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24 DE MARÇO DE 1965 4601

a Bélgica, a Holanda e o Brasil, que já aplaudiram vibrantemente as embaixadas artísticas que Coimbra lhes enviara.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Estas fugas espontâneas para o mundo das coisas belas, esta chama que crepita e aquece sonhos da velha academia, não podem deixar-se no indiferentismo das vocações sem valia.
Sr. Presidente. O ensino de belas-artes em Portugal não veleja em mar de rosas.
Nas laudas da imprensa têm, por vezes, ecoado justos clamores à forma como aquele ensino se encontra estruturado e é ministrado nas nossas escolas superiores de belas-artes.
Resta saber se neste sector do interesse público os melhores serão os eleitos para os lugares de cornudo e se a disciplina escolar e a justiça distributiva transcendem mesquinhos particularíssimos ou, pelo contrário, são tributárias da ternura dos afilhados.
Por outro lado, não obstante a exuberância dos seus trabalhos, os nossos artistas nem sempre atingem o grau de emoção, de comunicabilidade e de cultura que denuncia a autenticidade do valor.
Nas criações de muitos dos nossos artistas modernos nota-se, por vezes, tal ausência de inspiração e tão bizarras concepções que o espectador, surpreendido, fica a pensar se se encontra perante uma concretização do belo ou de uma grotesca mistificação da arte e deformação da sensibilidade estética.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - «Fauna equívoca de snobes» - chamou Ortiga y Gaste a esses excêntricos moderadoras de histriónicas caricaturas, que, apesar da sua impotência criadora e olímpica displicência, ainda conseguem os favores de uma crítica cândida e louvaminhas que lhes acena com o turíbulo dos seus incensas perfumados.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - E, mercê da afinidade convencional emergente do comparo reinante, talvez, no proscénio nacional, pompeiem guizalhantes vulgaridades, proclamadas às auras da fama como encarnações de génio, em contraste com autênticos artistas de garra, que, votades ao ostracismo pela emulação cabotina de áulicos emplumados, não têm possibilidade de exibirem a vasta gama dos seus recursos.

Vozes: - Muito bem, muito bem!

O Orador: - Há necessidade de rever o ensino das belas-artes e a forma de protecção aos nossos artistas, de molde a não deixar esmorecer na sombra os valores autênticos, joeirando-se o trigo do joio, as plantas de floração viçosa e fecunda do escalracho estéril e rastejante.
É preciso preparar o condicionalismo para que e os nossos artistas, nos voos da sua imaginação criadora não rebusquem apenas exotismo ininteligíveis e aberrantes, mas se deixem seduzir também pela harmonia formal de uma arte portuguesa na qual aflorem os elementos que definem a nossa paisagem e os traços que individualizam o carácter da nossa gente.
Sr. Presidente Coimbra, que é Portugal em miniatura, pelas suas tonalidades geográficas e humanas, aliadas a uma imarcescível frescura espiritual e perece renovação, deve ter uma escola de belas-artes.
Ao lado da ciência, que abre os pórticos da verdade, ficaria bem a arte a rasgar os caminhos da beleza!
Aquele instituto, enquadrado na cidade universitária, concorreria grandemente para que, no Centro do País, reflorisse o culto de um humanismo integral com o aproveitamento dos seu valores científicos, literários e artísticos.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Constituiria o almejado retorno a uma tradição constelada de uma plêiade de artistas, entre os quais avultam pintores, escultores, ceramistas, gravadores e apaixonados da história da arte.
Seria o bater de asas para horizontes mais dilatados de tantos estudantes que, a par dos programas universitários e dóceis aos impulsos de uma vocação natural, se dedicam às belas-artes com um amadorismo tão primoroso que, não raro, ultrapassa a ascensão de muitos profissionais.
Seria também o incentivo para outros artistas de real valia que, não sendo estudantes, perlustram, com as criações do seu inegável talento, a arte nacional, tanto em terras pátrias como além-fronteiras.
Por outro lado, Coimbra, com a perenidade do seu saber, com as suas repúblicas pletóricas de estuante mocidade, com as suas tertúlias académicas, com o seu mundo de inquietações, de irreverências e de inconformamos, constitui um ambiente admirável para que o artista, longe de se identificar com um simples pincelado de telas ou frio plasmado do barro, seja um detentor de cultura que, a par da técnica de execução, tenha engenho para conceber e asas para voar às alturas de luminosas inspirações.
Coimbra, com a sua história, as suas lendas, os seus costumes, o bucolismo dos seus recantos, com toda a mescurecível policromia dos seus motivos, é um manancial infindo de emoções belas que bem podem ser perpetuadas em manifestações de eterna beleza.
Ainda o fino espírito crítico da Academia, com a sua ironia pronta e penetrante e o seu sarcasmo certeiro e contundente, seria um óbice à proliferação de tantas manifestações de arte espúria que, apesar de tudo, faz alarde de sobranceria e veste galas palacianas.
A Escola de Belas-Artes de Coimbra proporcionaria o recrudescimento de novos valores, provocaria outras correntes de formação estética e, procurando o equilíbrio entre o hermetismo de uns e a desnorteada erupção de outros, contribuiria para a expansão de uma arte caracteristicamente portuguesa.
E Coimbra, que, nas campanhas nobilíssimas do espírito, já não morre no prestígio dos seus doutores, no clarão dos seus poetas e no oiro floreado dos seus prosadores, retomando velhos rumos, buscará então novos títulos de glória na imortalidade dos seus artistas.
Tenho dito

Vozes: -Muito bem, muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr Presidente: - Vai passar-se à

Ordem do dia

O Sr Presidente: - Continuam em discussão as Contas Gerais do Estado e da Junta do Crédito Público relativas a 1963.
Tem a palavra o Sr Deputado Serras Pereira