6 DE MARÇO DE 1968 2621
Sr. Presidente: Quando procedi à sucinta apreciação da teia de imposições tributárias, cujo desenvolvimento o Sr. Deputado Araújo Correia apresenta com inultrapassável clareza, chamou a minha atenção a carga fiscal imputada actividade transportadora rodoviária, isto à camionagem, que continua perante as novas reformas específicas a ser a actividade mais duramente tributada no nosso sistema fiscal.
Efectivamente, nenhuma outra actividade se encontra onerada com impostos de vencimento mensal, trimestral e anual, e como esta tão suposta de lucros, que efectivamente não arrecada.
Todavia, envolvida num sistema de índices muito altos, a camionagem pagou no ano de 1960 a verba elevadíssima de 666 916 contos de tributos, o que representa o aumento de 170 808 contos em relação à já, avultadíssima verba que lhe foi exigida em 1965 em imposto de compensação, imposto de circulação e imposto de camionagem e na contribuição para o Fundo Especial de Transportes Terrestres.
Mas estes são apenas os impostos directos, porque a camionagem também paga os impostos indirectos que recaem sobre os combustíveis e sobre os acessórios utilizados nas suas viaturas, a que se juntam ainda vultosos encargos de previdência.
Esta caudalosa corrente de tributações não está, porém, de harmonia com os volumes dos rendimentos obtidos.
Nunca se publicou um regime tarifário para os transportes da carga e estão bastante desactualizados os preços dos transportes de passageiros, de sorte que são sempre precários os resultados das explorações, o que torna extremamente onerosa e difícil de suportar a pesada tributação que recai sobre esta actividade.
For outro lado, creditam-se-lhe ainda danosas concorrências com os transportes ferroviários, o que influiu desfavorável e injustamente a posição da camionagem na suposta coordenação dos transportes terrestres, toda ela assente em pressupostos de muito precário cabimento.
É certamente por isso que, por exemplo, o Fundo Especial de Transportes Terrestres, para o qual a camionagem contribuiu no ano de 1966 com a volumosa verba de 445 741 contos, e cuja criação teve em vista o fomento das infra-estruturas da mesma camionagem e o melhoramento das rodovias e supressão de passagens de nível, se transformou em fundo de financiamento dos caminhos de ferro, da construção do metropolitano e até de financiamento dos transportes urbanos do Porto . . ., desviando-se ostensivamente dos seus objectivos essenciais.
Neste sector de transportes há anomalias e distorções de toda a ordem, que já há muito deveriam ter sido remediadas, criando-se e seguindo-se métodos de adequada justiça, estruturados em normativos esclarecedores de direitos e de deveres que todos pudessem conhecer.
Tendo o Ministério das Comunicações criado um Gabinete de Estudos e Planeamento de Transportes Terrestres, cujas despesas cobriram os 11 290 contos em 1966, depois de se terem, cotado em 7069 contos em 1965, não será difícil certamente fazer um apropriado estudo de uma verdadeira coordenação dos transportes terrestres que se baseie na equidade, e não em preconcebida ideia de predomínio do carril sobre a estrada, como sempre tem sucedido.
Os superiores interesses da economia nacional continuam à espera dessa coordenação, porque as anomalias, do sector não se atenuam, nem se disfarçam, na vigência dos princípios dominantes do sistema actual.
Sr. Presidente: Como homem rural que me prezo de ser e intimamente ligado aos grandes problemas deste nosso primeiro mundo, como me parece poder classificar-se o domínio do sector primário da Nação, procurei, ansiosamente, no desenvolvimento do parecer sobre as contas gerais do Estado, os elementos referentes à nossa agricultura para poder ajuizar sobre a sua posição, comum e geralmente havida e conhecida como de progressivo empobrecimento.
Os referidos elementos cientificaram-me de que, infelizmente, as referências a esse progressivo empobrecimento, tão glosadas nos vários quadrantes da vida nacional, traduzem verdades irrefragáveis que os números ilustram e dimensionam de forma impressionante.
Efectivamente, a contabilidade das nossas exportações e importações, que acusa um saldo fortemente desfavorável daquelas em relação a estas, demonstra que nesse saldo ocupam lugar de relevo as compras de produtos essenciais para o consumo, relacionados com a agricultura ou com a pecuária.
Daqui extrair o Sr. Deputado Araújo Correia a conclusão acertadíssima de que nos deixamos influenciar largamente e estamos dominados pela ideia de que é mais fácil importar os produtos agrícolas e agro-pecuários de que vamos carecendo do que procurar produzi-los, aproveitando e fomentando os recursos de que o nosso primeiro mundo pode dispor.
Não obstante a facilidade do importar o que não há ser altamente gravosa para a economia interna, como aduz o mesmo Sr. Deputado, porque induz à inércia e pode, no futuro, trazer surpresas e sacrifícios difíceis de evitar, o pensamento do que é mais fácil comprar do que produzir tem-nos levado a um avantajado dispêndio de divisas, que em 1965 se traduz na importação de 264 000 contos de carnes, 550 000 contos de trigo e 287 000 contos de milho, de países estranhos, importação que não decresceu em 1966, mas antes aumentou, porque as importações de trigo já subiram para 829 000 contos, as do milho para 556 100 contos e as de oleaginosas para cerca de 800 000 contos.
É claro que não decresceu também a importação de carnes, o que completa a inércia da nossa produção.
Se se tiver em conta que em todas estas importações muito pequena foi a parte que coube às nossas províncias ultramarinas, ter-se-á encontrado o verdadeiro significado de desfavor económico que elas efectivamente representam.
O geral desordenamento do sector agrícola, para o qual muito se tem programado e muito pouco se tem executado, produziu estes funestos resultados.
Todavia, Sr. Presidente, recuso-me a acreditar que sejamos tão minguados de recursos naturais e tenhamos um clima de tal hostilidade que devamos aceitar como catastrófica fatalidade estes resultados negativos da política da produtividade agro-pecuária que se tem seguido. Não temos, é certo, as facilidades de que outros países desfrutam, mas podemos dispor de elementos que, bem disciplinados e bem aproveitados, nos podem emancipar desta cómoda e fácil ideia de ir comprar ao estrangeiro os bens de consumo essenciais, ideia que nos pode vir a causar as mais amargas desilusões se, pelas trágicas eventualidades dos incertos tempos em que vivemos, encontrarmos um dia os mercados externos fechados para nós.
A valorização integral da nossa agricultura para o conveniente aproveitamento dos nossos recursos naturais, aliás programada para o III Plano do Fomento, apresenta-se, portanto, como uma das maiores e mais prementes necessidades dos nossos conturbados tempos.