3692 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 146
matérias-primas para as suas indústrias, parece que originaram o desânimo e fizeram esmorecer a iniciativa.
Não insisto em que esta indústria - ou qualquer outra - seja instalada em Moçambique por pessoas saídas das fileiras da sua própria população, isto é, que seja instalada, como inicialmente foi requerido, pelos próprios plantadores de sisal. O que é preciso é que a indústria se estabeleça, pois nada mais recomendável do que Moçambique exportar, na medida do possível, o seu sisal devidamente industrializado. Que venham, pois, os cordoeiros da metrópole para Moçambique, com a sua técnica e com o seu capital, enriquecer a província e enriquecer-se também, porque ali poderão, junto da respectiva matéria-prima, desenvolver um grande mercado de exportação para os artigos que fabricarem.
Esta seria também uma maneira, entre muitas, de se valorizar a economia de Moçambique e aumentar a sua produção.
Deixo para o fim o problema da industrialização em Moçambique do seu algodão, do seu «ouro branco», que se cultiva de norte a sul, e de cuja cultura e economia vivem mais de 2 milhões de moçambicanos.
Numa intervenção que fiz nesta Câmara no dia 11 de Dezembro do 1962, defendi a instalação da indústria têxtil em Moçambique. Baseava-me então, como hoje me baseio, na circunstância de ser aquela província grande importadora de tecidos de algodão a par de grande produtora, da respectiva matéria-prima.
A legislação em vigor, porém, não permite que sejam concedidas licenças para a instalação no ultramar português da indústria de tecidos de algodão.
Pedi a revogação dessa legislação, chamei com insistência a atenção para a gravidade da injustiça, sugeri que fosse a própria indústria têxtil da metrópole a proceder à instalação em Moçambique das respectivas unidades fabris, pois que a ela justamente é que sobram conhecimentos técnicos e capitais para poder desempenhar-se com êxito da incumbência.
Chegaram então a comunicar-me - e daqui agradeço a gentileza dessa comunicação - que funcionavam na metrópole comissões com o fim de estudarem a montagem em Angola e Moçambique de unidades industriais, sendo uma dessas comissões destinada a estudar especificamente o fomento da indústria algodoeira naquelas nossas duas províncias.
Rejubilei com a informação e pensei que finalmente o assunto ia ser solucionado; que Moçambique teria, em breve, os benefícios do desenvolvimento no seu território da indústria de fiação e tecidos de algodão.
Mas os meses decorreram na tua lentidão enervante e um espesso manto de silêncio envolveu os projectos que então pareciam esboçar-se no sentido de industriais metropolitanos procederem u instalação no ultramar do progressivas unidades fabris não só da indústria têxtil como de outras indústrias.
Quero crer que apesar do silêncio que se fez entretanto à volta de tão promissora iniciativa, os trabalhos tenham continuado, e não tenha esmorecido o ânimo dos industriais metropolitanos que tinham volvido as atenções para o ultramar português.
Não acredito que possam restar dúvidas, a quem possua, sensatez, acerca da urgência da industrialização do ultramar, porque é justamente na sua valorização económica e consequente povoamento que está a melhor defesa dos vastos territórios que em África são o prolongamento da Nação.
Moçambique exportou em 1962 34 933 t de algodão em rama, no valor de 606 949 contos. Este não foi, porém, o seu melhor ano, pois precisamente no ano anterior o valor de exportação desta importante matéria-prima chegou a roçar a casa dos 700 000 contos.
Por outro lado, no mesmo ano de 1962 Moçambique importou 3845 t de tecidos de algodão em peça, no valor de 252 588 contos.
Continuam os números a justificar, portanto, a tese da instalação em Moçambique da indústria têxtil algodoeira.
E não esqueçamos que, além do consumo interno, representado pelos números que acima ficaram relativos à importação, Moçambique pode ainda contar com bons mercados de exportação.
Esta indústria seria para Moçambique mais uma incomparável e valiosa fonte de produção para o equilíbrio da sua balança comercial e para a defesa da sua balança de pagamentos.
É precisamente numa publicação oficial, editada por um departamento do Ministério do Ultramar (a Junta de Investigações do Ultramar), que se preconiza a defesa da balança de pagamentos de Moçambique pelo desenvolvimento naquela província da indústria de tecidos de algodão (Breve Estudo sobre a Balança de Pagamentos de Moçambique, de António dos Santos Baliza e Maria de Lurdes Barata).
Parece-me assim que estou bem acompanhado nos princípios que defendo.
Julgo não ser possível adiar por mais tempo a instalação em Moçambique da indústria têxtil algodoeira. Tenhamos a coragem de acabar com uma situação que não deve manter-se, quanto mais não seja e quando outros motivos não houvesse, para ao menos se evitar que se repitam afirmações como esta de homens da categoria intelectual de Roger Bastide, professor da Sorbonne e antigo professor da Universidade de São Paulo, que, a p. 140 da edição brasileira do seu Brasil, Terra de Contrastes, diz o seguinte:
A industrialização foi tardia no Brasil. Primeiramente, devido à causa política do pacto colonial. Até à chegada da corte ao Rio de Janeiro, Portugal proibia a abertura de fábricas na sua colónia, que devia obrigatoriamente comprar na metrópole todos os produtos industriais de que necessitava.
Os tempos hoje são diferentes. Já se não duvida de que a industrialização do ultramar é tarefa que não pode mais adiar-se. Tem-se mesmo a impressão de que certos sectores metropolitanos se inclinam para essa industrialização. Mas há, por vezes, forças estranhas que se movimentam subterraneamente, anulando essas tendências e comprometendo assim o futuro da Nação, porque, repito, é precisamente no povoamento do ultramar (mas para o povoarmos é preciso explorarmos os seus recursos económicos) que está a sua melhor defesa. Não é deixando que todos os anos 40 000 portugueses emigrem para o estrangeiro; é tornando possível a fixação desses portugueses no ultramar; mais ainda: é abrindo também as portas desse ultramar à fixação de emigrantes estrangeiros que queiram vir honestamente colaborar nos nossos empreendimentos; é promovendo o desenvolvimento geral, completo, verdadeiro, indiscutível, de imensos territórios ainda fracamente povoados.
Esta é a grande obra a realizar, para bem de todos, do brancos, pretos e mestiços, dentro do nosso sistema multirracial, de igualdade e de fraternidade, da maneira de trabalhar e viver da sociedade portuguesa.
Sr. Presidente: vou concluir as minhas considerações. Mas antes quero ainda repetir aqui, à guisa de esperança posta nos destinos de uma grande parcela da terra por-