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2390 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 95

Seria ingenuidade não querer ver ou não acreditar nos enormes perigos, escondidos em cilada traiçoeira, que neste momento rodeiam o ultramar português. É preciso enfrentar esses perigos com coragem. Mas a coragem, só por s>i, não é medida que baste para vencer os ataques que constantemente nos são lançados da forma mais pérfida, destruidora e injusta por forças apenas interessadas em arremessar sobre esta conturbada África dos nossos dias os vendavais da destruição e, do fratricídio. É preciso também - e esta é que é a medida definitiva e incontroversa - enfrentar esses perigos com soluções inteligentes para os muitos e importantes problemas que nos preocupam e afligem. Na solução desses problemas é que reside afinal a maior segurança para a nossa posição em. África.
Ora um dos muitos problemas que precisamente afligem Moçambique, que dificulta a vida e o desenvolvimento das suas actividades produtoras, que impede mesmo que nasçam muitas outras actividades para a exploração das suas enormes riquezas, é a falta de uma boa instituição de crédito a que essas actividades possam recorrer nos momentos de dificuldade, evitando que umas soçobrem por falta de recursos ou permitindo que outras surjam no panorama económico da província.
Recordo, a propósito, algumas palavras que disse aqui no ano passado, quando me referi numa outra intervenção ao aproveitamento dos recursos económicos de Moçambique. Disse então que para se dar execução a um programa de aproveitamento desses recursos era preciso dinheiro e que esse dinheiro era verdadeiramente escasso em Moçambique.
Hoje acrescentarei que é preciso muito dinheiro e que esse dinheiro é dramaticamente escasso, e digo dramaticamente porque causa aflição e desgosto assistir ao desfalecimento, à ruína ou à estagnação de empreendimentos só porque lhes falta uma fonte de crédito que os arranque à situação difícil em que se encontram e lhes permita o desenvolvimento e o progresso das suas iniciativas.
É certo que têm ido para Moçambique alguns créditos para o financiamento de realizações do Estado e alguns até de vulto apreciável. Mas em matéria de crédito para impulsionar a actividade privada continuamos na mesma situação precária em que nos encontrávamos quando na última sessão legislativa lancei aqui o meu apelo.
Continuamos na mesma situação difícil, sem termos uma instituição de crédito que dê impulso ao aproveitamento de recursos naturais ainda inexplorados, adormecidos numa letargia sem explicação e sem justificação e cuja falta de aproveitamento se ergue numa censura expressiva contra uma situação de desinteresse, inércia e desperdício que é contra a própria vida da Nação.
São as águas preciosas dos rios correndo incessantemente para o mar, inutilmente perdidas, em vez de serem aproveitadas na irrigação de terras e na produção de energia eléctrica; são os extensos vales de terras férteis, a prometerem fartura, mas onde o risco da charrua não desenhou ainda o traço do seu aproveitamento; são os prados verdes, a perderem-se nas lonjuras, onde poderiam pastar grandes manadas»; são, enfim, tantas outras fontes de trabalho e de riqueza que não podem continuar por mais tempo inexploradas, para o bem-estar e para a prosperidade de todos.
Seja-me permitido aqui um parêntesis para, em boa justiça, ressalvar a posição do Banco Nacional Ultramarino e outros bancos de Moçambique, que têm auxiliado muitos empreendimentos, mas que nem sempre podem acorrer a todas as necessidades.
Limitando hoje as minhas considerações apenas a um aspecto do aproveitamento económico de Moçambique, direi que continuamos sem o crédito agrário que não podemos mais dispensar. E por quanto tempo continuaremos sem esse crédito? Na verdade, os agricultores e os criadores de gado de Moçambique não podem esperar mais.
Disse aqui, no ano passado, referindo-me à Caixa de Crédito Agrícola de Moçambique, que o melhor seria extingui-la, visto a sua acção ser praticamente nula.
Mas vejamos porque é nula a acção daquela Caixa. É nula porque não lhe são facultados recursos financeiros que lhe permitam dar cumprimento aos fins que determinaram a sua criação.
Basta examinarmos as contas de gerência respeitantes à província de Moçambique para vermos que a Caixa de Crédito Agrícola se vai exaurindo, a pouco e pouco, dos parcos recursos financeiros de que ainda dispõe. Com efeito, o saldo da conta de gerência que transitou para 1961 foi de 4 336 931$16, mas já o saldo com que terminou aquele ano económico foi apenas de 3 256 522$30. Longe não virá o dia, portanto, em que a Caixa verá completamente esgotados todos os seus fundos e então terminará tristemente a existência de uma instituição criada para fomentar a produção agrária de Moçambique.
Lembremos, a propósito, estas palavras, ainda hoje tão oportunas, constantes do preâmbulo do Diploma Legislativo n.º 79, de 21 de Junho de 1928, que criou em Moçambique a Junta de Crédito Agrícola, que mais tarde passou a denominar-se Caixa de Crédito Agrícola.
Dizia-se então que era «inadiável necessidade para a economia da colónia dar o maior, desenvolvimento à sua agricultura, promovendo assim o aumento da produção para exportação» e que, «na precária situação em que se encontra a maioria dos colonos agricultores de Moçambique, esse desenvolvimento da agricultura se não poderá obter sem o Governo tomar medidas de auxílio, justas e adequadas, facilitando aos colonos condições mais favoráveis para a obtenção de créditos destinados às suas explorações agrícolas».
Reconhecia-se então que era premente a necessidade de auxílio na forma de crédito a conceder aos agricultores de Moçambique. Isto foi dito há 35 anos, mas ainda hoje o problema continua insolúvel e os agricultores da província continuam a lutar com uma falta de auxílio financeiro verdadeiramente aflitiva. A falta de crédito agrícola, prometido e legislado há 35 anos, mas não cumprido, causou a Moçambique um enorme prejuízo no aumento da sua produção, já em actividades que não conseguiram desenvolver-se, já em iniciativas que fracassaram completamente.
Não resta dúvida que o objectivo do Diploma Legislativo n.º 79 era precisamente procurar o aumento da produção, concedendo aos agricultores e aos criadores de gado os meios financeiros que lhes permitissem desenvolver as suas actividades agrárias.
Outro seria hoje certamente o aspecto da produção agrária de Moçambique se ela tivesse disposto em devido tempo de uma instituição de crédito em que se tivesse apoiado. A falta deste valioso apoio levou à ruína muitos empreendimentos que teriam sido triunfos, empobrecendo irremediavelmente colonos que nunca mais tiveram energia para se erguerem acima dos seus fracassos. Foram tudo perdas enormes que se repercutiram na economia da província.
A falta de rega, por ausência de recursos financeiros, tem sido uma das maiores preocupações que têm atormentado os agricultores e uma das maiores causas do seu enorme cortejo de prejuízos. A rega poderia e deveria ser sobretudo uma iniciativa do Estado.