2718 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 105
recursos naturais do País, é preciso pôr o homem na maravilhosa a inesgotável potencialidade de que Deus lhe enriqueceu o espírito, e quando se tem presente que, após a queda de nossos primeiros pais. aquela maravilhosa e inesgotável capacidade não desabrocha nem floresce em toda a sua plenitude senão pela instrução, só pode concluir-se, no plano de uma governação consciente de suas pesadas responsabilidades, por colocar adiante de todos os investimentos os que visem o fomento da educação, salvaguardando, como é evidente, os necessários à integridade da Pátria, que é valor cimeiro.
Ora, digo-o com alguma tristeza, na proposta de lei de autorização de receitas e despesas para 1964 a educação não beneficia das atenções de que poderia julgar-se merecedora, preterida como aparece por outras rubricas - salvaguardadas as da defesa nacional - cujo integral aproveitamento ficará, ao fim e ao cabo, dependente da expansão que a própria educação vier a alcançar.
Se não erro, foi na proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1963 que, em relação aos últimos anos, terá sido marcada directa e especial intenção de iniciar as providências financeiras, mercê das quais a educação viria a auferir das dotações postuladas pelo «reconhecimento expresso da sua natureza infra-estrutural no plano social e económico», como se lê no erudito relatório daquela proposta de lei. «Além do seu significado puramente cultural e humano - continuava o Sr. Ministro das Finanças -, pretende-se, com a inclusão das novas rubricas, o fortalecimento das estruturas em que funciona o nosso sistema económico».
Foi com este significado básico e com este alcance - é ainda o pensamento do Prof. Pinto Barbosa - que foram inscritas duas novas rubricas atinentes à educação: aceleração na formação de pessoal docente universitário e intensificação na concessão de bolsas de estudo.
Contempladas na panorâmica das grandes e urgentes necessidades financeiras da educação nacional, aquelas providências pareceram-me então de dimensão algo reduzida. No entanto, nelas antevi um propósito novo e alentador e nesse entendimento as agradeci neste lugar ao ilustre titular da pasta das Finanças.
Posso agora verificar não ter cometido erro crasso quando julguei por aquele modo, já que a tradução orçamental das aludidas providências neste ano de 1963, a que respeitavam, veio confirmar o que previra. Por elas, o volume das verbas orçamentais destinadas à educação nacional não sofreu alteração sensível. Aliás, não era apenas esse aspecto quantitativo, mas também o da própria natureza das rubricas consideradas, que poderia não ganhar anuência de todos quantos mais se debruçam sobre estas questões.
Na verdade, seria dos mais prementes, na educação nacional, o problema da formação do pessoal docente universitário? Ê sendo, como é, um pessoal docente de elite, altamente qualificado e de escasso número por isso, poderá a sua formação ser consentânea com a dita aceleração?
O resultado verificado - a não utilização do correspondente a 117 unidades das disponibilidades financeiras concedidas em 1963 para essa rubrica - talvez possa ajudar a meditar na possível resposta ás interrogações postas.
Pelo que respeita à intensificação da concessão de bolsas de estudo, parece desde já indispensável substituir o regime que a disciplina. Na verdade, a quem devem ser concedidas as bolsas de estudo: só aos já estudantes ou também aos que o desejarem ser e o não são, precisamente, por as famílias não disporem de recursos económicos que lhes permitam sê-lo?
E mesmo que continue a entender-se que devem ser excluídos desse benefício os candidatos a estudantes e que só a quem já frequente a escola deverá ser concedida bolsa de estudo, como se explicará que tenham ficado por atribuir, em 1963, 52 bolsas no ensino universitário e 38 no ensino normal, e que já em 1962 não tinham sido distribuídas cerca de 50 no ensino secundário?
E, aliás, que significado efectivo poderá ter no fomento da educação e aproveitamento dos seus valores a concessão de bolsas de estudo, se o cômputo da frequência do ensino liceal, técnico (elementar e médio), normal e superior é da ordem dos 230 000 alunos e as bolsas de estudo não atingem o milhar, num total que fica aquém dos 5000 contos?
Permita-se-me aqui um parêntese comparativo: o Fundo de Igualdade de Oportunidade, que em Espanha tem funções algo semelhantes às que buscamos com a concessão de bolsas de estudo, teve no ano lectivo corrente, a dotação de 1 milhão de contos!
Embora assim, a iniciativa anunciada na proposta de lei de autorização das receitas e despesas para 1963 mereceu, como referi, o meu aplauso - e agora o reitero -, se não tanto pela incidência imediata de acréscimo que dela poderia receber o orçamento do Ministério da Educação Nacional, ao menos pelo espírito que traduzia e que a mim se afigurava promissor de novos feitos.
Infelizmente, nesta proposta de lei de que nos ocupamos, os feitos são os mesmos.
Ponderosas razões terão levado o Sr. Ministro das Finanças a manter agora as providências decididas no último ano.
De entre outras, poderão mencionar-se, segundo se infere do exaustivo relatório, as que resultam da expectativa criada a este quadrante da vida nacional pela elaboração da profunda reforma que culminará no Estatuto da Educação Nacional, já anunciado pelo Sr. Prof. Galvão Teles e cuja planificação abrangerá os dois fundamentais aspectos da educação - o quantitativo e o qualitativo.
Será essa uma reforma de rara envergadura, muito diferente, nos objectivos e na estrutura, das reformas parcelares a que nas últimas dezenas de anos vieram sendo sujeitos os vários ramos do ensino.
Nenhuma entre elas mereceu os cuidados de preparação ora tomados, confiando os seus estudos prévios a qualificados grupos de trabalho, recolhendo elementos das mais diversas proveniências, tanto nacionais como internacionais, considerando o especial condicionalismo do fenómeno escolar neste começo da segunda metade do século XX, discutindo perspectivas e definindo soluções para largos anos, olhando, enfim, o problema da educação nas suas múltiplas, variadas e complexas facetas.
Por ela, presto já a minha calorosa homenagem ao Sr. Ministro da Educação Nacional, cujas lições tive o prazer e o proveito de escutar na Faculdade em que foi meu mestre.
Não poderei, pois, deixar de louvar e de aplaudir, quanto em mim caiba, iniciativa de tamanho significado na história da educação nacional.
Ela exprime bem a viva impressão que terá tocado a consciência do Prof. Galvão Teles quando pôde medir, em toda a sua extensão, as necessidades do nosso ensino - desde o infantil ao superior.
Sem embargo de tal reconhecer e exaltar, a mim me parece, no entanto, que, seja qual for a estrutura da reforma em preparação, sempre nela haveriam de caber as providências financeiras que deveriam ser desde já consideradas, visando, por exemplo, o alargamento e o aperfeiçoamento da rede escolar primária - há centenas de professores sem colocação, porque há milhares de regentes escolares a substituí-los, com graves inconvenientes para o ensino; há lamentáveis excessos de lotação e consequente falta de