4 DE DEZEMBRO DE 1964 3987
dade de população no País e que alguns dos seus concelhos, e mesmo a própria sede, estão longe de dispor de instalações hospitalares à altura e à escala das necessidades das suas populações, como sucede, nomeadamente, com o concelho da Feira, ao norte do distrito, que com uma população que caminha para a cifra dos 90 000 habitantes, quase um quinto da população de todo o distrito, apenas dispõe de um pequeno hospital, com mais de 50 anos de vida, construído numa das suas freguesias, o qual. prestando, embora, relevantes serviços e mantendo-se em grande parte por favor da benemerência da família do seu fundador, está muito longe de poder satisfazer as necessidades, em tal matéria, daquela volumosa população.
Por isso mesmo. Sr. Presidente, permita-me V. Ex.ª que mais uma vez eu apele para o Governo quanto à execução do Plano em ordem a que no planeamento e na dotação dos novos hospitais a construir se venham «i preencher, sem mais delongas, as faltas e as insuficiências de unidades hospitalares que ainda se notam, e clamorosamente, no distrito de Aveiro.
Sr. Presidente: Embora de real interesse para o progresso e valorização das condições económicas, sociais e políticas do meu distrito, receio. 710 entretanto, que estes breves apontamentos que acabo de referir não sejam suficientes para justificar a minha ousadia de ter subido a esta tribuna para tomar parte na discussão do Plano Intercalar de Fomento. Por isso, para vencer e de alguma forma tentar dominar este receio, há-de V. Ex.ª permitir-me. Sr. Presidente, que, antes de descer dela. me detenha, ainda que apenas por breves minutos, sobre um tema amplamente contemplado no Plano, da minha constante predilecção, e esse do mais elevado e premente interesse nacional - o da agricultura.
Todos estamos de acordo em reconhecer que a indústria agrícola, e de uma maneira geral o que comummente st; chama a lavoura, atravessa um período de extrema dificuldade, é vítima de vicissitudes de toda a ordem, constitui motivo e razão das nossas mais justificadas apreensões e suscita, a todo o pano e a todo o momento, a adopção d c medidas drásticas em ordem a travar e a deter a sua fatal corrida para a ruína total.
São comummente conhecidas as causas deste alarmante estado de coisas: o aviltamento dos preços dos produtos da lavoura; a má estruturação do ordenamento agrário; a fraca rentabilidade da indústria agrícola; as deficientes condições naturais e climáticas; o êxodo rural, etc.
Há porém, um mal que talvez não tenha sido posto em evidência e em foco tanto quanto seria mister: é o do desinteresse e desapego da gente nova pelos campos e pelas coisas da lavoura e pelas actividades da agricultura.
O Sr. Paulo Cancella de Abreu: - Muito bem!
O Orador:- - Nota-se, com efeito, da parte da juventude rural, falta de gosto e de interesse pela arte e até pela ciência da agricultura; e disso é reflexo a pouca frequência de estudantes nos cursos do ensino agrícola e a diminuta- quantidade dos que chegam à conclusão desses cursos, conforme muito judiciosamente se aponta no douto parecer da secção dia Lavoura, inserido no da Câmara Corporativa, elaborado sobre o projecto de Plano de Fomento que estamos apreciando.
Ainda há dias Sr. Presidente, numa reunião, no Porto, do conselho geral da Federação dos Grémios da Lavoura, tive oportunidade de numa intervenção, ainda que episódica, apontar à consideração dos presentes -e eram os responsáveis e os dirigentes de mais de 40 grémios da lavoura do Entre Douro e Minho- aquilo que classifiquei como o pior mal, de todos o mais grave, para a
lavoura portuguesa, que é exactamente, em meu modesto parecer, o desta indiferença, o deste desinteresse, o deste desapego da nossa juventude rural pelas actividades agrícolas.
Vozes: -Muito bem!
O Orador: - Apontei então quão graves, eram os males, de todos conhecidos, que afectam a nossa agricultura: mas opinei que, a meu parecer, o pior de todos era ainda o da falta de vocações para as actividades ligadas ao cultivo da terra. E lembrei então que era mister desenvolver uma campanha intensa, pertinaz e fecunda, não apenas no sentido de recuperar para a lavoura aqueles que continuamente a abandonam e a desprezam, mas sim,- e também, e sobretudo, iniciar e projectar uma
campanha e um movimento destinados a fazer despertar vocações para as actividades agrícolas na gente moça dos nossos campos como a única forma válida e capaz de se assegurar para o futuro a manutenção deste sector da economia, absolutamente indispensável a nossa sobrevivência.
Parece-me que, na verdade, a crise da nossa agricultura não é apenas de ordem económica; é também de ordem social, de ordem política e até de ordem moral no ponto e na medida em que as condições e as facilidades do Mundo de hoje fazem correr à aventura- muitos daqueles que, noutras épocas, ficavam amarrados aos ditames das Leis morais, apanágio comum outrora das famílias que viviam na terra e para a terra.
Há por isso que empreender um trabalho gigantesco não só de recuperação de vocações, mas muito principalmente de criação de vocações novas para as artes e para as ciências práticas da agricultura, pois estou crente de que hoje já não bastarão para resolver a crise simples medidas económicas e técnicas -tal o mísero estado a que só deixou chegar a nossa infortunada lavoura - mas sim serão necessárias, além daquelas, outras medidas de verdadeira preparação psicossocial de persuasão, de convencimento, de forma, como digo, não só a recuperar vocações para a lavoura mas sim a despertá-las, a protegê-las e a encaminhá-las devidamente. Para tanto, daqui faço votos a que se mobilizem todos os meios e práticas de ensino, de cultura, de aprendizagem, de propaganda, de publicidade, de aliciamento e de sedução na escola, em todos os seus escalões, na fábrica, mesmo nas horas vagas das tarefas fabris, na igreja, sempre que possível, nos campos, a toda a hora de dia e mesmo lê noite, pela palavra, pelo exemplo, pelo ensaio, pela experiência, com o auxílio dos instrumentos e das conquistas das novas técnicas, em suma, lançando-se mão de todos os meios económicos, técnicos, científicos e de todos os ciados da prática e da experiência, numa verdadeira mobilização geral, conduzida toda no sentido de uma verdadeira revolução agrícola, até para que se evite a todo o pano e a todo o custo aquilo que, como já aqui disse uma vez. seria o pior de tudo - a revolução agrária.
Vozes: -Muito bem!
O Orador: -Porém, não tenhamos ilusões, tudo será em pura perda se não se atribuir ao empresário e ao trabalhador da terra aquele mínimo de condições de conforto e de desafogo económico compatíveis, pelo menos, com a sua posição no meio social e com as exigências de um nível decente de vida semelhante e equiparado ao do seu confrade de outras artes ou de outras actividades, e já hoje impossível de se negar até por simples respeito e consideração da própria natureza da pessoa humana.