2198 DIARIO DAS SESSÕES N.º 86
a trabalhos de preparação e instalação daquele centro. Compreende-se assim que seja um centro destinado a receber e a preparar colonos com aptidão para a vida agrícola, o mesmo se depreendendo também da distribuição da verba atribuída para aquele fim. Mas a verdade é que nem todos os colonos que desembarcam nos cais dos portos de Moçambique são destinados à actividade agrária; muitos são operários, artífices, empregados comerciais e de muitas outras profissões também necessárias indispensáveis mesmo a uma boa ocupação demográfica da província. Para estes colonos, porém, não haverá nenhum centro de recepção.
Torna-se, portanto, indispensável e urgente a criação em Lourenço Marques de um centro de recepção de colonos, preparado para receber todos os colonos e respectivas famílias que demandem Moçambique, amparando-os nos primeiros tempos, procurando-lhes colocação e encaminhando-os na sua nova vida na província. E decisão que não pode nem deve ser adiada por mais tempo, se quisermos fazer o que já deveria ter sido feito há muitos anos, ou seja o aproveitamento dos que desejam instalar-se em Moçambique e colaborar com o esforço do seu trabalho no desenvolvimento daquela nossa grande província.
Fechado este parêntese, retomemos o fio das considerações que vínhamos fazendo. Moçambique precisa de uma Direcção de Agricultura e Florestas ao verdadeiro nível das suas enormes possibilidades agrárias; que seja um organismo vivo, dinâmico, amplo, desburocratizado, capaz do dar solução a todos os problemas agronómicos e impulso a todas as actividades agrícolas e florestais; com serviços de reconhecimento e investigação científica, com vista à ocupação económica do território; com serviços de assistência técnica que possam dar completo apoio às necessidades dos agricultores. Numa palavra, uma verdadeira organização inteiramente dedicada aos problemas da vida agrícola da província e que disponha de todos os meios que lhe permitam o desempenho das suas funções de modo efectivo e rápido.
Se esta tivesse sido a orientação seguida, outro teria sido certamente o panorama técnico encontrado quando, ao pretender-se dar execução aos estudos dos planos de fomento e dos projectos de povoamento, se deparou com a falta de elementos de informação científica e técnica que se tornava imprescindível obter.
Daí a criação, em 1960, como já atrás referi, das brigadas de fomento agrário, que não só levaram para os seus serviços alguns dos melhores técnicos da Direcção de Agricultura e Florestas, como também, funcionando independentemente daqueles serviços, produziram uma pulverização e dispersão de actividades, todas elas com o mesmo fim, que encareceram desmedidamente serviços que se poderiam ter obtido com maior economia. Teria sido lógico que essas brigadas tivessem sido logo integradas na Direcção de Agricultura e Florestas, como a lei preceituava. Mas houve talvez pouca confiança na sua orgânica complicada e altamente burocratizada.
E por isso que insisto neste ponto: torna-se urgente a simplificação da orgânica da Direcção de Agricultura e Florestas, com base num trabalho eficiente e construtivo.
Uma modificação importante a introduzir na Direcção de Agricultura e Florestas é a separação absoluta dos serviços administrativos dos serviços técnicos. Não se compreende, por exemplo, que seja o regente agrícola principal da Repartição de Florestas o funcionário encarregado de proceder & conferência das folhas de vencimentos do pessoal. Eu mesmo verifiquei, há anos, que quem então efectuava a conferência dessas folhas era o próprio engenheiro silvicultor chefe da repartição.
Ora esta mistura inadmissível de serviços administrativos confundidos com serviços técnicos, esta situação absurda de serviços administrativos a serem executados por técnicos, por funcionários especializados, com cursos destinados a funções bem diferentes, não pode nem deve manter-se sem que disso resulte um grande prejuízo.
Nota-se na Direcção de Agricultura e Florestas, e também noutros serviços do Estado, que as respectivas secções técnicas estão de tal maneira dependentes de trabalhos de natureza burocrática que lhes é inteiramente impossível executarem com eficiência as funções técnicas que lhes pertencem. E a elaboração de notas, de memorandos, de requisições, toda uma enorme montanha de papéis de natureza meramente burocrática e administrativa que impede o exercício das funções técnicas que deveria ser toda a sua única preocupação. Estas funções burocráticas deveriam pertencer exclusivamente às respectivas secretarias.
Os serviços técnicos, dada a sua natureza especial, precisariam de ter completa autonomia de movimentos, para poderem acorrer com rapidez e no momento preciso aos locais que careçam da sua presença ou onde tenham de executar o seu trabalho.
Permitam-me que conte aqui, a propósito, uma pequena história, que vem dar razão ao que acabei de dizer.
Em determinado momento, tornou-se urgente a deslocação de um funcionário da Direcção de Agricultura e Florestas a fim de proceder a um inquérito agrícola. Solicitada à Direcção de Fazenda a necessária autorização de verba para as despesas de deslocação, surgiram dúvidas e interpretações que arrastaram o assunto durante três meses! E quando, ao cabo de muitos e complicados trabalhos, chegou a comunicação com o despacho final autorizando a deslocação do funcionário, tinha terminado o ano económico da província, porque se estava então no dia 10 de Janeiro; a deslocação já não podia fazer-se.
Isto é inacreditável, mas é verdade!
E tratava-se de uma deslocação urgente! O que teria sido se esse não fosse o caso? Continuaria ainda, com certeza, por resolver.
Este é apenas um pequeno exemplo para ilustrar as minhas considerações, mas tem havido tantos casos como este ou semelhantes que fácil é avaliar como têm contribuído para tolher e amarrar o desenvolvimento da província.
Não há dúvida de que é preciso combater energicamente a burocracia e os seus processos perniciosos. Ela é responsável por muitos embaraços que têm lamentavelmente entravado a Moçambique o seu progresso de país novo. A iniciativa do combate à burocracia deveria partir do próprio Governo, simplificando a execução dos serviços públicos, punindo os que contribuíssem para a complicação desses serviços e premiando os funcionários que se distinguissem na sua simplificação. Prestar-se-ia, com isto, um grande serviço à Nação, pela economia que resultaria da execução dos serviços públicos e pela ruinosa perda de tempo que se evitaria às actividades particulares.
Disse que é exígua a verba atribuída à Direcção de Agricultura e Florestas. Mas, se é certo que essa verba é insuficiente, a verdade é que nem sempre pode, mesmo assim, ser devidamente aproveitada, por deficiências causadas pela orgânica imperfeita dos serviços.
E do meu conhecimento que há naquela Direcção repartições sem chefia, por falta de engenheiros agrónomos para as dirigirem. Esta escassez de pessoal especializado