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16 DE DEZEMBRO DE 1966 901

que estão pelo temporal das paixões do espectáculo circense, a que por vezes não falta um César que na sua omnipotência de julgador infalível acerba os sentimentos partidários dos presentes, ao condenar arbitrariamente, por ignorância, tibieza, iniquidade, um justo vencedor a imerecido vencido.
É o desporto de uma minoria, escassa minoria, que cumpre uma obrigação profissional ou busca um prémio pecuniário.
Aos outros, aos que assistem ao espectáculo, chamam-lhes desportistas também, talvez pela ginástica das mãos, do pescoço ou da garganta, quando não do coração...
Eu sou daqueles muitos que protestam contra as arbitrariedades e contra aqueles que as sancionam repoltreados còmodamente nas cadeiras partidárias do poder desportivo.
As vitórias que nessa espécie de desporto tanto satisfazem justificadamente o orgulho nacional, ainda ontem aqui mencionadas pelo Sr. Deputado Augusto Simões, vitórias da habilidade e do brio de alguns, provocam por vezes uma euforia sonolenta que faz adormecer os responsáveis sob os louros conquistados. Não pensará o Estado que a uma salutar liberdade se terá substituído a licença, que poderá destruir toda a fama e proveito que dessas vitórias resultaram para o País?
Que esforço se faz para levar aos estádios, aos parques de jogos, aos ginásios, às piscinas, a juventude escolar e trabalhadora?
Como reage essa mesma juventude ao fomento da educação física, que pesa já valiosamente no activo do respectivo sector da educação nacional, através das infra-estruturas desportivas e do auxílio prestado às agremiações?
Em que condições se pratica a educação física na escola primária, nos liceus, nas escolas técnicas e nas Universidades?
O problema é vasto e complexo e valeria a pena, pela sua incidência na vida nacional, debruçarmo-nos sobre ele.
Mas é sòmente uma pequena achega, Sr. Presidente, que pretendo dar, trazendo aqui um facto, um acontecimento, uma história que talvez haja passado desapercebida a muitos, mas que representa autêntica lição de dedicação, persistência, serviço de interesse público, a que ficaria mal não dar relevo.
É uma história que vem de longe, de há 90 anos, com o sabor das coisas bem vividas, vividas com glória, que não acaba, antes prossegue em perene juventude.
Em 4 de Novembro de 1876, no Café Amaro, do Muro da Ribeira, cerca do lugar donde o Infante partira em busca de Ceuta e do Império, fundava-se o Clube Fluvial Portuense, para a prática da náutica, então muito em voga entre a gente moça do Porto, que fazia do Douro o local predilecto do desporto do remo e dos românticos passeios rio acima.
Cedo correu fama a destreza e o valor dos remadores, gente da beira-rio e da tradicional burguesia tripeira, cujos honrados nomes continuam, geração após geração, a aparecer ao serviço da cidade e da Pátria.
Eram, e são, da mesma vigorosa cepa dos que em Quinhentos deram à frota do seu mais ilustre conterrâneo o que de melhor possuíam, do alimento, do engenho, do trabalho braçal, da arte das armas, ao sangue derramado.
Correram cinco anos. Em ]881 Cascais embandeirava festiva, porque na sua formosa baía se realizavam mais uma vez, sob o patrocínio do rei D. Luís I, as afamadas regatas, promovidas por outro pioneiro da náutica, a Associação Naval de Lisboa. Convidado a concorrer, o Fluvial Portuense vencia as regatas de quatro e oito remos, surpreendendo os milhares de pessoas que a elas assistiam e deixando atónitos, mas não conformados, os seus experimentados adversários.
O atrevimento ia ter consequências. Ao sabor da vitória sucederia o amargo do agravo, logo suficientemente compensado pelo galardão de um título que passou a figurar no seu nome como um daqueles de que o Clube Fluvial Portuense se há-de orgulhar através da sua longa e gloriosa vida.
Os vencedores, propositadamente, não foram convidados para a festa de encerramento das regatas. Logo o rei o soube e manda alguém em seu nome procurar os valentes rapazes parados fazer sentar à mesa do banquete e ouvirem da boca do soberano as desculpas que outros lhes deviam e a outorga do título de «real», que o clube passaria desde então a usar, sem pagar sequer direitos de mercê.
Pouco a pouco a influência do Clube Fluvial Portuense fez-se sentir em todo o Norte do País. O Clube Fluvial Vila-Condense, o Clube Fluvial Tirsense e o Clube Fluvial Vianense nasciam impulsionados pelo exemplo e pela acção directa dos rapazes da beira-Douro sobre a juventude ribeirinha do Ave e do Lima.
Ele próprio não se quedava na prática do remo, pois todos ou quase todos os desportos nobres, desde a natação, à ginástica, ao ténis de mesa, ao hóquei em campo, ao voleibol, ao andebol, ao basquetebol, ao boxe, ao tiro e outros, encontraram dentro dele, e sob a sua bandeira, numerosos praticantes, muitos dos quais têm sido campeões nacionais ou representaram o País no estrangeiro e nos jogos olímpicos.
E a este propósito não poderá deixar-se no esquecimento a Sociedade de Tiro n.º 43, hoje Sociedade de Tiro do Porto, que apresentou em algumas épocas atiradores de cotação internacional.
Nunca, nos grandes momentos da vida do País, o Clube Fluvial Portuense deixou de manifestar uma atitude virilmente patriótica, tomando a iniciativa, ou participando activamente, de manifestações de regozijo e de reconhecimento para com aqueles que servem a grei aquém e além-mar.
Para ilustrar a afirmação, dois exemplos, entre muitos, o último dos quais inédito, e pena é que não seja seguido por toda a parte.
Em 1897 promove e leva a efeito uma grande homenagem nacional à Armada portuguesa, quando a corveta Sagres e o cruzador Adamastor entram a barra do Douro com os bravos marinheiros que se haviam coberto de glória no ultramar.
A marinha não se mostrou indiferente à manifestação, e o Fluvial guarda nos seus arquivos a mensagem especial de agradecimento do Almirantado encerrada em rica pasta de veludo com as armas reais.
Há meses, 70 anos depois, no decurso das cerimónias da inauguração das suas piscinas, e na presença de cerca de um milhar de praticantes do desporto, com os seus estandartes e galhardetes, entregou a medalha «Pátria e Desporto», com a legenda «Soldado, o teu sacrifício na defesa da Pátria no ultramar é a tua glória», a algumas centenas de jovens desportistas dos clubes do Norte, antigos combatentes da Índia, da Guiné, de Angola e de Moçambique.
Bem mereceu a Ordem Militar de Cristo e a medalha de ouro da cidade do Porto, entre muitos outros galardões que, pelos tempos, lhe foram concedidos.
Nem sempre, todavia, a sua vida de nove décadas ao serviço da, educação física foi serena e tranquila. Nem sempre a Providência e os homens foram propícios ao desenvolver de uma obra a que, por outro lado, nunca