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16 DE JANEIRO DE 1964 2911

É a insatisfação dos tempos de hoje, fenómeno que existe sempre que se não vive na apatia nem na estagnação. É o desejo, a ânsia de todos nós de obtermos sempre mais, sobretudo quando as necessidades elementares ainda estão em muitos casos por satisfazer. Vivemos, na verdade, uma época em que parar é morrer, e ninguém quer morrer, os homens ou as terras, pelo menos ingloriamente. Existe uma insatisfação em grau elevado, que é a mola impulsora de um progresso benéfico, quando acompanhado e fixado nos seus justos e possíveis limites.
Peço desculpa para não aceitar que os órgãos de governo regional ou local tenham uma vida artificial.
Aceito as dificuldades que os afligem, mas a obra que está no seu activo é indesmentível e só possível, não com uma vida artificial, mas com uma vida real. Ela deve-se essencialmente à orgânica legal e à intervenção de certos departamentos do Estado, nem sempre exercida com critério certo, prudente, demasiado impertinente e indiscreta, por vezes, para que não fira as susceptibilidades municipais.

O Sr. Augusto Simões: - V. Ex.ª dá-me licença?

O Orador: - Faz favor.

O Sr. Augusto Simões: - Era apenas para dizer que esse desencontro, que V. Ex.ª colocou noutra situação, a meu ver situa-se precisamente nas grandes dificuldades que a própria orgânica administrativa criou. E, exactamente por causa dessas dificuldades, muitos homens menos fortes sentiram-se na verdade apoucados e remeteram-se a esse fatalismo inerte. Isto foi um produto desse artificialismo da vida administrativa, e o defeito está no sistema, e não nos homens.

O Orador: - Parece-me que o sistema está certo, e a seguir darei a minha opinião acerca dos homens, que nem sempre cumprem com o seu dever. Porém, aos que cumprem, nunca o Governo faltou com o seu auxílio.

O Sr. Jorge Correia: - Pode é não haver dinheiro para as comparticipações.

O Orador: - E a par delas, ou como consequência, ou provocando esta última, quantas dedicações, quantos sacrifícios, sem outro objectivo que não seja servir a terra, servir o País, e sem outra paga que não seja -isso acontece! - a ingratidão, o esquecimento ...
Fale-se mais e melhor da falta de valores locais ou da preocupação exagerada de escolher os dirigentes entre pessoas que não são muitas vezes as que conhecem os problemas das terras ou por elas serão capazes de se dedicar e entusiasmar, porque estranhas ao meio, para o qual são levadas pelas emergências de uma carreira pública, pondo-se de parte autênticos homens bons, no sentido verdadeiro e tradicional da palavra, apenas porque não dispõem de um título universitário.
Sei, por experiência, o que estes valem, a sua devoção, o seu amor à terra onde nasceram ou na qual se estabeleceram definitivamente. Para os últimos, ela será a terra de seus filhos e, portanto, ainda mais sua.
Aceito mais depressa que a valorização dos meios regionais ou locais se faça pela tomada de consciência dos seus habitantes, em relação a forças intrínsecas, manancial de seiva vitalizadora, através da formação de elites dirigentes. Essa é que me parece a verdadeira questão e a ausência dessas elites a causa principal da crise de que nos queixamos. As providências do Estado virão inevitavelmente por créscimo.
Ao Estado interessa, ou merece muito maior interesse, ser procurado e solicitado do que ter de estimular ou até oferecer aquilo que sabe antecipadamente nem sempre será aproveitado. Há concelhos, vida municipal progressiva, em constante desenvolvimento e há os outros, estagnados na apatia, conformados com autêntico regresso. Felizmente, são aqueles que se queixam ... e daí muitas queixas. É a vida, em contraste com a morte.
Os primeiros têm elites, têm chefes, quem dinamize a sua administração. E justo e necessário que o Estado os compreenda. Dos últimos ninguém fala, ninguém dá por eles, ninguém os conhece. E indispensável que o Estado os faça despertar do marasmo em que vegetam, fazendo-os renascer por mãos mais hábeis, que não podem chegar vazias. A esses é indispensável que o Estado ajude.
Mas haverá, na verdade, que fazer a reforma do Código Administrativo ?
Se reformar é modificar os princípios doutrinários em que assentou o Código de 1940, parece-me, e estou bem acompanhado, que não há qualquer reforma a fazer.
A orgânica administrativa portuguesa, sem ofender as legítimas liberdades dos povos, deu uma estabilidade ao funcionamento das autarquias, da freguesia, do concelho, do distrito, que não pode ser substituída pelas lutas partidárias do código de 1911, nem muito menos pelo controle do Estado exercido por sovietes locais, um e outro que tiram toda a autonomia e independência ao corpo administrativo.
Agora, se reforma é uma nova publicação do código, adaptado às realidades e ao condicionalismo da vida portuguesa de hoje, que não são as mesmas de há 23 anos, então há que reformar, rever o código e sem demora.
Por um lado, o código já não é hoje o que era em 1940. Se não estou em erro, foram publicados nestes 28 anos nada mais nada menos que cerca de 30 diplomas legais, leis e decretos-leis, alterando os seus artigos, alterações mais ou menos profundas, que foram até à extinção da província e à atribuição de funções autárquicas ao distrito.
Impõe-se, portanto, a sua nova publicação, mas dêem-se às autarquias os meios necessários para exercerem a sua função legal e natural.

Vozes: -Muito bem !

O Orador: - Reputo fundamental para se atingir esse objectivo:
Que se aumentem as receitas, para o que as recentes reformas fiscais devem ter aberto caminho útil.
Que se desonerem de encargos que melhor possam ser satisfeitos pelo Estado ou por organismos paraestatais. Nesse caso está o problema, sempre em discussão e matéria de atritos entre o município, os munícipes e as instituições de assistência, do tratamento e internamento de doentes. Não vejo que seja fácil obter-se uma solução satisfatória enquanto o seguro social não abranger todos os trabalhadores, e principalmente os rurais, que são aqueles precisamente que provocam maiores dificuldades às finanças municipais.
Remunerem-se dignamente os médicos municipais e os veterinários municipais, mas julgo que, quanto aos primeiros, não se encontrará solução conveniente para os povos, dispondo hoje de uma assistência precária, senão com a criação das carreiras médicas e, quanto aos segundos, por acordo com outros sectores do Estado, a quem os mesmos prestam serviços.