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24 DE ABRIL DE 1963 2391

No caso dos muitos rios da província poder-se-ia recorrer, com grande êxito, economia de investimento e possibilidades de realização imediata, ao estabelecimento de estações de bombagem para uso colectivo ou individual.
O estudo, a instalação e o fornecimento das bombas e do respectivo sistema de irrigação deveriam ser efectuados pelo Estado.
A amortização seria feita pelos beneficiários a longo prazo e com juro reduzido. Este seria um serviço a ser criado pelo Estado e uma forma de crédito agrícola de resultados incalculáveis. E não me digam que a criação de tal serviço seria obra difícil de realizar, desde que nela se pusesse boa vontade e iniciativa.
O sistema de rega por bombagem deveria merecer maior atenção, sobretudo enquanto não nos for possível fazei-os grandes aproveitamentos hidráulicos, cujo custo elevado assusta os responsáveis pela realização de tais empreendimentos.
Assim, seria aproveitada a água preciosa que improdutivamente corre para o mar enquanto as plantações das. margens dos rios secam por falta de rega.
Com o auxílio de créditos seria também possível desenvolver a criação de gado, para o que existe em Moçambique um campo de trabalho praticamente sem limites.
Vejamos o que diz a este respeito, num dos seus trabalhos, o Dr. Jaime Travaços Dias, médico veterinário moçambicano e estudioso dos problemas da sua terra:

Constitui facto incontroverso à afirmação de que a maior parte do território de Moçambique se encontra despovoado de gado bovino.

E escreve num outro seu trabalho:

Ora, se tivermos em mente que cada cabeça normal, em regime extensivo, exige uma área de pastigo de 4 ha (termo médio), verificar-se-á que Moçambique poderá comportar, sem inconveniente, um efectivo pecuário de cerca de 9 857 700 cabeças normais.

Isto contando com o sistema de criação e de pastagem vulgarizado em Moçambique. Mas se se optar pelo sistema de recria, utilizando, portanto, áreas menores, então as perspectivas oferecidas para a criação de gado tornam-se muito mais largas. Neste caso, porém, a rega será imprescindível para a cultura de forragens.
Ora o efectivo pecuário da província era, em 1960, apenas de 1 157 493 cabeças normais.
Por aqui se vê que é vasto o campo de trabalho que existe em Moçambique no domínio da pecuária.
Por sua vez, o Dr. Jacinto Pereira Martinho, outro médico veterinário com larga folha de serviços prestada em Moçambique, também diz que, «em relação à sua enorme superfície e aos países vizinhos, Moçambique é um. território extremamente pobre de gados» (Aspectos do Problema Pecuário de Moçambique).
E desenvolve, neste seu trabalho, interessantes considerações acerca da «produção de proteínas de origem animal e as necessidades da população da província». Diz, por exemplo, que para Moçambique poder alimentar a sua população com quantidade suficiente de proteínas animais precisaria de possuir manadas que totalizassem 3 500 000 cabeças, pelo menos, incluindo 100 000 vacas leiteiras; e que, desde que se fosse buscar ao leite 10 por cento de proteínas, a produção deste rico alimento «teria de elevar-se a 203 milhões de litros por ano».
Ora, a verdade é que, em 1960 (data das últimas estatísticas), Moçambique possuía apenas 8710 vacas leiteiras e 376 440 outras vacas.
Moçambique importou, em 1960, 3804 t de leite condensado, em pó e fresco, no valor de 42 597 contos, e produziu 6 391 117 l de leite fresco. Isto corresponde a um consumo anual per capita da ordem dos 5 l, o que é um consumo verdadeiramente irrisório.
Se nos voltarmos, porém, para o consumo de carne, os números também nos surpreendem pela extrema pequenez da sua capitação, que é apenas da ordem de 1,3 kg por ano, ou seja, cerca de 3,5 g diários! E certo que o africano que vive longe dos centros de civilização recorre com frequência ao consumo de carne de caça, que lhe fornece uma razoável quantidade de proteínas. Estou, porém, certo de que esta circunstância não melhora muito a posição do caso.
Não quero estabelecer paralelos, mas dou aqui alguns números para que se veja como Moçambique está longe dos consumos de carne de outros países. O consumo per capita na Austrália é de 117 kg por ano; no Brasil é de 31 kg; na Suíça, de 55 kg; na Inglaterra, de 69 kg; nos Estados Unidos da América, de 90 kg; e na África do Sul, de 45 kg.
«Aconselham os nutrólogos - diz ainda é Dr. Pereira Martinho - o consumo diário por pessoa, de peso médio, de 70 g de proteínas, das quais metade de origem animal, fornecidas, portanto, pela carne, o peixe, o leite ou os ovos. Estes 35 g equivalem à proteína contida em 1 l de leite ou em cerca de 200 g de carne». Ora como poderá Moçambique, sem carne e sem leite, proporcionar à sua população acesso a essas proteínas, mesmo que ela desfrute de condições económicas para adquirir esses alimentos?
Não é possível promover o desenvolvimento económico de um território se a sua população sofrer de deficiência alimentar.
Josué de Castro diz-nos, na sua famosa Geopolitica da Fome, que «uma das formas mais graves e generalizadas de carência - de fome específica - é a deficiência de proteínas». E acrescenta, num outro passo da mesma obra: «A África é, na sua totalidade, um continente de povos famintos. Na fome e na subnutrição crónica pode-se encontrar uma das razões mais decisivas do atraso do continente negro, do relativo marasmo em que se estiola a maior parte das suas populações».
No que respeita a Moçambique, por exemplo, pode dizer-se que, mesmo nos casos em que as suas populações dispõem de alimentos em quantidade suficiente, elas são, de uma maneira geral, subnutridas, por sofrerem da fome específica de que nos fala Josué de Castro; sofrem da fome de proteínas, de vitaminas e de minerais.
E para que Moçambique possa caminhar na rota do progresso e desenvolver as suas actividades económicas, precisa que toda a sua população seja convenientemente alimentada, pois, de contrário, os braços do seu povo não terão força para arrancar ao ventre da sua grande província o fruto dos seus recursos naturais.
A pecuária é, pois, para Moçambique uma das actividades económicas que oferecem um dos aspectos mais aliciantes, pelas vastas perspectivas que representa para o investimento e para o progresso do território. Nem precisa de pensar, por muitos anos, na exportação dos seus produtos, pois dispõe de um mercado interno de grandes e promissoras proporções.
No campo dos lacticínios, por exemplo, e mesmo dentro dos reduzidos padrões de consumo atrás citados, oferece já um consumo de grande volume, que a produção da província, localizada sobretudo nos distritos de Lourenço Marques e Gaza, através da Cooperativa de Criadores de Gado, não consegue ainda suprir. A importação em 1960