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13 DE DEZEMBRO DE 1962 1541

problemas além dos referidos atrás: os provenientes do próprio progresso material, tais como a poluição da atmosfera em relação com o funcionamento de novas e mais numerosas indústrias e, até, os do emprego de novos medicamentos (doenças iatrogénias).
Tem interesse transcrever um período do prefácio de uma monografia - 100 problems in environmental health (13), escrita por um grande número de cientistas, para se compreender a diversidade de problemas resultantes exactamente do desenvolvimento industrial nos nossos dias:

O rápido acréscimo da população nas áreas metropolitanas, a intensificação da industrialização da nossa complexa sociedade e a aceleração do desenvolvimento tecnológico chamam a atenção para os perigos, no presente e no futuro, resultantes de factores ambienciais, tais como a poluição do ar, a contaminação das nascentes de água, os esgotos e detritos industriais, substâncias radioactivas, insecticidas e herbicidas, contaminação de alimentos por agentes químicos e biológicos, riscos ocupacionais.

Ao mesmo tempo que nos países evoluídos a epidemiologia terá de se ocupar dos citados aspectos, muitos outros mantêm-se na fase das doenças infecciosas e das perturbações resultantes da hiponutrição e da má nutrição.

§ 2.º Medicina social; seu papel nas colectividades modernas

8. A medicina social desenvolveu-se após a revolução industrial e, portanto, encontramos os seus primeiros cultores nos fins do século XVIII. Johann Peter Frank é, com razão, considerado o pioneiro nesta matéria; foi o primeiro a falar de doenças provocadas pelas condições de existência das populações e quem «impôs a noção de que os principais obstáculos no caminho da saúde são a pobreza e a ignorância» (14).
Antes de avançarmos neste campo é necessário saber o que se entende por medicina social. Ao passo que a higiene e a medicina preventiva são matérias que na prática não carecem de definição, o mesmo não sucede com a chamada medicina social.
No sentido estrito, visa a prevenir ou a tratar a modificação do estado de saúde do homem provocada por factores sociais; Grundy e Mackintosh empregam o termo num sentido muito lato, porquanto, além disso, incluem as «relações recíprocas da medicina e da sociedade (sociologia médica), em especial as consequências sociais da doença para os indivíduos e para a família».
Veremos mais adiante que em muitos programas dos ensinos pré e pós-graduados de saúde pública se incluem os inquéritos feitos neste sentido junto da família dos doentes hospitalizados ou retidos nos domicílios.
O médico adquire assim uma nova responsabilidade: cabe-lhe uma parte da responsabilidade no bem-estar social.
A autoridade de Grundy e Mackintosh, encarregados pela própria Organização Mundial da Saúde de escrever a monografia, L'enseignement de l'hygiène e de la santé publique en Europe, donde tiramos as notas precedentes, leva-nos a optar por esta acepção lata.

9. Pergunta-se hoje em dia se ainda é justificada a separação entre medicina curativa por um lado e medicina preventiva e social por outro. É claro que a medicina é única e constitui sempre no seu exercício uma integração de conhecimentos curativos, preventivos e sociais. O médico das periferias e o médico de família executam ao mesmo tempo actos curativos e preventivos; têm, por exemplo, um papel fundamental na profilaxia das doenças transmissíveis e na educação sanitária. Julgamos, no entanto, que na prática se deve manter a separação, porquanto se há médicos -sobretudo o clínico geral e, entre estes, o médico das periferias - que têm a seu cargo esta dupla função, o facto é que há especialistas, dedicados exclusivamente à medicina curativa, e outros que nos postos de chefia executam apenas actos de pura administração sanitária. Além disso, estes dois tipos de medicina servem-se de métodos e executam técnicas por vezes completamente diversas.
A interligação dos problemas sanitários e o meio social não diz apenas respeito à prevenção das afecções que encontram a sua causa no referido meio. Ocupando-se do homem são, a medicina preventiva tem de seguir o homem na comunidade: na família, na oficina, na escola...
Tem de se levar em linha de conta, a par da higiene individual, as condições de vida e de trabalho - o número de horas e o tipo deste último em relação ao tempo de repouso. Aqui, a medicina preventiva é medicina social. O indivíduo, quer são, quer doente, tem de se considerar como um todo, mas no seio da comunidade. Assim, justifica-se perfeitamente o falar hoje em «diagnóstico clínico» e «diagnóstico social», este último aclarando muitas vezes o primeiro. «A medicina social, soma da acção sanitária e social, visa a protecção e o desenvolvimento da personalidade, considerada simultâneamente como valor económico e como valor espiritual» (J. Parisot) (15).

10. Apesar de as características do actual .período da medicina serem em parte condicionadas para atingir finalidades económicas, o comportamento do médico é essencialmente humano, muito mais do que o foi no período da chamada «medicina científica». Agora o doente é, mais do que nunca, o «homem doente», porque se valorizam todas as consequências que resultam de se estar doente e o «diálogo singular» volta a ter todo o seu valor. Todo o corpo médico está então em jogo, e não apenas os sanitaristas. Movendo-se no terreno colectivo, o médico de hoje, se quiser ter uma atitude social, tem de praticar uma medicina profundamente humana, e não uma medicina de massa, despersonalizada. A par de um «diagnóstico médico» deverá fazer um «diagnóstico social» - ambos necessários para um eficaz tratamento, porque ao lado de uma terapêutica médica decorrerá uma terapêutica social. Com este novo espírito o médico torna-se mais uma vez um valioso instrumento de valorização espiritual.
Grundy e Mackintosh afirmam:

A prática médica mudou de carácter neste último meio século. O que se espera hoje da medicina é que ela manifeste um real interesse pelo doente, que ela o considere como um indivíduo, homem ou- mulher, vivendo em certo quadro uma existência própria, tendo os seus elos familiares, obrigações, angústias, esperanças e temores.

Ao médico é imposta uma missão: «que nas aplicações colectivas deve proceder segundo as regras da medicina individual, no respeito pela liberdade e pela dignidade pessoal, segundo os princípios dos juramentos médicos e que a medicina, para ser social, deve ser profundamente humana» (J. Parisot) (16).

(13) 100 problema in environmental health, Washington, 1961.
(14) Grundy c Mackintosh, obra correspondente à nota 8.
(15) No prefácio da obra de Grundy e Mackintosh, p. 13.
(16) No prefácio da obra de Grundy e Mackintosh, p. 16.