4598 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 192
hidráulico do Incomati-Movene, de outros aspectos respeitantes ao aproveitamento dos recursos hidráulicos do próprio rio Incomati, do Umbelúzi e do Sabié.
Sr Presidente. É de tal gravidade e importância paia Moçambique o problema rio aproveitamento das águas dos seus rios, que não hesito em afirmai que o futuro da província depende inteiramente do aproveitamento que delas se fizer e ainda do que for feito no sentido de evitar que a água dos nossos nos internacionais seja totalmente utilizada antes de chegar ao nosso território, deixando-nos apenas leitos secos e inúteis de nos sem água, mas onde a água correu outrora sem que tivéssemos sabido aproveitá-la.
Não se julgue que procuro pintar um quadro negro com a intenção de despertar preocupações. Infelizmente, já temos o exemplo em Moçambique.
No momento em que escrevo estas linhas (Julho de 1964), o rio Limpopo está quase completamente seco, com excepção dos fundões, não obstante ser este no a a linha mestra de todo um colonato de vastas proporções e intenções de povoamento, onde centenas de famílias enterraram as suas ilusões e as suas esperanças, e cuja obra representa - temos de fazer justiça! - um grande esforço do Estado no sentido de promover a exploração dos recursos económicos de um dos mais ricos vales de Moçambique.
Por este motivo, torna-se urgente a construção da barragem de Massingir, no rio dos Elefantes, cuja água virá alimentar, nas épocas de estiagem, o esquema de irrigação do colonato do Limpopo. Ou então a alternativa da barragem do Mapai, no próprio rio Limpopo, se os técnicos se decidirem por esta solução, em face dos estudos que estão a ser efectuados presentemente.
Penso, porém, que o caminho mais avisado seria ainda o da construção das duas barragens, não só para garantia do colonato já existente, como também para a sua própria expansão futura.
Devido às prolongadas estiagens que têm ocorrido na África do Sul nos últimos anos, o Governo daquela República resolveu elevai de 3 m a 6 m todas as barragens da bacia hidrográfica dos rios Limpopo e dos Elefantes Esta decisão, a materializar-se, vem tornai ainda mais escassos os escoamentos daqueles rios para o nosso território, podendo reflectir-se gravemente na obra de povoamento do vale do Limpopo.
Perderam-se muitos anos antes que se desse início ao aproveitamento das águas do Limpopo. O projecto inicial, elaborado em 1925 pelo então jovem Eng.º Trigo de Morais, quando ainda corria muita água no rio, jazeu inútil mais de 25 anos nas gavetas das Secretarias de Estado, enquanto os escoamentos do rio para o território português diminuíam de modo considerável. Isto, segundo disse mais tarde o próprio Eng.º Trigo de Morais («Nota informativa sobre duas obras de fomento económico e bem-estar social em Moçambique»), por causa da intensa e vasta obra de rega que na União Sul-Africana tem sido realizada e está em curso, com 14 aproveitamentos só na bacia hidrográfica do Limpopo», que «não deixam passar para jusante senão o que é mais em relação às necessidades próprias».
O Sr Ministro do Ultramar, em conferência pronunciada no Palácio Foz, no dia 15 de Junho de 1958, acerca do I Plano de Fomento, disse o seguinte.
Receia-se que tenha sido tardia a resolução tomada, agora que no rio Limpopo corre apenas cerca da décima parte da água que trazia na data do primitivo projecto. Ora, eu penso, pelo contrário, que teria havido maior risco se as obras tivessem sido executadas noutros tempos e contando com o grande caudal de então, visto que se não poderia ter evitado o consumo de água nas obras de hidráulica realizarias em território estrangeiro.
Vê-se das próprias palavras proferidas pelo Sr Ministro que o rio Limpopo, à data em que, depois de muitas hesitações e contingências, ia finalmente dar-se início às obras de aproveitamento da sua água, tinha o caudal reduzido a cerca da décima parte do que fora ao ser elaborado o primitivo projecto.
Não posso deixar de consignar aqui uma palavra de desgosto perante esta triste realidade, cujo enorme prejuízo causado a Moçambique não é certamente fácil de avaliar.
Não creio que os homens que pensaram, em 1925 no aproveitamento hidráulico do Limpopo tivessem alimentado a dúvida de que outros nos tirariam, no futuro, a água que estivesse a irrigar a exploração agrícola de uma importante região da província.
E pergunto o que seria hoje a ocupação económica e demográfica de toda a vasta área onde actualmente se alarga o colonato do Limpopo se se tivesse feito o aproveitamento deste rio na época em que nele pensou o enfio governador-geral de Moçambique Dr. Manuel Morena da Fonseca, cujo nome me apraz recordar aqui. Nem os nossos vizinhos teriam podido aproveitar toda a água que, entretanto, passaram a utilizar em «14 aproveitamentos só na bacia hidrográfica do Limpopo», pois que às suas pretensões teríamos certamente oposto a realidade dos nossos aproveitamentos, como é da ética entre os diversos países no capítulo dos aproveitamentos hidráulicos dos rios internacionais.
Referi-me a este desgostante caso do Limpopo sem qual quer intenção de crítica, que agora nada viria resolver, pois os erros cometidos já não têm reparação possível. Que sirva, ao menos, de exemplo. É que existem em Moçambique muitos rios mais em cujos cursos podem fazer-se valiosos aproveitamentos hidráulicos. Evitemos, portanto, a repetição da história do Limpopo para que a inqualificável inércia que lhe deu lugar não seja responsável por maiores prejuízos praticados contra os interesses de Moçambique.
Quase todos os principais rios de Moçambique nascem em território estrangeiro na África do Sul, na Suazilândia na Rodésia e nos outros países que confinam com as nossas fronteiras. É o rio Maputo, o Umbelúzi, o Incomati, o Sabié, o Limpopo, o rio dos Elefantes, o no Save e outros nos que, no Centro e no Noite da província, desde o Zambeze ao Rovuma, vão desaguar nas costas portuguesas do Indico. Isto quer dizer que o caudal dos rios, de que depende, em grande parte, o desenvolvimento económico da província de Moçambique, está sujeito aos aproveitamentos hidráulicos que forem feitos nos territórios vizinhos.
Esta circunstância peculiar agrava a nossa posição em relação ao problema, pois todos os aproveitamentos hidráulicos que forem feitos a montante da nossa fronteira terão forçosamente de reflectir-se nos escoamentos para o nosso território. Isto implica a necessidade e a obrigação de não descurarmos tão importante assunto, dedicando-se-lhe pelo contrário, o melhor do nosso cuidado e atenção.
Os aproveitamentos que estão a ser feitos nos territórios vizinhos, ou os projectos existentes, não são desconhecidos de alguns dos nossos técnicos, que têm estudado cuidadosamente os reflexos que esses empreendimentos podem ter na vida económica de Moçambique. Mas pouco têm podido fazer, não obstante o mérito que possuem. Faltam-lhes os meios de trabalho, o estímulo, o apoio e até um organismo oficial que reunisse todos os serviços existentes, ou