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9 DE JANEIRO DE 1963 1759

Reporto-me ao desenvolvimento turístico da bacia do Mondego, que constitui uma região pletórica de belezas paisagísticas, do admiráveis monumentos, de sedutoras tradições, de lendas sugestivas e de colorido folclore.

Neste aspecto, Coimbra e os concelhos adjacentes proporcionam ao turista Ávido de sensações cenários opulentos de recursos inexauríveis.

Sr. Presidente: foi Augusto de Castro quem escreveu:

No fundo, o turismo é a arte de vender sol, de vender paisagem, de vender natureza e historia.

Tem foros do incontroversa veracidade tal asserção.

Mas temos de aceitar que se ainda não são de mais os "compradores" do nosso sol, da nossa paisagem e da nossa história é porque nos tem desamparado o engenho de expormos no "mercado" turístico as prodigalidades sem conta que a natureza nos dispensou.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - A paisagem geográfica e humana, de Portugal pode ser, se nós quisermos, fonte de emoções belas e reconforto espiritual para os que, de perto ou de longe, demandam belezas desconhecidas.

Já Ramalho, que talentosamente descrevera e tanto amara as coisas da nossa terra, afirmou que as viagens pelos recantos de Portugal "são indispensáveis para nos ensinarem a conhecer e a amar a Pátria pelo que nela é imortal e sagrado; pelo doce aspecto dos seus montes, dos seus vales, dos seus rios; pelo sorriso melancólico, mas contente, dos vinhedos, dos olivais, dos soutos, das hortas e dos pomares; pela tradição vivida nos monumentos arquitectónicos, nas romarias, nos contos, nas cantigas populares, nas indústrias caseiras, nas alfaias agrícolas, nas ferramentas dos ofícios rurais, na configuração dos lares".

Sr. Presidente: quando, com o misticismo dos romeiros da beleza, percorro o País de lês a lês; quando, alvoroçado, subo os píncaros do Geres, do Marão ou da Estrela, a alagar os olhos na claridade violácea dos horizontes e, recolhido, desço à planície ressumante de verdura e fertilidade; quando viajo pelo Minho gárrulo e florido, solene nas casas senhoriais e buliçoso nos descantes à desgarrada, e estreito num abraço o Algarve pequenino e donairoso como um presépio, onde a luz perfumada tem tonalidades de uma canção bíblica; quando me embriago na beleza rústica das nossas Beiras, que o homem musculoso e endurecido cava e fertiliza com ímpetos de leão, e me enterneço nas restevas alentejonas, por onde se dilui a toada dolente das suas canções; quando miro a esmeralda imensa do nosso céu ou a tela azul do nosso mar, tenho muitas vezes desejos de gritar com António Nobre:

Onde estão os pintores do meu pais estranho?

Onde estão eles, que não vêm pintar! ...

Sr. Presidente: desde que, há 51 anos, se relanceou o primeiro olhar pelo turismo em Portugal, gratas realizações se efectuaram, quer no plano nacional, quer no regional, através dos seus organismos superiores e das suas comissões e juntas, que o Código Administrativo incorporou no seu ordenamento legal, numa visão menos exacta do problema, pois não parece plausível que se demarquem as zonas de turismo pelos limites das circunscrições administrativas.

Seria injustiça, que não cometo, ignorar aquilo que se fez, mas constituiria diletantismo descabido não reconhecer o muito que há a fazer.

Urge que o turismo seja elevado ao nível dos grandes problemas nacionais, mercê de uma reforma do estrutura, quer na delimitação das regiões turísticas, quer na orgânica dos seus corpos administrativos, quer no quadro do seu pessoal, quer nos meios de actuação e difusão, quer na localização dos seus postos de informação, quer na sua orgânica financeira, quer na autonomia da sua vida administrativa.

Um turismo como o nosso, fragmentado por meia centena de comissões municipais e três dezenas e meia de juntas de turismo, umas desarticuladas, outras inoperantes, financeiramente débeis quase todas, pouco poderá fazer do muito que é legítimo exigir-se-lhe a bem do nosso prestígio e da economia nacional.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Sr. Presidente: numa reforma básica do turismo português, cujo ritmo os favores da fortuna hão-de, por certo, acelerar, Coimbra, com todo o seu património de riquezas naturais e artísticas, acrescido de forma incalculável com o aproveitamento do Mondego, pelo qual pugnamos, poderá constituir o centro de uma notável região turística.

Como já ponderou Amorim Girão, a paisagem de Coimbra é variada na constituição do solo, onde se aglomeram elementos geológicos heterogéneos; no relevo orográfico, em que sobressaem as serras luminosas da Lousa e do Buçaco, cujos cumes contemplam virentes planícies que se dilatam até aos longes da distância.

Coimbra é variada nas condições hidrográficas, com uma rede de pequenos rios, além do Mondego, sinuosos e pitorescos, a darem voz à terra, como diria Balzac, e com estâncias termais de renome assinalado a oferecerem saúde e repouso a quem, esperançado, as procura; no revestimento florestal, onde negrejam os pinhais, frutificam as vinhas, os olivedos, os laranjais é medram viçosos os Salgueiros, os olmos e os choupais.

Coimbra é variada, por fim, no aspecto antropogeográfico, em que o homem, afim da terra e das coisas, mantém, apesar de tudo, uma fisionomia característica nos ritmos psicossociais, a que Bergson chamou élan vital.

Coimbra, com as Beiras que a circundam, oferece aos olhos curiosos do viajante sôfrego de imprevistos e de emoções fortes um dos mais belos, dos mais sugestivos, dos mais inspiradores, retalhos da paisagem portuguesa.

Por isso, Coimbra tem de constituir um centro de turismo irradiante.

Coimbra tem a sua Universidade, gloriosa de tradições no mundo da língua portuguesa e curiosa na pompa dos seus rituais, onde se surpreende uma Academia estuante que, agarrada às suas praxes multisseculares, quando cintila a sua boa estrela, sabe ser irreverente e elegante, aguerrida e generosa.

Coimbra tem admiráveis monumentos que constituem magníficos exemplares arquitectónicos, como, e entre tantos outros, a Sé Velha, Santiago, Santa Clara, S. Salvador, Almedina e a carcomida Igreja de Santa Cruz, onde dormem, num clarão de glória, as cinzas do nosso primeiro rei, cujo túmulo já há muito deveria ser veludo, nas hora de serviço, por uma sentinela perfilada que, a semelhança do túmulo do soldado desconhecido, assinalasse, com sua presença, aos visitantes que ali descansa o bravo lutador sem o qual Portugal não teria existido, como afirma Herculano.

Vozes: - Muito bem, muito bem!