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10 DE NOVEMBRO DE 1967 1707

Existe, nesta segunda metade do século XX, a consciência da dimensão cristã do homem, sujeito de direitos até há pouco ignorados ou menosprezados.
O acesso dos diversos estratos sociais ao conhecimento de teores de vida de que só poucos desfrutavam e as possibilidades de promoção económica, cultural e social generalizadas pelo aparecimento das técnicas modernas e a sua divulgação impulsionaram rapidamente a efectivação desses direitos.
E não se vê maneira, felizmente, de voltar atrás.
Mas eles de pouco valerão sem conteúdo moral e espiritual, sem uma mentalidade que se satisfaça com a conquista dos bens materiais suficientes para suportarem e garantirem a verdadeira liberdade, reduzindo-os à sua função de instrumentos do bem comum, que deve ser o bem de todos, se não o bem de alguns, e, muito menos, de armamento de poder e de domínio.
Choca profundamente a nossa sensabilidade que tudo se meça por capitações disto ou daquilo. Que um país seja desenvolvido porque dispõe de maior capitação do produto nacional, medido em dólares, de mais automóveis, rádios ou aparelhos de televisão, ou casas abastecidas de água, ou alimentos ricos em calorias por habitante, sem que todos os habitantes disponham do mínimo desses bens e de outros para viverem; que o desenvolvimento se avalie por naves espaciais, quantidades de armas convencionais de guerra ou bombas atómicas.
Choca-nos ainda mais que explosões de movimentos localizados ou generalizados, cujas origens são difíceis de explicar, nos revelem, surpresos, a existência de homens sujeitos a discriminações civis e sociais e em perturbadora miséria económica.
Choca-nos atrozmente que dois terços da humanidade viva subalimentada e que o auxílio dos opulentos se traduza na conquista de matérias-primas e de recursos naturais devolvidos aos que as produzem ou extraem com a sobrevalorização da manufactura, e não na valorização do homem, que por milhões, centenas de milhões, continua a suportar imerecidamente a fome e o desconforto.
Toda a política de desenvolvimento assenta hoje no planeamento económico. O crescimento económico de um país não se dará no ritmo necessário, e cair-se-á no retrocesso ou na estagnação, se ele for deixado à livre iniciativa de cada um dos seus elementos públicos ou privados, sem coordenação e ordem de prioridade.
E isto nas economias de direcção central e nas economias de mercado.
Será bom não esquecer- que a primeira experiência de planeamento económico em grande escala realizada neste século visava essencialmente objectivos muito diversos do desenvolvimento de um povo, social e económicamente atrasado, antes a defesa da ditadura do proletariado contra a ameaça dos 125 milhões de agricultores que se opunham aos 25 milhões de trabalhadores industriais. E como o Estado era o único proprietário dos instrumentos de produção, repartição e troca, e também o único patrão, o planeamento foi até ao pormenor monstruoso de considerar a forma como todo o ser humano deveria ocupar a existência durante os cinco anos da sua execução.
Essa dolorosa experiência, que custou milhões de vidas humanas, não impediu que certos países dominados pela economia de mercado viessem a recorrer ao planeamento, considerado fora do âmbito do conceito de Estado senhor e dono da totalidade dos meios de produção, mas como técnica capaz de orientar e ordenar a comunidade durante um determinado período de tempo no sentido de objectivos ou metas económicas e sociais.
A moderna economia dos grandes espaços obriga, na verdade, a uma avaliação dos recursos potenciais e reais de uma nação e ao seu aproveitamento em termos de concorrência, que as actuações dispersas dos sectores privados e a neutralidade do poder público poriam em grave risco perante o vigor ofensivo das restantes partes integrantes dos respectivos espaços ou de outros espaços.
A circunstância de Portugal constituir com outros países da Europa meridional um grupo em desenvolvimento obriga a encarar sem demoras e com decisão o problema de atingir a dimensão económica que corresponda às exigências de uma integração sem o risco da bilha de barro perante a bilha de ferro e manter a consistência necessária para sustentar as obrigações impostas pela defesa dos territórios africanos.
Dizia o Sr. Ministro da Economia, em 28 de Outubro findo, em Lausana, depois da reunião da E. F. I. A., que importa que o desenvolvimento económico português prossiga em ritmo cada vez mais rápido.
Dentro dessa linha de pensamento, em que todos estaremos de acordo, permito-me acrescentar que se ao respeito pela dignidade do homem repugna usar métodos de planeamento totalitário, contrários à nossa sensibilidade e aos comandos doutrinários e constitucionais, também aquelas exigências imperiosas de se alcançar um desenvolvimento rápido da economia do País impõem que o Plano de Fomento seja, na verdade, um instrumento da programação global desse desenvolvimento, mas não mera e passivamente indicativo.
De pouco valerá, se não dispuser de meios estatais de execução suficientemente robustos para resistir à incapacidade, deficiência, timidez, debilidade ou falta de espírito de empresa que caracteriza muitos sectores da iniciativa privada. O Plano terá de aparecer com instrumentos jurídicos adequados, recursos orçamentais do sector público, participação corajosa deste em empresas de economia mista em determinados sectores, privados, industriais e de utilidade geral, sobretudo nos de base, e organismos de pesquisa, investigação, estudo e comando suficientemente autónomos e maleáveis para se adaptarem às incertezas técnico-económicas que dominarão inevitavelmente o decorrer dos próximos seis anos.
Enfim, o Plano só poderá ter boa execução se for estruturado por uma boa política. E lembro-me, ao falar de boa política, do Prof. Marcelo Caetano, quando dizia que «um país rico, habitado por gente com espírito de iniciativa, pode conquistar invejável nível de vida, mesmo quando mal governado. No nosso caso, porém, não nos podemos dar ao luxo do desgoverno».
Peço licença para acrescentar que desgoverno também se entenderá por falta de decisão suficiente para colocar todos os instrumentos económicos nacionais ao serviço da comunidade e do seu bem-estar, mesmo que para isso se haja de descontentar uma minoria que o não compreenda ou a quem falte espírito para o fazer.
Apetece-me pôr aqui a palavra de Santo Agostinho: «O homem não pode querer senão querendo.»
Sr. Presidente: Portugal ainda não atingiu o grau de desenvolvimento necessário para alinhar com o grupo privilegiado dos desenvolvidos, como, aliás, a Espanha, a Jugoslávia, a Grécia e a Turquia. A O. C. D. E. considera países em desenvolvimento aqueles cujo produto nacional por pessoa não atinge os 700 dólares, que correspondem a mais ou menos 20 contos; possuem mais de 35 por cento da população activa ocupada no sector agrícola; suportam uma emigração elevada; não excedem no consumo de electricidade a capitação de 800 kWh; e têm a sua balança comercial fortemente deficitária.