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9 DE MARÇO DE 1968 2709

Os mestres de direito público ensinam que o conteúdo do Orçamento é um acto de previsão do Ministro e da Câmara que culmina em forma de lei e encerra um mandato amplo e solene, concedido em nome do contribuinte, que vem a ser o suporte final dos encargos.
Este direito deve alicerçar-se num exame aprofundado das coisas.
Trata-se de um princípio de preeminência representativa ao consentir despesas e ao consentir receitas.
O apuramento das contas pelos representantes consubstancia desta sorte uma fiscalização das aplicações dadas aos dinheiros públicos.
A sua importância prática é, porém, menor. E muitos parlamentos se atrasam ou simplificam neste contrôle constitucional.
Ele, de resto, acaba por um regulamento ou por uma resolução, tal como acontece entre nós.
Tanto a anterioridade da Lei de Meios, que autoriza a confecção do Orçamento, como a do processamento parlamentar, definem o um e o dois, entendo eu.
Não há que tirar ensinamento da colocação do número dispositivo constitucional da tomada de contas. Ele está no desenvolvimento do preceito anterior (artigo 91.º, n.º 2.º, da Constituição).
E não há uma ordem onde se fala de dívidas, amortizável e consolidada, de autorizar a guerra, de aprovar convenções, etc.
Entre antecipação e esperança, definido o porvir e o passado como atestado do direito cumprido, a vantagem lógica está no primeiro.
Os grandes mestres de direito financeiro, Salazar, Jèse, Tangorra, Griziotti, Pigou, Laufenburger e tantos, discutiram sempre conceitos e teorias à luz da carga e dos benefícios das gerações posteriores à nossa. A Conta pode esclarecer, mas não fornece opções como a lei de autorização.
Claro que existe também um problema de dimensão política. Ao passo que o Orçamento Geral diz respeito ao território metropolitano e insular, a tomada de contas abrange todo o território português.
Mas, note-se bem, que os orçamentos provinciais devem organizar-se em princípios e termos uniformes e gerais - quer dizer, em moldes e intuitos unitários e similares.
Assim, entre construtores do futuro e passadistas não devemos estar no segundo lado, mas no primeiro lugar, sem querer com isto atentar contra a soberania e a importância deste debate.
Deixo à Câmara estabelecer a ordem das suas preferências.
«Porque a Conta é a Conta, e não o Orçamento?»
Tenho ouvido alguns oradores impetuosos, e li até dois artigos da imprensa diária - sendo mais vulgar o erro do que se julga -, estabelecendo confusão entre orçamento e conta.
Os dois conceitos divergem muito, estão separados, no tempo e na técnica, e revela-se assim pouco cuidado da parte dos que se extraviam nas fronteiras entre os dois cantões financeiros.
A questão adquiriu novos foros de importância.
Como ultimamente se substituiu aos anteriores conceitos de equilíbrio de gestão, apenas o de equilíbrio de contas públicas, com provimento regular das caixas do Tesouro, a distinção deve ser aclarada, porque se tornaram mais propícias as razões de erro possível.
Também a amplitude conferida pela missão representativa a esta tribuna leva a reclamar, na discussão da Conta, aberturas de crédito, reforços e alterações que teriam mais apropriado lugar nos debates sobre autorização anual de meios e na programação plurienal do fomento.
Mas, parlamentarmente, o caso possui menos relevância do que na crítica financeira e menos ainda do que nos debates de ordem técnica.
Vamos assim insistir numa distinção, para dela poder tirar algum ensinamento.
O Orçamento, que se baseia na autorização de meios e realizações conferidas pela Câmara ao Ministro das Finanças, é um programa de acção governativa para o ano seguinte, um plano de acção política, uma vista detalhada sobre o futuro.
Baseia-se em estimativas, aproximações, cálculos de verbas e de distribuição de encargos, sempre autorizados por um mandato político, tanto de expressão tradicional como popular.
Em termos contabilistas, consiste numa estimativa de custos gerais de serviços e numa escolha e ordenação de meios a empregar.
O Orçamento volta-se para o futuro.
Por assim dizer, podemos chamar-lhe uma profecia, uma visão antecipada da gestão pública, uma noção anterior do comportamento colectivo nos doze meses próximos que vão suceder-nos.
Diversamente, a Conta é o passado - é a crónica financeira do que aconteceu sob a regência de um dado orçamento.
E, como tal, deve conter não uma vista teorética, mas noções práticas do que se fez, do que se logrou fazer.
Ela não lida com provisões e cálculos - lida com números certos e elementos apurados como resultados finais.
Quando o Orçamento nos diz o que se irá passar, a Conta mostra a recapitulação numérica do que aconteceu realmente.
Em vez do domínio das perspectivas e projecções do futuro e das probabilidades, encontramo-nos num reino de certezas inflexíveis.
Bom ou mau, no seu dinamismo, o Orçamento é um profeta e a Conta está petrificada como a mulher de Loth, petrificada, mas olhando para trás.
O Orçamento é para autorizar, mas a Conta é para o mandatário responder pela gestão e para acertar e reverificar.
Portanto, não pode nem deve haver confusão nem emaranhado entre orçamento e contas, que, em financeiros, seria confusão indesculpável.
Mas agora, para mostrar que nem tudo será claro e separável, farei aqui algumas referências.
A primeira - as teorias consagradas sobre efeitos económicos e dinâmicas de pré-financiamento e circuito para afirmar que, ao passar-se do território puramente técnico ao sócio-económico, hão-de analisar-se translações, efeitos e repercussões originadas anos antes e que provocam oscilações benéficas no conjunto.
A segunda - que, sendo o Orçamento um instrumento de investimento e de política económica, o seu dinamismo não cessa no dia 31 de Dezembro e prolonga e acelera no tempo.
A terceira - que as finanças funcionais mostram a possibilidade técnica de trabalhar com empréstimos, taxas, impostos e outras medidas para lograr determinadas capacidades e consequências.
Suplantar certos ciclos, ajudar a expansão, abrigar das vagas de subemprego, contra-arrestar certos fluxos monetários, são hoje instrumentos conhecidos de realizar politicamente.
Há muito que as finanças italianas abandonaram estas noções tradicionais de orçamento e conta e, numa tarefa de sabor contabilista, em que sempre foram mestres, de-