O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

16 DE DEZEMBRO DE 1963 2781

Encontramo-nos assim na segunda questão atrás referida - a da delimitação das atribuições e competência das instituições locais.
Não referirei aqui só aqueles encargos que deveriam pertencer antes ao Estado. Atenderei sobretudo àquilo que entendo dever constituir atribuição dos municípios em matéria económica e ainda- à forma como outras instituições locais deveriam ser chamadas a dar o seu efectivo contributo à nossa vida rural.
A feição intervencionista do Estado em matéria económica deve ter correspondência na posição assumida pelos municípios. Competirá ainda a estes um apoio às actividades privadas, um controle destas actividades e a satisfação, mais ou menos directamente, de necessidades públicas. No primeiro caso poderão enquadrar-se: os trabalhos públicos que criam infra-estruturas, apoiam a luta contra o desemprego ou de cujo efeito multiplicador dos investimentos se tira proveito, além do mais, para o nível dos consumos; a política fiscal que afecta disponibilidades líquidas e opera alterações no nível dos rendimentos; a própria política de urbanização, com seus efeitos sobre as facilidades na localização de indústrias.
Já no que se refere ao controlo das actividades privadas será de exemplificar com as medidas de polícia económica. Finalmente, no sector da satisfação das necessidades colectivas, poderemos invocar o caso dos chamados «serviços públicos». A sua gestão realizar-se-á directamente, através de fórmulas resultantes de acordos entre a Administração e os particulares.
No primeiro caso, poder-se-á utilizar um órgão especial da Administração ou o simples concurso dos serviços gerais; no segundo, recorrer-se-á ao arrendamento, à concessão e à economia mista.
Ora, é precisamente em relação às sociedades de economia mista que o nosso ordenamento é insuficiente.
Elas possibilitam uma colaboração entre o interesse público e o lucro capitalista, permitindo a associação dos capitais públicos com os privados diminuir a importância do esforço financeiro do sector público, ao mesmo tempo que se incentiva o investimento privado, pela segurança que a presença do ente público proporciona. Abre-se assim um novo capítulo na colaboração para o progresso da vida local e um estímulo para mitigar uma indesejável propensão à liquidez entre as populações rurais.
Conviria, em suma, que a lei afirmasse directamente a possibilidade de os municípios participarem na constituição de determinadas sociedades de economia mista.
Mas se o esforço do desenvolvimento económico justifica novas atribuições dos municípios, existem razões históricas e de aptidão funcional que recomendam que outras atribuições lhes sejam retiradas. Mais uma conveniente ordenação da vida local impõe que outros organismos, além do município, sejam chamados a desempenhar tarefas bem definidas.
Volto assim ao problema assistêncial e às Misericórdias. Continuo convencido de que a Misericórdia da sede do concelho deverá ser o órgão central da assistência concelhia, cumprindo-lhe congregar a acção beneficente de todos os estabelecimentos ou organismos de carácter local.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - A esta Misericórdia cabe o primeiro lugar nas actividades hospitalar, e assistêncial, realizando-se tal missão com o apoio do seu hospital sub-regional. Devendo constituir encargo da Misericórdia da sede do concelho a assistência prestada aos pobres e indigentes com domicílio de socorro na respectiva área, teria tal encargo sua contrapartida na participação das Misericórdias nos rendimentos da lotaria nacional e no produto de imposição fiscal que o Governo cobraria e entregaria para esse fim.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Como se sabe, depois da aprovação pela Assembleia Nacional do n.º 2 da base IV da Lei n.º 2115, ficou estabelecido que as Casas do Povo e suas federações incluirão entre os fins institucionais objectivos de previdência social, designadamente os da acção médico-social, assistência materno-infantil e protecção na invalidez, em benefício dos trabalhadores por elas representados e das demais pessoas residentes na respectiva área que, nos termos da lei, devam equiparar-se aos trabalhadores. Para a realização progressiva de tais objectivos estipulou-se ainda que o Governo deverá actuar com a possível urgência, de forma a generalizar a protecção social aos trabalhadores rurais e famílias.
E esta urgência em estender a segurança social às populações rurais que advogo com insistência.

O Sr. Augusto Simões: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz o obséquio.

O Sr. Augusto Simões: - Era apenas para perguntai-se V. Ex.ª entende que em todo esse esquema assistêncial que acaba de pôr com todo o brilho não tem o município uma palavra a dizer? Não acha V. Ex.ª que todas essas funções não devem desenvolver-se fora do âmbito municipal? Poderá V. Ex.ª conceber que o município deva ficar alheio a tudo isso, sendo, como é o órgão que centraliza toda a vida local?

O Orador: - V. Ex.ª é conhecedor do Código Administrativo e, portanto, sabe que na constituição do município existe um órgão chamado conselho municipal. Esse órgão tem uma feição representativa, e nele estão representadas, por assim dizer, as Casas do Povo e Misericórdias. Assim se salva o espírito e coordenação de toda a actividade local. Deve V. Ex.ª ter reparado que o processo das minhas deduções se faz em matéria de encargos. Eles deveriam realmente ser transferidos para estas instituições.
A função dos municípios neste aspecto é apenas uma função de política, administrativa geral.
De resto, exigindo o desenvolvimento da assistência certo espírito e determinada técnica, tudo isso pressupõe um serviço social que não poderá ser preenchido pela burocracia municipal.
Esse serviço não deve estar adstrito aos municípios, porque estes não podem, na sua orgânica actual, desempenhar tais funções. Trata-se de uma matéria absolutamente especializada, que exigirá um serviço social que corra paralelo ao espírito de caridade das próprias Misericórdias.

O Sr. Augusto Simões: - Agradeço a explicação que V. Ex.ª acaba de dar-me. Mas o que motivou o meu reparo - que de resto nem foi reparo, porque estou dentro da política que V. Ex.ª preconiza - era apenas a valorização municipal, de que de maneira nenhuma me parece que se possa prescindir na definição dos esquemas assistenciais, porque o município representa, centraliza e dirige toda a vida local.
É claro que conheço o Código Administrativo, conheço as assembleias, representativas locais; mas também conheço, como V. Ex.ª, grande parte da sua ineficácia.