1552 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 59
tério deve ser criada? Porque não no Ministério da Educação Nacional, integrada na Universidade, ou, até, anexa a uma da três Faculdades de Medicina do País? Trata-se de uma escola de ensino pós-graduado cujo funcionamento cabe muito bem no âmbito da Universidade, tal como muitas outras escolas pós-graduadas estrangeiras de ensino médico.
A este ponto de vista opõe-se outro: a escola destina-se, sobretudo, a- diplomar funcionários de saúde, logo, a sua inclusão no Ministério da Saúde e Assistência teria todo o cabimento.
No anexo do 10.º Relatório sobre a organização do ensino pós-universitário de saúde pública (1961), aqui já várias vezes citado, dá-se conta de um questionário dirigido às escolas de saúde pública. Responderam 44 escolas, 5 da Europa continental, 8 da Inglaterra e 9 da Comunidade Britânica, 10 dos Estados Unidos da América, 5 da América Latina e 7 de outros países. Destas 44 escolas, «33 funcionam sob os auspícios de uma Universidade; 10 não são instituições distintas, mas constituem um departamento de uma escola de medicina». Em S. Paulo há até uma Faculdade de Higiene e Saúde Pública. Em França, 5 ensino pós-graduado de saúde pública é feito pelas Faculdades de Medicina. Há alguns anos foi uniformizado no plano nacional quanto à sua duração, às suas matérias e ao exame final (J. Parisot) (82). Segundo H. Péquignot (83), cada Faculdade concede o seu certificado em higiene, medicina preventiva e social, por um lado, e em medicina do trabalho, por outro. Ainda segundo o mesmo autor, existe uma escola nacional de saúde pública, dependente do Ministério da Saúde, onde se prepara a maior parte dos médicos funcionários de saúde e ainda o pessoal para-médico. Na Espanha existe uma escola nacional de saúde, que está sob a égide da Universidade de Madrid, mas que faz parte do Ministério do Interior. A escola é dirigida por um conselho, do qual é presidente o Ministro do Interior e do qual fazem parte o Ministro da Educação Nacional, o director-geral de Saúde e o reitor da Universidade.
O Instituto de Saúde Pública de Tóquio (84) depende do Ministério da Saúde. As escolas de saúde pública americanas estão todas integradas na Universidade.
Pelo que deixamos escrito, conclui-se que as modernas escolas de saúde pública funcionam, na sua quase totalidade, integradas na Universidade.
34. No caso português o que melhor convirá? O ensino da medicina sanitária esteve primeiro entregue às Faculdades de Medicina e depois, pelo Decreto n.º 36 050, de 18 de Dezembro de 1946, passou a ser feito pelo Instituto Superior de Higiene Dr. Ricardo Jorge, de Lisboa, sob a égide do Ministério do Interior (85). A partir de 1954 o ensino passou também a ser feito no Porto, na delegação do referido Instituto. Do facto de as Faculdades de Medicina terem sido privadas de fazer este ensino resultou um nítido prejuízo para os jovens médicos do centro do País, que, para tirar o curso, se viram forçados a deslocar-se para Lisboa e, mais tarde, em alternativa, também para o Porto.
Não nos parece que tenha grande importância que a futura Escola Nacional de Saúde Pública fique na dependência do Ministério da Saúde e Assistência ou no da Educação Nacional, uma vez que numa ou noutra posição lhe seja atribuída uma autonomia pedagógica, técnica e administrativa e uma vez que se encontre ligada por um lado à Universidade e por outro aos serviços de saúde.
Reproduzimos na íntegra uma frase de J. Parisot (86), dada a experiência que este autor tem em matéria de saúde pública: «Qu'il en soit de l'une ou de 1'autre (refere-se à Universidade e ao Ministério da Saúde) des liaisons étroites doivent unir ces écoles avec les Facultes de Medicine et leur département d'hygiène et de medicine social et, d'autre part, avec le Ministère interessé». Entre as recomendações feitas no Relatório n.º 10 para a organização pós-universitária de saúde pública (1961) destaca-se o n.º 3, onde se diz que «uma escola de saúde pública deve, tanto quanto possível, estar ligada a uma Universidade, a fim de poder aproveitar das vantagens que oferecem os outros departamentos universitários, e reciprocamente, a fim de exercer influência sobre estes departamentos no que diz respeito- às disciplinas de saúde pública».
Quanto à escola que se pretende criar em Portugal, só lhe adviriam também benefícios da ligação com a Universidade, sobretudo no que respeita à Faculdade de Medicina, cujos laboratórios - muitos dos quais hoje bem apetrechados e dirigidos - constituiriam um forte apoio para a sua investigação.
A vantagem não resultaria só de poder contar com os laboratórios, mas ainda com as bibliotecas, quer as centrais, onde se poderiam colher preciosas informações de ordem histórica, quer as privativas das várias cadeiras, algumas das quais são excelentes. Haveria ainda a vantagem de ter à disposição os meios de trabalho dos institutos universitários, tais como, e seria este o caso de Lisboa, o Instituto Bacteriológico Câmara Pestana, o Instituto Português de Oncologia e o Instituto Oftalmológico Gama Pinto. Teria igualmente interesse a colaboração com os serviços de outras Faculdades.
Esta ligação com a Universidade traria reais vantagens para ambas as partes: se é certo que a própria Escola com os seus centros de saúde polivalentes constituiria a base indispensável para a formação do estudante de medicina em medicina preventiva e social, não é menos verdade que deste facto resultariam vocações de jovens diplomados para a carreira de saúde pública; esses jovens seriam os futuros alunos da Escola.
Em resumo, se considerarmos que a ligação com a Universidade constitui uma base fundamental para o bom êxito da nossa escola de saúde pública, também estamos certos que nunca conseguiremos dar aos estudantes de medicina uma formação médica moderna sem uma perfeita ligação com os serviços de saúde pública.
35. Com o projecto da criação da Escola Nacional de Saúde Pública antevê-se um momento único para iniciar a resolução de um problema nacional que transcende em muito a simples criação dá Escola: a mudança da «filosofia» do exercício da profissão médica. Para que as comunidades portuguesas sejam servidas no duplo ponto de vista da manutenção da saúde, e da cura da doença, como
(82) No prefácio do livro de Grundy e Mackintosh, já várias vezes citado, p. 17.
(83) «L'état actuel de l'enseignement de la medicine préventive et sociale en France», First Conference on Medical Education, Londres, 1953, p. 568.
(84) Veja-se a publicação: The Instituto of public Health, Tóquio, 1959.
(85) Deve esclarecer-se que o Instituto Superior de Higiene Dr. Ricardo Jorge esteve na dependência da Faculdade de Medicina de Lisboa o nele se ministrava quer o ensino de higiene dos estudantes de medicina, quer o ensino pós-graduado desta matéria. Pelo Decreto n.º 16944, de 12 de Junho de 1929. este Instituto passou para o Ministério do Interior.
(86) No prefácio do livro de Grundy e Mackintosh, p. 18.