11 DE DEZEMBRO DE 1963 2701
zadora, através da qual passará a basear-se no rendimento - real, e não no rendimento normal das actividades económicas, e no capítulo dos transportes se pretende seguir uma via diferente.
Parece-me, pois, que, antes da coordenação dos transportes, se deve procurar uma coordenação fiscal; e, por outro lado, no capítulo da coordenação dos transportes, o principal problema a resolver é o da estruturação, em bases sólidas, de todo o sistema de transportes públicos terrestres.
Em matéria de coordenação, mais algumas observações devo fazer. E evidente, pelo espírito do Decreto-Lei n.º 45 331, que há um manifesto desejo de travar o crescimento do nosso parque de veículos de carga, que de 1951 para 1961 registou um aumento de 70 por cento, ou seja uma taxa média de 7 por cento ao ano - taxa que está muito longe de poder considerar-se excessivamente elevada. Ora, como é que este desiderato é compatível com a política que está traçada - e que é caminho que já estamos trilhando- de fomentar a montagem e construção de veículos automóveis no nosso país? Tendo sido investidas centenas de milhares de contos em instalações de montagem de veículos automóveis, e já se tendo formado centenas de operários especializados e de «quadros», vai exercer-se pressão sobre a procura de uma parte (vultosa pelo seu valor) desses veículos, por forma a comprimi-la?
Essa política poderia ter sido útil há dez anos, quando não se pensava em montar e fabricar automóveis no nosso país. Mas, mesmo assim, é discutível, visto que qualquer compressão nunca deveria ser exercida sobre uns instrumentos tão preciosos como os veículos de carga, mas sim. quando muito, sobre os veículos ligeiros de passageiros, que revelam em parte um carácter sumptuário.
Tenho estado a abordar o tema da coordenação entre vários tipos de medidas relacionadas com o nosso progresso económico, e em mais um aspecto volto a falar em coordenação. Trata-se da ligação entre a nossa política de industrialização e a nossa política de integração no espaço económico europeu.
Sempre que este tema tem sido referido, em diplomas legais ou em quaisquer documentos, publicações ou outras formas de comunicação, tem-se considerado a priori que aquelas duas políticas são plenamente compatíveis. E as razões geralmente aduzidas revelam uma contemplação dessa compatibilidade, como se se tratasse de uma evidência cristalina.
Assim, afirma-se que o nosso esforço de desenvolvimento requer o alargamento da capacidade de importação, e daí uma constante necessidade de aumentar as vendas no estrangeiro - objectivo que só é possível se estivermos presentes nos movimentos de integração do mercado europeu.
Que teremos de ingressar nesse movimento é facto que não me parece susceptível de contestação. Já no que não vejo evidência cristalina é quanto às possibilidades imediatas de realizarmos esse desejo. Na verdade, as uniões económicas e as zonas de trocas livres - a história prova-o - originam um crescimento cumulativo nas zonas mais favorecidas e uma estagnação, ou mesmo retrocesso, nas regiões menos aptas a participar no novo mercado.
O desequilíbrio entre o Norte e o Sul da Itália, depois da formação da nacionalidade, é o exemplo mais correntemente apontado, mas outros poderiam ser referidos. Logo, é condição necessária para a criação de um mercado supranacional unificado - o que não quer dizer que seja suficiente -, é condição necessária, repito, que os parceiros do novo jogo económico disponham de trunfos iguais. E. de certo modo, esse requisito existe entre os membros do Mercado Comum. Todos esses seis só têm a ganhar pela abertura das suas fronteiras às mercadorias, capitais o serviços dos demais.
Mas será que a nossa posição, em relação aos movimentos de integração das economias europeias, se pode pôr em termos semelhantes aos da França, Alemanha, Itália, etc.? Creio bem que não. Estão novamente «na moda» as ideias livre-cambistas, e quero crer que o figurino nos assentará bem um dia - mas não agora, que temos uma economia magra e franzina. Só daqui a alguns anos largos, quando, mercê do nosso esforço de desenvolvimento, passarmos a estar em condições comparáveis às de uma Bélgica, de uma Holanda, de uma Suécia ou de uma Suíça.
A própria Comunidade Económica Europeia não foi feita por um simples tratado assinado em Roma. Não foi a mera vontade dos governantes daquelas nações que determinou o nascimento de uma- poderosa união económica na Europa. Não: esse tratado resultou de uma evolução da conjuntura económica e política e, principalmente, de uma experiência prévia, que foi o Mercado Comum do Carvão e do Aço. Foram as regras de concorrência estabelecidas pelo tratado de Paris, a sua aplicação pela alta autoridade e a superveniência de uma conjuntura favorável no mercado do aço e outros factores relevantes que transformaram num êxito aquilo que tantos viam com incrédula indiferença.
Eis porque me parece que não devemos ter a veleidade de ir discutir com os deuses as nossas condições de entrada no Olimpo.
O movimento para a integração económica europeia - para já cindido em dois grandes mercados supranacionais - é, repito, algo que teremos sempre de ter em mente, como destino inevitável. Mas julgo que não será ousado perguntar se não deveríamos primeiro pôr a casa em ordem. Referi já que o nosso esforço de manutenção da integridade do solo pátrio prejudicará, necessariamente os nossos programas de desenvolvimento; e interrogo-me se um ingresso prematuro naqueles movimentos europeus não se constituirá em dificuldade adicional.
Note-se que não é a escolha que fizemos entre a Associação Europeia de Comércio Livre e o Mercado Comum que eu pretendo aqui pôr em dúvida; mas o mesmo não poderei dizer quanto às condições em que ingressamos na Associação Europeia de Comércio Livre, que costumamos ver como uma «lança na Europa», parafraseando o portuguesíssimo Nuno Alvares Pereira. Mas nem é bem aí que pretendo chegar: o ponto que desejo focar é que, antes de termos sonhos tão ridentes, deveríamos, digo-o mais uma vez, pôr a casa em ordem.
Sr. Presidente: o panorama da nossa indústria, tirando uma parte dos nossos sectores que têm sido implantados em bases sólidas, é simplesmente confrangedor. A extensão de fenómenos como a baixa produtividade, as reduzidas dimensões, a má qualidade dos produtos, o mau equipamento - e, simultâneamente, o sobreequipamento - é algo que devemos ter em mente quando pensamos na nossa integração no concerto europeu.
A nossa industrialização processa-se, há várias décadas, sob o signo de um proteccionismo pautai e burocrático (pela via do condicionamento e mercê dos esforços isolados e individualistas de industriais, quantas vezes saídos das fileiras operárias, sem preparação e sem visão para serem outra coisa do que simples mestres de oficinas medievais. Pensar que se pode passar uma esponja sobre tudo isto em duas décadas (isto é, até 1980, data em que estaremos na Associação Europeia de Comércio Livre já sem quaisquer privilégios) é pura fantasia.
Mesmo que não perdêssemos um só dia desses vinte anos que nos foram concedidos - mas, na verdade, já