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4606 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 192

mento), à pequena agricultura de subsistência, à cultura cerealífera, à fruticultura, à pecuária e, sem dúvida nenhuma, à indústria transformadora. Sem auto-suficiência não pode haver saldos positivos e caminha-se para o caos.
O parecer relativo às Contas de 1963 chama a atenção da Assembleia para vários ramos do sector primário de Moçambique, nos quais devo fazer menção especial, embora a mero título exemplicativo, da cultura algodoeira do Norte e de mais uma ou duas actividades do género L1 numa obra de Nelson Saraiva Bravo (A Cultura Algodoeira na Economia do Norte de Moçambique), em passagem em que se encara em conjunto a produção de Angola e Moçambique, que no ano de máxima produção, 1960, cada um dos 584 000 cultivadores, em média, pouco mais recebeu do que 700$ pelos seus 270 kg de algodão encaroçado, ou seja mais ou menos 2$60 por quilograma
(p 63). Este autor menciona o enunciado da intenção de elevar o preço de compra para 6$ no local de concentração, enunciado feito por um dos interessados na compra e na propaganda da cultura entre os agricultei es nativos.
Ora no parecer verifica-se que a indústria metropolitana, ao invés de montar nas duas (províncias de governo-geral mais unidades transformadoras, através das quais, sem se prejudicar, beneficia as respectivas economias, vem comprando cada vez menos algodão ao ultramar e vem aumentando constantemente a utilização do algodão estrangeiro.
Longe de num está a ideia de acusar quem quer que seja, porque não sei de culpas, mas não posso privar-me de vincar o desconforto que nos dá semelhante evolução numa era que se tem definido como de gradual mas pertinaz integração do espaço económico português, sonho acalentado por todos e cada um dos que proclamamos que Portugal é só um, é indivisível, se espalha pelo Mundo e nele são iguais todos os filhos.
Um a um, explanam-se mais uma vez, numa insistência que a objectiva justeza fundamenta plenamente e não pode deixar despreocupado quem quer que tenha de orientar, ou autorizar, ou simplesmente verificar as soluções, os problemas de primeiro plano da economia ultramarina.
Ao algodão, tratado até 1961 num regime sobre o qual desabou como que um telhado de casa a arder, tantos eram os queixumes e as exigências de correcção e de justiça humana, mas a que sucedeu uma orgânica de eficácia ainda não comprovada no aumento do peso na balança comercial - ao algodão segue-se o açúcar, a castanha de caju, a copra, os óleos vegetais, o sisal, o chá e as madeiras (para só mencionar os produtos de maior incidência). Alinham do lado positivo a castanha de caju, com o seu notável poder de estabilização da balança, os óleos vegetais, o sisal e as madeiras, do lado negativo o chá e a copra, além dos dois primeiros.
Não tenho o direito de fatigar VV Ex.ªs Sr. Presidente e Srs Deputados, metendo-me a divagar pela estatística. A roupagem estatística poderia fazer-me perder o fio à meada, se pesasse mais ou fosse mais comprida do que convém à exposição das minhas ideias simples. De resto, desde que desejo fazer acentuar um ou outro aspecto já evidenciado no parecer, bastará remeter para este a gentilíssima atenção de VV Ex.ªs.
O algodão e o açúcar têm pontos de contacto, mas há aspectos em que divergem largamente. As terras que convêm a um parecem não convir ao outro, o regime social da exploração opõe um ao outro, no algodão os concessionários compram aos produtores os frutos, separam deles os caroços, que vendem para a extracção dos óleos e dos bagaços, e por fim vendem a fibra aos fabricantes, pode talvez pôr-se à hipótese de não estar ainda atingido o nível de remuneração considerado socialmente necessário e útil, por causas que convirá estudar e remediar, quer sejam de natureza técnica, como possíveis defeitos de profilaxia ou falta de apoio mecânico à cultura e à colheita, quer sejam de natureza comercial ou social e, portanto, se situem no campo do critério humano da valorização.
O certo é que a produção tem baixado e este facto não pode deixar de ter reflexos da maior gravidade no conjunto nacional, obrigado a sangrar-se em divisas para comprar lá fora o que pode produzir em quantidades suficientes para si e para vender aos outros, e que estes reflexos não podem deixar de alinhar entre os factores de depauperamento.
Eis algo em que será possivelmente útil a reunião de uma mesa redonda, em volta da qual se sentem os representantes da administração - pública e os das diversas fases da produção, comercialização, transporte e aproveitamento industrial, e veja cada um que contributo pode dar à cura do mal, de olhos postos na sobrevivência, que não nos individualismo das culpas ou dos proveitos.
Tal qual no ramo algodoeiro, o açúcar é tratado em regime monocultural ou quase e cujas consequências sociais parecem agravar-se aqui por alguns motivos essenciais. Nestes, devo relevância ao facto de se ocuparem baixas férteis, aluvionárias e de fácil irrigação, com imensos latifúndios de diminuta densidade démica. Ao contrário do algodão, no açúcar escritura-se a favor da empresa transformadora o proveito imediato da cultura e a população empregada tem ou teve nos salários um promotor de meios de vida de primeira grandeza.
Creio que mereceria estudo a fundação de um colonato açucareiro experimental de regime familiar, policultural, dispondo da sua unidade transformadora cooperativa, e em que a posse da terra viesse a cair ao colono com os restantes bens que lhe coubessem no conjunto, sem as pulverizações de propriedade que costumam trazer as heranças.
Quero crer que semelhante hipótese já terá ocorrido à consideração dos nossos economistas, de cujo espírito se não ausenta a necessidade da observação sociológica, e quero crer que eles lhe terão pesado o poder de fixação à terra e até o de polarização de certos sectores populacionais em evasão através das fronteiras, às claras e às ocultas, em busca da França ou em busca da República da África do Sul.
Por muito insensato que pareça, sinto o dever de advogar soluções paralelas a esta nos domínios da horto-pomi-cultura e da pecuária ou noutros, como o da própria cultura algodoeira, através das quais se prosseguisse a política da fixação.
Assiste-se a uma debandada que lembraria a dos carnenos de Panúrgio, se não fosse de homens e não ostentasse laivos de tragédia, e não sangrasse o País de preciosíssimas energias humanas Devo e presto aqui uma homenagem a S. Ex.ª o Presidente do Conselho, que lhe mandou estudar as causas e as possibilidades de espancamento, pondo ao serviço dos interesses nacionais nesta faceta da nossa vida sócio-económica os espíritos mais esclarecidos, e com essa homenagem o aplauso do incitamento e da esperança na continuação da obra de recuperação do nosso povo - recuperação no pão e recuperação no espírito, tanta vez sujeito às mais nefastas influências doutrinarias e às mais perigosas rebeldias