4602 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 192
O Sr Serras Peralta: - Sr Presidente. Ao iniciar esta minha intervenção sobre as Contas Gerais do Estado de 1963, mão quero deixar de render as minhas homenagens ao ilustre relator do parecer, Eng.º Araújo Correia.
Na verdade, o parecer revela um extraordinário conhecimento das realidades financeiras, económicas, sociais e políticas do País, preconiza soluções, analisa objectivamente os problemas e o seu sentido crítico está eivado do mais são critério e da isenção própria dos grandes espíritos.
E assim, o parecer é um manancial fecundo de meditação, um ponto de partida para o início de muitas actividades e um documento válido, pela juventude das soluções para problemas fundamentais Embora a análise nele expressa seja rica em pormenores, apresenta, todavia, soluções globais, enquadramentos preciosos, normas de acção.
Se na base do problema português reside em grande parte um problema económico e se o progresso dos povos se mede hoje pelo seu nível de vida, capacidade de investimento e índice de produtividade, há que procurar as soluções mais adequadas de acordo com os mais altos interesses ou, como diz o distinto relator, «a política económica bem conduzida terá de ter como principal objectivo aumentar os rendimentos globais, elevar a capitação do produto interno e da população, de modo a serem possíveis maiores consumos e mais volumosos investimentos».
Para a efectivação, porém, de uma política económica definida nestes termos há que ter em consideração um problema prévio - o crescimento harmónico e equilibrado -, o que pressupõe a planificação global, enquadrada em esquemas sectoriais e no planeamento regional.
Depois da discussão e aprovação, nesta Assembleia, das bases da proposta de lei relativa ao Plano Intercalar de Fomento, o esclarecido Deputado Dr. Ulisses Cortês apresentou uma moção, fruto longamente amadurecido no seio da Comissão Eventual, expressamente constituída para estudo e apreciação do Plano e de que foi eficientíssimo e imbatível presidente, em que na alínea g) se afirma peremptoriamente que «para a realização gradual e dentro das possibilidades, se proceda sem demora à elaboração de programas de desenvolvimento regional, especialmente nas zonas do interior, onde é mais reduzida a capitação do produto e mais premente a necessidade de modificar a estrutura da produção e a distribuição defeituosa da população activa» O que equivale a dizer que o Plano Intercalar sofre de uma lacuna grave - a de não estabelecer programas de desenvolvimento regional.
No entanto, na base VI da lei, no n.º l, alínea c), se define a competência do Conselho de Ministros para os Assuntos Económicos quanto à aprovação dos planos de desenvolvimento regional.
Esta matéria está tratada no relatório do projecto do Plano Intercalar com largueza e acuidade.
Se uma das características do II Plano de Fomento foi a de suma forte concentração do investimento em pólos de desenvolvimento já existentes», deu origem, por isso mesmo, a um agravamento das disparidades regionais do País. O actual condicionalismo político-económico está dirigido, e muito bem, para os empreendimentos e actividades altamente reprodutivos, sem esquecer contudo, e isto é importante, os elementos de valorização regional que consintam a correcção de desequilíbrios tanto sectoriais como regionais.
Nestas circunstâncias, a localização das indústrias, os aproveitamentos de energia, as reconversões agrárias, as zonas de turismo, podem, em certa medida, tender para um melhor e equilibrado crescimento.
Para atingir este desiderato prevê-se, pelo menos no que respeita a localização de indústrias e em vista a um desenvolvimento equilibrado, a publicação de legislação adequada a estas finalidades.
Esta nova matéria legal encerra o propósito da criação de novos pólos de desenvolvimento por instalação de complexos industriais ou ainda o aproveitamento das zonas em que se reconheça a existência de suficientes infra-estruturas que mais prontamente poderão transformar-se em fortes núcleos motores da actividade económica.
Por outro lado, não são menos válidas as posições tomadas pela Câmara Corporativa ao ter de se pronunciar sobre estes mesmos problemas.
Na verdade, o Prof Francisco Moura, no seu parecer sobre a Junta de Planeamento Económico Regional, teceu judiciosas e oportunas considerações relativas a esta ma teria. Também o mesmo digno Procurador, no parecer relativo ao Plano Intercalar de Fomento, retomou mais uma vez este mesmo assunto, pronunciando-se francamente por uma concepção descentralizada Ultimamente ainda, o distinto Prof. Castro Caldas, a propósito do Plano geral do aproveitamento hidráulico da bacia do Mondego, concluiu pela urgente necessidade da elaboração de «um plano de desenvolvimento regional que integre o conjunto de acções complementares de aproveitamento hidráulico previsto».
Não tem outro significado o conteúdo da Lei n.º 2009, que cria o Plano Director de Desenvolvimento Urbanístico da Região de Lisboa. Com efeito, essa lei, que foi nesta Assembleia motivo da mais alta reflexão e mereceu um bem fundamentado parecer da Câmara Corporativa, faz realçar os inconvenientes e desvantagens das grandes concentrações urbanas, provocadas pela instalação maciça, apenas em certas zonas, das actividades industriais.
Os problemas postos e as soluções preconizadas pela Câmara Corporativa e pela Assembleia Nacional são perfeitamente actuais, e se, por mérito indiscutível da lei, se têm refreado um pouco as instalações do sector secundário na região de Lisboa, ela não tem por si só o condão de descentralizar as actividades industriais e os serviços.
Na essência do problema reside uma falta de vigorosa acção política que desde há muito, segundo cremos, devia provocar um salutar revigoramento económico e social nas débeis regiões interiores do País.
Não obstante as dificuldades de pôr em execução uma positiva política descentralizada em todos os escalões, factos novos se apresentam contudo à nossa consideração - o reconhecimento de que os problemas de urbanismo estão intimamente ligados aos de desenvolvimento e que já não há lugar, dentro dos novos conceitos de urbanização e urbanismo, para a antítese ruralismo-urbanismo.
Já nos foi dada a oportunidade de preconizar desta tribuna o aproveitamento integral do vale do Tejo Julgamos assim, hoje como ontem, porque sem dúvida alguma o vale do Tejo constitui a região mais rica do País, não só sob o ponto de vista agrícola, mas também pela localização nas margens do rio dos maiores complexos industriais.
Além disso possui o nosso melhor porto e encerra em si grandes potencialidades económicas e pode permitir desde já o crescimento rápido do desenvolvimento económico.
O distinto relator das Contas também dá grande realce no parecer deste ano, como já anteriormente noutros fizera, no aproveitamento integral do vale do Tejo, preconizando uma série de medidas e de opção de critérios que têm perfeito cabimento na teorização nos planos regionais de desenvolvimento