixado, também aos municípios tem cabido suportar os avultadíssimos encargos dos censos da população, o último dos quais ainda está em trabalho. Estas despesas bem demonstram a posição de forte sobranceria assumida pelo Estado perante os municípios, confirmada, aliás, quando nada lhes paga pelos muitos serviços que estes lhe prestam quer cobrando-lhe por sua vez avultadas taxas em conjunto com as suas receitas próprias, quer praticando as mais variadas missões que de todos os lados lhes são pedidas, como sejam as relacionadas com os