13 DE MARÇO DE 1969 3483
Povo, de modo a convertê-la em autêntico centro social de todos e não em organismo apenas dos proprietários ou trabalhadores agrícolas, que nem sempre representam a maioria da população residente na área?
Pense-se, por outro lado, na orientação da proposta de lei, expressa quanto ao seguro de doença e abono de família e implícita quanto aos outros seguros, no sentido de a cobertura dos riscos sociais ser feita gradualmente pelas caixas de previdência, bem como na manutenção, nas federações, dos poderes mais relevantes em matéria de representação profissional, e ver-se-á que esta evolução, por mais atribuições delegadas que se consignem às Casas do Povo, há-de deixar-lhes exclusiva ou predominantemente, como função mais natural e válida, a relativa à cooperação social.
Repare-se que, segundo a proposta de lei (base XXXVII), o próprio pessoal dos serviços administrativos e da acção médico-social e do abono de família, colocado nas sedes das Casas do Povo - e convirá ou tornar-se-á possível instalá-los sempre aí?! -, fica pertencendo aos quadros das caixas e dependentes destas. Nem doutro modo poderia deixar de ser, uma vez consagrado o princípio da progressiva integração dos rurais na previdência dos trabalhadores do comércio e da indústria. Nem tão-pouco se descortina como possa seguir-se rumo diferente quanto aos restantes seguros ou mesmo quanto às actividades complementares da previdência, chegada a altura da aproximação ou equiparação dos esquemas dos rurais aos dos restantes trabalhadores.
Daí que o acentuar do carácter das Casas do Povo como centros sociais de comunidade, mesmo admitindo a multiplicidade das suas funções, torne mais nítida a vantagem do seu funcionamento também em núcleos que não sejam agrícolas e postule a necessidade de nelas se integrarem, independentemente da actividade exercida e do nível cultural ou social, as diversas pessoas que residem na área do organismo.
Vozes: -Muito bem!
O Orador: - Mas creio dever ser posto de parte, sem hesitações, o fácil recurso ao estabelecimento, por lei, da obrigatoriedade de inscrição de pessoas que não sejam proprietárias ou trabalhadores agrícolas ou equiparados, porque só estes, no rigor dos princípios e no plano das próprias conveniências, podem ser compelidos ao pagamento de quotas ou contribuições.
O problema de fundo é sempre o mesmo: o do prestígio da instituição, assente na obra que realiza e na categoria e simpatia daqueles que presidem aos seus destinos.
Aqui, entronca o problema dos dirigentes, tão raros, sobretudo nos meios rurais, ainda por cima mais empobrecidos, nos últimos anos, com a saída de elementos aproveitáveis que procuraram, e procuram, na emigração a melhoria das suas condições de vida.
Como sublinha o Doutor Sedas Nunes, em trabalho notável elaborado já em 1955, mas que, para além das concordâncias ou discordâncias que possa suscitar, contém reflexões e conclusões do maior valimento, algumas das quais, inaplicáveis na altura, começam agora a ter condições mais favoráveis à sua materialização, dada a evolução registada em muitos aspectos da vida portuguesa - como sublinha o Doutor Sedas Nunes, dizia, os meios rurais precisam, em regra, de uma estimulação exterior para se moverem, pelo que têm de receber d& fora as ideias e os impulsos inovadores, uma vez que os chefes locais só por excepção aparecem de geração espontânea: normalmente têm de ser «suscitados».
É assim por toda a parte. Entre nós, os órgãos do Plano de Formação Social e Corporativa e, em especial, o Instituto de Formação Social e Corporativa, cuja extraordinária acção sempre me apraz salientar desde que, há onze anos, iniciou o seu funcionamento, e as missões de Acção Social, também com um trabalho longo, árduo e da maior projecção, não esgotaram ainda todas as suas potencialidades. E bem poderão intensificar ainda mais a sua acção nos meios agrícolas e suscitar o aparecimento de dirigentes e elementos dispostos a consagrar-se à valorização das comunidades locais.
No mesmo sentido, afigura-se oportuno e necessário proceder à revisão geral dos problemas da formação de assistentes e auxiliares sociais e de outros agentes especializados, de modo a poder dispor-se de um escol que, além de numeroso, possa, pela sua preparação e vocação, dedicar-se em profundidade às tarefas da promoção humana, da aproximação das pessoas, do desenvolvimento comunitário, nomeadamente nas regiões com menores possibilidades e estímulos.
Não será também de pensar na preparação de técnicos de organização de comunidades, que lá fora vêm prestando assinalados serviços nos mais diversos aglomerados populacionais, principalmente na medida em que, consciencializando-os e interessando-os na formulação e na execução dos programas de acção a desenvolver, garantem a estes condições de êxito e de continuidade que de outro modo não alcançariam?
Casas do Povo c representação profissional. - Outro assunto que exige séria reflexão é o de saber como deverá efectivar-se a representação profissional dos trabalhadores da terra.
O problema tem sido muito debatido e para ele se apontam soluções divergentes. Discute-se, com efeito e com certo calor, se às Casas do Povo e às suas federações pode caber, a par de outros, o encargo da representação profissional, ou se é preferível assegurar esta representação através de organismos sindicais a que não correspondam outras atribuições diferentes das relativas à defesa dos interesses da classe e dos quais apenas sejam associados os trabalhadores agrícolas por conta de outrem.
A Câmara Corporativa, no seu Parecer n.º 42-VI, de 1956, sobre a proposta de lei do Estatuto Jurídico das Corporações, inclinou-se para a solução de as Casas do Povo «revestirem exclusivamente a qualidade de organismos de cooperação social e, portanto, sem competência representativa, restituindo-as à pureza da sua origem e retirando-lhes um carácter híbrido que em nada ajuda o seu progresso. Nesta hipótese, as federações que vierem a criar-se seriam apenas especificamente representativas da categoria profissional dos trabalhadores rurais».
Mais tarde, em 28 de Março de 1957, a mesma Câmara, no seu Parecer n.º 50-VI, sobre a proposta de lei das federações das Casas do Povo, ao mesmo tempo que sugeria que elas, sem prejuízo das demais atribuições, tivessem competência para estudar os problemas relativos ao trabalho agrícola e para celebrar convenções colectivas com as federações dos grémios da lavoura, pronunciava-se no sentido de as Casas do Povo continuarem a ser organismos de representação profissional. Mas admitia, se bem interpreto o parecer, que a modificação das condições sociais e culturais poderia vir a aconselhar, no futuro, outra solução. E a este propósito aludia «aos frutos, não longínquos, das medidas tomadas a favor da obrigatoriedade do ensino» e à instauração de um mais perfeito espírito social em consequência da execução do Plano de Formação Corporativa.
O tema vem ao meu espírito sempre que verifico interessarem a variados sectores da lavoura mais os problemas