O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

10 DE NOVEMBRO DE 1967 1709

Foi pensando assim, certamente, num paralelo de situações que nos é desfavorável, que no II Plan de De-sarrollo, o plano de fomento espanhol, para 1968-1971, sã dá prioridade ao sector agrícola, no sentido de aumentar selectivamente a produção agrária e, simultaneamente, elevar o nível de vida dos rurais. Enquanto o I Plano concedeu prioridade às indústrias, o que entra em vigor no próximo ano encara prioritariamente o sector primário, prevendo para isso grandes investimentos, para que a agricultura produza tudo quanto sirva o mercado com preços remuneradores.
Mas como criar mais riqueza que a todos aproveite?
A área cultivável do País com aptidão agrícola ou florestal acha-se na sua quase totalidade aproveitada, bem ou mal aproveitada.
O aperfeiçoamento dos meios técnicos de cultura, a assistência técnica oficial organizada ao serviço da lavoura, a mecanização e a motomecanização, a melhoria dos equipamentos, o fomento pecuário, a preparação profissional, a electrificação, as vias de comunicação, o crédito e a política de preços, são factores decisivos a considerar no aumento dos rendimentos agro-pecuários e florestais e, consequentemente, na melhoria progressiva do poder de compra da gente do campo.
Não menos decisivo será libertá-la de formalismos e burocracias importunas e inconvenientes e fomentar um associativismo livre e consciente, fazendo-a entrar mais amplamente nos circuitos da sua produção e afastando para onde não possa fazer mal o parasitismo do intermediário, público ou privado.
Fala-se constantemente em crises da lavoura. Não seria mais de harmonia com as realidades falar-se antes em crise, em crise tradicional da lavoura?
O Sr. Ministro da Economia, em belo discurso proferido há pouco mais de um ano em Santarém, definiu a posição do Governo na opção a tomar em face «da crise profunda da agricultura», sobre se se deveriam resolver os problemas de momento ou pensar em passos mais largos rumo ao futuro. Se o Ministério da Economia, como as graves circunstâncias do momento o exigiam, optou por uma acção imediata, que se traduz em medidas tomadas sobre alguns importantes problemas da produção e da comercialização dos produtos da agricultura e da pecuária, a verdade é que no Plano de Fomento se anunciam medidas destinadas a atender à crise estrutural da lavoura portuguesa. Ainda bem.
Serão elas de volume tal que permitam finalmente a certeza de a crise endémica desaparecer progressivamente?
E, antes disso, estarão estudadas as causas da crise, numa panorâmica que abranja todo o País, e não apenas esta ou aquela região, por forma ao conveniente aproveitamento dos investimentos previstos? Já em 27 de Abril de 1887, ao apresentar à Câmara dos Srs. Deputados a sua lei de fomento rural, dizia Oliveira Martins que «vemos a lavoura em crise».
Contra a crise propunha um movimento de restauração nacional, palavras parecidas com as que lemos desde 1935 nas propostas de lei de desenvolvimento económico de País apresentadas sucessivamente a esta Assembleia. Também Oliveira Martins, ao referir-se à situação económica do País nos fins do século XXI, já estudava a população e o cancro emigratório, a preferência de culturas, a divisão e fragmentação da propriedade, a hidráulica, a florestação, os incultos, os capitais, o associativismo, etc.
Deste afirmava que «o princípio de associação se torna indispensável para que seja eficaz a exploração da terra e para que entre o indivíduo e o Estado haja uma molécula intermediária onde os interesses colectivos dos proprietários de uma zona ou espécie, encontram força e solidariedade».
Nada há de novo neste mundo ...
Tenho para mim, como Oliveira Martins há 80 anos II denunciava na falada proposta de lei, essa proposta de lei que tanto faz meditar nas constantes da economia rural portuguesa perante as circunstâncias da política, a existência na agricultura de crises esperadas do inesperado, provocadas pelas forças da natureza, que o homem não consegue dominar, e de crises fatalistas da ignorância e da inércia. O que acontecia é que os conceitos e as estruturas defeituosas iam servindo de suporte a uma mentalidade que se julgava satisfeita com o considerar Portugal como país perdominantemente agrícola, sem todavia se procurar transformar a terra em meio de actividade propício ao melhoramento progressivo das condições de vida da comunidade.
Procurava atalhar-se a crise como se o doente não tivesse cura, assim como uma constipação crónica agravada pela chuva ou pela seca, à mercê da Providência, como se esta não contasse sempre com o nosso estudo, com a nossa ciência e o nosso trabalho.
O tempo de hoje, de chuva ou de seca, não permite soluções empíricas e não se acredita nas mezinhas.
As técnicas actuais, altamente evoluídas em todos os sectores da vida económica, modificaram totalmente os conceitos e as mentalidades.
O homem sabe que com um número mais reduzido de unidades e despendendo um esforço menor consegue rendimentos superiores aos que obtinha há poucos anos. O sol a sol e a enxada como instrumentos de trabalho agrícola já não são a medida normal da produtividade.
Por outro lado, os meios modernos de informação e de comunicação permitem o conhecimento de todo o Mundo e de todas as coisas do Mundo, embora por vezes falsas, erradas ou deformadas.
O homem do campo deixou de viver limitado pelo horizonte do seu reduzido meio e vê muito mais longe. Vê outros homens, homens como ele, vivendo, ou parecendo-lhe viver, com menor esforço e mais bens, de muitos dos quais ignorava a existência. Até o Estado o obriga à aquisição de novos conhecimentos e habilitações, para o exercício de actividades públicas e particulares, sob pena de perder a consideração social ou mesmo morrer de fome.
Já não encontra nos filhos os braços de que precisava para tirar da terra o pão de cada dia. E acaba por os libertar da servidão da gleba, que é o seu destino, como fofa o de seus pais e avós.
Nível de rendimentos ou de remunerações inferiores aos da cidade, falta de assistência médica gratuita, de abono de família, de pensão de reforma ou invalidez, de energia eléctrica, de meios de comunicação, menor consideração social.
E surge o inevitável. Deslocações maciças das populações rurais para os meios urbanos, emigração, falta de braços nas terras, que acabam por ser abandonadas.
Também entre nós, os que regressam da África, essa mocidade generosa e valente que se bate pela defesa da integridade da Pátria, de cuja dimensão só agora tomaram consciência, trazem os horizontes das suas possibilidades alargados. Não se satisfazem com a mediocridade do meio rural donde haviam partido. Fecham-se, ao regressarem, como que envergonhados de terem de continuar curvados sobre a enxada a desbravar a terra, quando ainda não há muito se erguiam orgulhosos sobre outra terra portuguesa com a arma na mão a defender essa mesma terra por outra forma.