1708 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 91
Efectivamente, a capitação do produto nacional, que era em -1953 de 6200$, passou, dez anos decorridos, para 9000$, ou seja, respectivamente, 215 e 350 dólares. A própria região mais desenvolvida do País, a região de Lisboa, não teria atingido esse nível de 20 contos em 1964, que, todavia, deve alcançar, ou até exceder, no ano corrente.
Com as vantagens que lhe aproveitam, é esse um problema importantíssimo, das assimetrias do crescimento económico português, que o Plano considera e se propõe começar a resolver, de uma zona polarizadora da maior parte dos recursos da Nação, como que um oásis no meio do deserto, para o qual todos se sentem atraídos em busca de melhores níveis de vida.
Numa agricultura à procura dos rumos libertadores dessa mentalidade fatalista, ainda recente, de um país essencialmente agrícola, produtora de boa parte dos recursos de população que aumenta em número e no desejo de vida melhor, que só o desenvolvimento equilibrado dos sectores poderá proporcionar, a percentagem dos activos pouco desceu das quarenta dezenas.
O surto da emigração situa-se fora do normal e conveniente, para além de um saldo demográfico satisfatório. A emigração de portugueses, como se sabe, representa hoje a fonte mais abundante da cobertura do déficit de mão-de-obra de alguns países da Europa/Segundo informa o Anuário Demográfico, saíram do País, como emigrantes, em 1966, 120 239 indivíduos de ambos os sexos, dos quais 86 973 para a Europa, 20 318 para a América do Norte e 7641 para a América do Sul, e, destes, apenas 2607 tomaram o rumo do Brasil.
Sem contar com a emigração clandestina, cujos números as estatísticas não mencionam, melhor se poderão avaliar das consequências dessa sangria de capital humano se a compararmos com o excedente de vidas no mesmo ano de 1966, de 106 852 indivíduos, aliás dentro de taxas de natalidade e de mortalidade bastante boas no quadro mundial.
Acresce que duas terças partes das pessoas que abandonaram o País como emigrantes exerciam profissões dos sectores secundário e terciário.
Se passarmos ao consumo de electricidade, verificamos que, apesar do notável esforço e progresso feito nos últimos dez anos no que respeita à produção, ele é ainda de cerca de 500 k Wh por habitante, não obstante subir em Setúbal para 1039 kWh e em Lisboa, Porto, Aveiro e Santarém atingir os 800 kWh.
A balança comercial metropolitana continua fortemente desequilibrada. O déficit do comércio externo cifrou-se em 1965 nos 10 480 000 contos, com uma taxa média de aumento de 6,9 para as exportações e de 8,1 para as importações, no período de 1956-1965.
E se é certo que as posições relativas dos diversos grupos sofreram oscilações de moderada amplitude quanto às importações, a verdade é que num país de características predominantemente agrícolas, os produtos alimentares apresentam a maior taxa relativa de aumento, bastante superior à dos equipamentos, o que sobremaneira impressiona se nos lembrarmos do esforço no sentido da reconversão e do reequipamento industrial e agrícola.
Por seu turno, nas exportações, verifica-se um aumento dos produtos do sector primário em ritmo pouco sensível, ao contrário dos industriais, o que, se revela certas perspectivas favoráveis na desejada expansão destes últimos, mostra também as consequências de uma economia agrícola em crise.
Sr. Presidente: Quando em 1952, em vésperas do início da execução do I Plano de Fomento, se discutiu nesta Assembleia a proposta de lei sobre o condicionamento das indústrias, recordo-me, a propósito das actividades complementares da agricultura, de se haver citado uma frase proferida anos antes pelo Sr. Presidente do Conselho, de que «ela, a agricultura, não trabalha para o lucro, produz para viver pobremente e alegremente gastar o excesso de outras rendas».
E que já nessa proposta de lei se reconhecia expressamente que a actividade agrícola não deve limitar-se à simples colheita dos produtos da terra, que semeia ou planta, mas ir mais longe, desde a transformação desses produtos à sua colocação nos mercados, integrados em organizações associativas os respectivos produtores, para melhor defesa nessas fases dos circuitos.
Já não é sem um sorriso de amargura que se ouve enaltecer a lavoura nacional e as suas virtudes tradicionais de trabalho, persistência, honradez e poupança. Pouco mais se lhe dá do que o elogio e, mesmo esse, muitas vezes com o interesse de se procurar processo de entrar no seu campo, no campo que só a ela compete lavrar.
Ainda hoje o sector primário absorve cerca de 40 por cento da população activa do País, e muito embora se não possam tirar conclusões seguras, por deficiência de informações estatísticas, sobre a estrutura do consumo privado, o certo é que uma parte desse consumo continua a pertencer a populações vivendo em meios rurais ou cuja base de rendimentos sai da terra.
Quer dizer que, se, por um lado, o nosso desenvolvimento, sobretudo à luz das necessidades actuais resultantes de uma economia de grandes espaços a que estamos subordinados, assentará de futuro por forma decisiva em produções destinadas à exportação, o consumo interno, por outro, constitui, e há-de continuar a constituir, o elemento mais estável do crescimento industrial, base incontroversa de desenvolvimento de dimensões modernas.
Diremos mais: muitas indústrias só poderão existir, e muitas outras desenvolver-se em nível capaz de lhes assegurar uma expansão em termos de concorrência externa, se aumentarem os meios de vida da massa vultosa dos rurais.
Notava o Prof. Ferreira Dias, numa conhecida obra, que «a grande cliente da indústria, pela sua posição dominante na economia nacional, é a agricultura, que só tem vantagem em que esta viva próspera, porque a ninguém interessa ter fregueses sem desafogado poder de compra».
É certo que a situação algo se modificou depois de escritas estas palavras do antigo Ministro da Economia.
Todavia, ainda se dirá que, quando uma parte numericamente importante da população portuguesa, essa massa de pequenos e médios proprietários e trabalhadores rurais, puder alimentar-se melhor, comprar mais roupa para se vestir e aquecer, habitar em casas construídas com preocupações de algum conforto, ser assistida convenientemente na doença e na invalidez, deslocar-se com facilidade por estradas e caminhos de ferro, fazer turismo, obter acesso a certas comodidades e distracções, aquisições da humanidade para proveito e gozo de todos os homens, e não apenas de alguns, obter mais instrução e cultura, renovar « aperfeiçoar os seus instrumentos de trabalho, em suma, quando puder entrar no domínio do que precisa para viver com nível superior ao que hoje desfruta, sem que isso resulte de um curso anormal de valorização que sacrifique os restantes sectores populacionais, então a indústria terá garantida uma larga margem de desenvolvimento estável e não continuará sujeita aos riscos de situações que não dependem sómente da limitada economia do espaço português.