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4 DE DEZEMBRO DE 1964 3989

A melhor repartição do rendimento nacional, assim posta como meta de uma planificação, vai direita ao centro da questão social. Enunciá-la será ter a coragem de confessar que é mais acentuada do que a justiça manda, e nós queremos, a desigualdade entre ricos e pobres.

Sempre há-de haver uns e outros é certo. A distância que os separa é uma fatalidade da própria natureza humana. São desiguais os homens, hão-de, por isso, ser desiguais os seus rendimentos, e isto em todos os tempos, em todos os lugares, em todos os regimes. Não é, pois, aí, nessa condição natural, que o problema nasceu, ou melhor dito, não é a essa fatalidade social que o III Plano de Fomento pretende ocorrer quando se propõe repartir melhor o rendimento nacional.

A medida dessa desigualdade é que não está certa; contra ela é que importa reagir, pois é ela que vem privando muitos do suficiente à dignidade de homens do nosso tempo e vem consentindo a muito poucos que se afoguem numa ostentação e num poderio que são uma ofensa a todos e espezinham e contradizem toda a doutrina do Regime.

E contra essa medida sem controle, é contra as situações que ela cria e assegura, que tem de entender-se este revolucionário objectivo do III Plano de Fomento - a melhor repartição das riquezas da Nação.

E bem oportuna será e bem necessária se tornou essa meta.

Postas as condições da criação de maior riqueza nacional, assegurado já o seu crescimento a níveis de que podemos orgulhar-nos e que, apesar de tudo, desejamos dilatar, temos mesmo de ampliar, haveria que regredir ao propósito implícito desde o início em toda a tarefa de progresso e de desenvolvimento económico - a sua mais equitativa distribuição.

Como se divide entre nós o rendimento nacional?

Todo o mundo o sente e ninguém o conhece ...

«Não existem estatísticas portuguesas que mostrem a repartição do rendimento», declara o Prof. Pereira de Moura.

E confirma: «Além dos conhecimentos obtidos pela observação corrente das realidades sociais, quase nada se sabe acerca da repartição do rendimento em Portugal. E um campo em que escasseiam muito os elementos de estudo e, talvez por isso, os estudos sérios.»

Assim será no domínio científico. Na realidade social, contudo, todo o mundo sente como se distribui o rendimento nacional ...

E sente que ele se reparte com muitas e graves desigualdades, que está nas intenções do III Plano de Fomento corrigir. Estruturas de organização económica ou, talvez preferível, do funcionamento de uma política económico-industrial, oriunda e consentida por um obsoleto regime de condicionamento industrial que, muitas vezes, ao longo dos seus 30 e tantos anos de vigência, tem sido desviada e desvirtuado da sua benéfica e por isso aceitável missão, vêm desordenando ou, pelo menos, agravando o desordenamento da repartição da riqueza nacional, mais acentuado ainda a partir dos fins da segunda guerra mundial.

A maciça acumulação nas mãos de alguns da maior parte do produto nacional, dando em resultado a quase extinção de uma classe média de sadio e imprescindível desafogo económico, retira quase todo o significado útil, no ponto de vista humano e social, às médias de capitação que, nesse domínio, invocamos nas nossas estatísticas, frente às de outros países.

Infelizmente tais médias não resultam da aceitável curva que suavemente se desenhasse a partir do máximo para o mínimo, antes definem linhas quebradas, de saltos bruscos, que assinalam profundas e chocantes diferenças entre ambos os pólos considerados.

Publicação idónea, de invulgar categoria para o meio português e que. segundo é voz pública, conta com o patrocínio e a responsabilidade de prestigiada congregação religiosa, informava não há muito que em Portugal ascendiam a duas dezenas as fortunas superiores a 1 milhão de contos!

De mais algumas dezenas serão também as fortunas de largas centenas de milhares de contos, logo abaixo do milhão.

E não será difícil concluir que todas elas se processem fora da agricultura.

Nenhuma fonte oficial das que podiam e deviam fazê-lo, se fosse caso disso, corrigiu ou rectificou a informação.

Causa prémios tal saber, mas penso que o inconveniente maior e mais grave não está em declarar o facto, mas em que este exista.

A mim, proletário sem inveja, a quem Deus generosamente concedeu as qualidades de trabalho que garantem aos meus o pão de cada dia, a mim a quem falta até a imaginação para supor o que possa ser a vida com a fortuna de 1 milhão de contos a atrair por todos os meios e processos rendimentos e lucros fabulosos, duas observações magoaram nessa notícia..

A primeira, que ela tenha acontecido sob o signo da Revolução Nacional.

De algum, modo me senti defraudado na minha fé! Eu aprendi a ler com Salazar: entrei na escola quando a Nação a chamou ao Governo. Desde então ouvi e aprendi que o problema e questão essencial do Regime era o dei justiça social, da justa repartição da riqueza nacional.

Bendita questão, abençoado problema, monologuei sempre comigo.

E, no entanto, foi possível o facto que aí está, mas foi possível - e esta é a segunda observação que- me doeu -, não por invulgar capacidade de trabalho, por excepcional progresso de técnica por terrível risco de novos empreendimentos, não, enfim, por causas que de algum modo ajudam a compreender e a aceitar fortunas individuais daquele quilate, mas sobretudo par via de condicionalismos legais proteccionistas que eliminam o risco em o reduzem a teor sem significado, que dispensam o constante progresso e aperfeiçoamento técnico nas instalações, e a argúcia, o engenho e trabalho nos responsáveis. E essa condição é que politicamente me doeu em carne viva.

Eu podia aqui ilustrar estas afirmações enunciando e descrevendo o processo económico de produtos de que o povo português consome milhões e milhões de quilos por ano e paga pelo dobro do preço por que os adquiriria se não fora aquele condicionalismo, e isso sem prejuízo de excelente e legítimo lucro para quantos interferem com os seus capitais e o seu trabalho no mencionado processo.

Avalie-se por ao lucro nacionalmente ilícito assim recolhido.

Não o farei, por desnecessário, mas socorrendo-me do autorizado exempla de há dias do nosso distinto colega Santos da Cunha, também só me resta apelar daqui para o Sr. Presidente do Conselho. E nele que confio, é nele que confiamos.

O Sr. António Santos da Cunha: - Muito bem!

O Orador: - Encerrado este parêntesis de digressão por matéria tão desagradável, e que tem o condão de