850 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 215
em prática no sector agrícola, ou sejam a assistência técnica, i, investigação cultural, a defesa fitossanitária, o, aliás, .proficiente e útil trabalho das estações experimentais de ensaio de formas culturais, os serviços de selecção e fornecimento de sementes à lavoura, etc.
Toda a acção dos departamentos estaduais e dos técnicos, que, numa actualizada e inteligente interpretação do que deve ser o seu labor, cada vez mais se aproximam da lavoura para esclarecer e orientar, trocando o isolacionismo doa trabalhos de gabinete, que em tempos erradamente se praticou, por um convívio com os lavradores e com os trabalhos do campo - toda essa nova actuação dos técnicos é altamente benéfica, mas, tal como sucede com as restantes providências de intervenção estadual apontadas, não resolve o problema imediato e urgente da actual crise da lavoura.
Vozes: -Muito bem, muito bem!
O Orador: - Quanto a mim, julgo que, além das medidas comidas nos planos de fomento que forem sendo executado:), é indispensável acudir urgentemente à nossa lave ura com providências imediatas, cujo estudo devemos solicitar ao Governo, e de entre as quais me permito salientar, como de mais oportuna aplicação,, as duas seguintes: alargamento, facilitação e redução das taxas do crédito agrícola a conceder através das operações de crédito agrícola individual e mútuo da Caixa Nacional de Crédito, e ainda a revisão dos preços dos produtos agrícolas sujeitos a tabelamento.
Esta é a intervenção de urgência, a transfusão de sangue de que carece a grande doente - a lavoura - para se salvar da crise presente. Ela não dispensa, como é óbvio, a aplicação, a mais largo prazo, de toda a série de planificações e reformas de estrutura, visando substituições de culturas, novas actividades pecuárias.
Todas essas medidas legislativas, assim como a mais directa e imediata acção de assistência técnica que se está exercendo, não nos deve impedir de considerarmos necessária e justa a revisão dos preços dos géneros tabelados, tais como o trigo, o milho, o centeio, a cevada e o arroz, assim como um sério estudo e actualização do regime de transacções e .preços relativos ao abastecimento d 3
carnes.
Na verdade, se compararmos a evolução dos preços dos produtos agrícolas com a de todos os restantes produtos, matérias-primas ou manufacturados, verificamos imediatamente a baixa percentagem em que os primeiros têm aumentado.
Os factos mostram-nos como as actividades agrícolas, de há anos para cá, estão pagando um pesado ónus à colectividade, mediante o sacrifício das suas necessidades económicas às exigências políticas da estabilização de ]trecos e do combate à inflação. Penso que o peso deste sacrifício tem sido demasiado e que o seu prolongamento ameaça a própria existência da lavoura, cuja ruína não poderia deixar de ter repercussão na ordem e na paz social de que a Nação tem desfrutado e que cada, vez se tornam mais necessárias.
Não quero roubar demasiado tempo à Assembleia exibindo aqui longas estatísticas para documentar a inferioridade da situação da lavoura perante o agravamento dos custos de tudo o que ela carece para o seu labor produtivo. Limitar-me-ei, por isso, a duas ou três citações numéricas. Vejamos, por exemplo, o quadro de formação e evolução do produto bruto nacional inserto no relatório da Lei de Meios ultimamente votada. Ao passo e se o produto bruto nacional sobe, desde 1955 para 1959 de 2 para 4,5 por cento, ao mesmo tempo que se verifica terem subido em percentagens por vezes mais altas diversos sectores da nossa actividade económica, mostra-nos esse quadro que o sector agrícola, que já em 1958 descera de 6,3 por cento, baixou ainda em 1959 de mais 3,4 por cento.
Simultaneamente podemos examinar no relatório do Banco de Portugal de 1959 - que constitui, sem dúvida, um elemento de estudo ponderado, criterioso e digno de toda a confiança -- u evolução do índice de preços por grosso, com a base de 100 referida a 1948, que nos indica para o citado ano de 1959 os seguintes índices:
Alimentação (onde naturalmente estão incluídos os principais produtos agrícolas), 115 matérias-primas não alimentares, excepto combustíveis, 153; combustíveis e lubrificantes, 114.
Mostram-nos estes números que, ao passo que os produtos da agricultura devem ter subido de preço, desde 1948, na percentagem de 15 por cento, todos os restantes produtos, tais como os combustíveis, as máquinas agrícolas e viaturas, os adubos, os artigos de consumo individual, etc., sofreram aumentos, no mesmo período de tempo, que atingem, em certos casos, os 50 por cento. Mas esta disparidade torna-se muito mais evidente se considerarmos, como não podemos deixar de considerar, que já na .data tomada para base daquele estudo - 1948 T- o desnivelamento em prejuízo da agricultura era extremamente volumoso. Agravou-se, portanto, mais a situação, sendo os dados ainda mais expressivos.
Se esta relativa - artificial e forçada - estabilização de preços é um dos motivos do mal-estar da lavoura, a verdade é que não constitui o único: sobretudo nos últimos anos, veio agravá-la a acentuada subida dos salários agrícolas, e mesmo a escassez de mão-de-obra notada em muitos sectores, como consequência do êxodo de uma parte cada vez mais considerável da população trabalhadora rural para as zonas industriais recentemente criadas ou de forma importante desenvolvidas1 e, ainda, da emigração.
Todavia, Sr. Presidente, não serei eu que lamentarei esta subida dos salários rurais - antes pelo contra rio -> ainda bastante desnivelados relativamente aos do trabalho industrial.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Creio que sou insuspeito de tentar inferiorizar, em benefício da actividade agrícola, os restantes sectores do trabalho nacional. Pelo contrário, estou fortemente convencido de que na actual conjuntura portuguesa, e durante ainda bastantes anos, por mais confiança que tenhamos nos .resultados dos planos de fomento e na renovação industrial do País, será ainda a agricultura a principal actividade da população e nela encontrará a nossa própria indústria o principal, mercado para a deslocação dos seus produtos manufacturados.
Vozes: - Muito bem, muito bem!
O Orador: - Consequentemente, tanto a indústria como o comércio têm o máximo interêssse na solvência, na prosperidade, na subida do poder de compra das massas agrícolas, presentemente estagnado num nível muito inferior às possibilidades da nossa produção industrial.
Por tudo isto, Sr. Presidente, me parece urgente a revisão dos preços dos géneros agrícolas. Esta é a providência mais eficaz a adoptar para salvar a lavoura da crise em que a lançaram os três últimos anos maus sofridos - a que provavelmente outro não melhor se seguirá.