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1540 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 59

medicina escolar, alimentação infantil, obstetrícia, abastecimento de águas, organização de hospitais, etc.
Não se deve esquecer ainda que foi nos derradeiros anos desse século que Jenner começou a empregar a vacina contra a varíola. Como dizem Grundy e Mackintosh (8), «foi a primeira vez que se apresentou uma ocasião propícia para pôr em marcha uma medida preventiva em escala mundial». Na realidade, por exemplo, em Portugal a vacinação antivariólica foi usada um ano depois da publicação de Jenner (1796) e, após uma intensa campanha levada a efeito pela Academia das Ciências, alguns anos volvidos já havia 17000 indivíduos vacinados (9).
O século XVIII foi ainda, além dos motivos apontados, um período histórico da maior importância para a saúde pública, por nele se começar a processar a revolução industrial e, em razão disto, terem aparecido as primeiras monografias e medidas sanitárias, decorrentes de uma das maiores, se não a maior mudança na maneira de viver e conviver.
Os pequenos agregados populacionais dispersos cedem o lugar às densas acumulações de seres humanos nas cidades em pequenas áreas; aparecem então graves e novos problemas de saúde pública.
O século XIX, a braços com sucessivos surtos de epidemias, tem de suportar profundamente as consequências desses novos problemas.
A higiene e a medicina preventiva chamam subitamente no fim do século passado a atenção dos médicos, em virtude do êxito da aplicação de soros e vacinas. Para a epidemiologia, no sentido estrito em que era tomada na época, dirigia-se a maior parte das atenções, no capítulo da medicina preventiva.
Como se disse, a progressiva e rápida industrialização fez deslocar dos meios rurais grandes massas populacionais, o que veio afectar fortemente o progresso e o êxito tanto da medicina curativa como da medicina preventiva. Temos, no entanto, de confessar que o resultado global teve de certa maneira, no que se refere à repartição dos cuidados médicos em medicina curativa, um valor negativo.
A livre oferta e livre procura próprias do liberalismo da época fizeram deslocar para as cidades numerosos médicos atraídos pelos honorários que podiam auferir da burguesia, deixando nos meios rurais vastas áreas desprotegidas - desertas de cuidados médicos -, áreas que ainda existem em muitos países, tais como o nosso.
A medicina preventiva, essa colheu exactamente no mesmo êxodo populacional o mais forte impulso para o seu desenvolvimento. Os Estados viram-se a braços com graves problemas epidemiológicos, que fizeram desenvolver largamente os meios de saneamento e de protecção activa contra as doenças infecciosas.
Com o rodar dos lustros esses meios, cada vez mais numerosos e aperfeiçoados, quase fizeram desaparecer nos países mais evoluídos as doenças infecciosas, o que se traduziu pela melhoria progressivamente crescente dos índices demográfico-sanitários. Finalmente, a luta vitoriosa contra os agentes vectores e o aparecimento dos antibióticos fizeram passar para segundos e terceiros planos de importância, como causas de morbilidade e de mortalidade, um grande número de afecções que antes estavam na base de verdadeiras devastações de vidas.
Como consequência inevitável, a longevidade aumentou consideràvelmente. Estes resultados espectaculares, obtidos na sua maioria já neste século, ficaram devendo em parte o seu êxito ao papel desempenhado pela Fundação Kockfeller e pelas instituições internacionais - a Sociedade das Nações e a Organização Mundial da Saúde. Esta última, particularmente, tem levado a sua acção a todos os pontos do globo em colaboração com as entidades sanitárias locais. A. Sauvy (10) diz, acerca da epidemia de cólera de 1947 no Egipto: «noutros tempos tal flagelo teria dado lugar a centenas de milhares de mortes, talvez mesmo a um ou dois milhões. Desta vez, graças aos socorros que afluíram de todos os lados e também ao Serviço de Saúde Egípcio, a doença pôde rapidamente ser sustada na sua progressão, tendo feito apenas poucos milhares de vítimas».
Para dar apenas um exemplo passado nos climas tropicais e subtropicais citaremos a acção da Organização Mundial da Saúde na extinção da malária.
Não queremos entrar em implicações demográficas no que respeita ao acréscimo da população do Globo em virtude destas medidas, que para alguns são de tal maneira eficazes que podem conduzir, dentro em pouco a um mal maior. A população do Globo deve duplicar dentro de 50 anos (J. Freymond e A. Vannotti) (11), podendo enfrentar-se então, segundo os autores citados, a superpopulação e a subalimentacão. E. Mathey (12), referindo-se à obra da Organização Mundial da Saúde na extinção do paludismo em Ceilão, diz:

A obra da Organização Mundial da Saúde na luta contra a doença levada a efeito, fora de todo o contexto demográfico, conduz, por vezes, a estranhas finalidades: lembremos o drama social e económico de Ceilão, consecutivo ao sucesso da luta contra a malária, vitória dispendiosa que substituiu o paludismo pela inanição.

A este respeito deve afirmar-se que a medicina ao salvar vidas humanas se mantém no cabal desempenho da sua missão; cumpre assim o que se prescreve nos seus códigos milenários.
É certo que do aumento da longevidade resultam problemas que estão no seu âmbito de resolução, e que não são poucos - mas os problemas, económicos, os da alimentação dos povos, da repartição dos produtos alimentares e da pesquisa de novas fontes de origem desses mesmos produtos pertencem a outras ciências e estão no âmbito de organizações internacionais de outro tipo É evidente que se torna necessária uma coordenação de esforços nos dois campos, mas esta só será eficaz quando a ciência da alimentação puder colaborar de forma mais efectiva com a medicina preventiva.

7. Do aumento da longevidade resultam novos e graves problemas de saúde pública nos países mais evoluídos. Então, dentro das fronteiras da epidemiologia, uma vez desaparecida a maioria das doenças infecciosas, tomam lugar outras afecções, tais como o cancro, as doenças mentais, a arteriosclerose, as doenças hereditárias e as do foro geriátrico. Nesses países também se alargaram os limites da medicina preventiva, por terem de se enfrentar outros

(8) L'Enseignement de l'hygiène et de la santé publique en Europe, F. Grundy et Mackintosh, edição da Organização Mundial de Saúde, 1958.
(9) J. da Silva Horta. Memórias da Academia das Ciências, t. VIII, 1960.
(10) «L'augmentation de la population dans le monde et les problèmes économiques, sociaux et politiques qu'elle pose», in Humanité et subsistance, Lausana, 1961.
(11) Introdução à monografia Humanité et subsistance, Lausana, 1961, p. 41.
(12) A mesma obra, p. 51.