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4408 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 181

de molde a definir bem o princípio que deverá presidir à sua laboração e que não é outro senão o da indivisibilidade da propriedade da farmácia e da gerência técnica.
Realmente, toda a possível discussão se reúne à volta de a propriedade da farmácia ser livre ou condicionada ao farmacêutico, ambos os temas com defensores a respeitar, mas que, a meu ver, penderá a favor da segunda, porquanto as desvantagens da primeira são incondicionalmente maiores e as consequências naturalmente mais perniciosas, como vem demonstrando bem um passado todo ele merecedor de crítica severa.
Assim, em 1933, altura em que o Governo decretou de maneira bem categórica que nenhuma farmácia pode estar aberta ao público sem que o farmacêutico, sem director técnico, seja seu proprietário no todo ou em parte, com associação com outro ou outros farmacêuticos, com as excepções especificadas e as soluções para as situações criadas ao tempo e para as que porventura viessem a surgir como consequência inevitável da lei da vida, tudo parecia resolvido Mas, num desrespeito total da lei, foram-se criando novos casos, o que fez com que presentemente 60 a 70 por cento das farmácias estejam a funcionar ilegalmente, sem que a fiscalização administrativa, por inoperante, tivesse evitado os factos consumados.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E, porque assim sucedeu, há que impedir a continuação da abusiva situação, a que convirá pôr cobro, evitando-se maiores proporções e definindo de uma vez para sempre as bases que de futuro regulamentarão a legitimidade da propriedade da farmácia Ë o que a presente proposta de lei pretende conseguir
E, assim, depois de analisar atentamente os pareceres da proposta do Governo e da Câmara Coroprativa, sou levado a inclinar-me para a solução governamental, porquanto me parece ser aquela que assegura mais fielmente o espírito e objectividade da execução da lei.
Não quero tornar-me demasiadamente longo, apreciando pormenorizadamente o conteúdo das bases em causa, pois somente quero cingir a minha opinião a alguns pormenores, que considero importantes, na maneira como deverá elevar-se devidamente o nível não só da profissão farmacêutica, mas sobretudo da sua oficina a farmácia.
Sim, Sr Presidente e Srs. Deputados, considero a farmácia como a oficina do farmacêutico, seu legítimo proprietário, dominando um todo que de maneira nenhuma poderá subordinar-se a interesses estranhos à sua profissão, como naturalmente sucederia no caso de o proprietário ser um mero comerciante dominado pelo fim exclusivo da exploração lucrativa Aliás, não posso considerar de maneira nenhuma que a actividade farmacêutica seja um comércio, como muito erradamente alguns querem fazer crer, e, portanto, susceptível de uma administração livre. É que a delicadeza dos produtos que são vendidos nas farmácias, pela sua constituição muito especial, pela sua possível manipulação, a exigir técnicas apuradas, e pela finalidade a que se destinam, que ma s não é do que contribuir para a saúde das populações, implica problemas que somente poderão ser encarados e resolvidos por responsáveis que vivam única e exclusivamente para os resolver, sendo os fins lucrativos meramente secundários quanto à finalidade que se propõem atingir.
Poder-se-ão invocar muitas razões jurídicas e até morais muito respeitáveis a favor da livre propriedade, mas o que nunca se poderá mencionar é a razão humana que implicará o interesse da saúde pública, porque esta pressupõe logo uma formação muito especializada do responsável, que só poderá ser aquele -o farmacêutico- que sem outras peias que não as obrigações deontológicas possa desempenhar com acerto a sua tão delicada e nobre profissão, contribuindo com a sua quota-parte para o êxito da arte de curar que cabe ao médico. E é precisamente sob esta faceta importantíssima que eu vejo o farmacêutico, que deve ser dignificado de molde a criar nele aquela confiança que tão divorciada tem andado a maior parte das vezes da sua personalidade, submetida, quanto não é o proprietário, às arbitrariedades que porventura queriam exercer sobre ele, incluindo até as de ordem financeira, pois não é raro ver-se nos tempos que decorrem ser remunerado pelos seus serviços de direcção técnica com umas míseras e escassas centenas de escudos, nada compensadoras das canseiras que demandam os longos anos do seu curso universitário que escolheu por natural inclinação. E é precisamente por este motivo que se sabe muitíssimo bem que tem sido tão fácil de iludir a exigência legal da direcção técnica, já que esta praticamente ou só o é de nome ou não tem sido praticada com aquela presença e assiduidade que é exigida por lei, em virtude de condicionamentos e pressões a que estão naturalmente sujeitos quando não proprietários.
Torna-se, pois, necessário elevar e dignificar a profissão farmacêutica, dando-lhe maiores garantias, e reconhecer-lhe os direitos a que tem inegável jus de contrário, o número de aspirantes à profissão decairá lamentavelmente em ritmo progressivo, o que só se impedirá proporcionando-lhes um futuro garantido pelo exclusivo da propriedade da sua oficina como há pouco lhe chamei.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Naturalmente que haverá a considerar aquelas excepções e situações de transição que a lei quer prever com todo o cuidado, sem prejuízo dos direitos legais de transmissão, a acautelar devidamente. Também, a meu ver, a proposta do Governo é bem pródiga em tais casos e, mais ainda, naquelas situações adquiridas de facto, que não de direito, que se foram estabelecendo desde 1933, procurando definir posições e prevendo solução condigna a seu tempo, de molde a conseguir-se o objectivo principal, que será sempre a concentração da propriedade e da gerência técnica na mesma pessoa dignificada e considerada - o farmacêutico.
Considerando as excepções, quero somente fazer menção àquelas que dizem respeito às Misericórdias e outros estabelecimentos de assistência, em que a propriedade, que se discute, será estranha ao farmacêutico Concordo perfeitamente com tal disposição, na ordem de uma tradição e benefício muito a respeitar, simplesmente, e considero muito importante este facto, deverá ser rigorosamente determinado que a superintender na orientação total de tais farmácias deverá sempre existir um licenciado por cada uma, de molde a não se permitirem abusos semelhantes àqueles que são uma criticável realidade em alguns hospitais pertencentes às Misericórdias, em que a finalidade a atingir é o fim meramente comercial, tão condenado e fora do princípio que deve presidir à sua laboração. Tem-se verificado lamentavelmente que não sé não é respeitado tal princípio, mas também, dentro do ta1 espírito comercial a farmácia do hospital e de outros estabelecimentos de excepção, com fins meramente lucrativos, tem funcionado como concorrente desleal à exploração particular, tornando extensivo ao público em geral