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DIARIO DAS SESSÕES N.° 194
cello Caetano, louvo-me neste conhecimento para sintetizar os meus sentimentos num muito sincero e confiado voto:
Deus permita a completa recuperação da saúde de Salazar e lhe dê longa vida e a Marcello Caetano não lhe falte com a sua ajuda e a sua protecção, para bem do País, que tem demonstrado eloquentemente como nele confia para nos conduzir na linha de rumo que há quarenta e três anos singramos através da evolução tão difícil a que o mundo nos tem obrigado.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Há mais de três anos, na minha primeira intervenção parlamentar, tentei chamar a atenção do País e do Governo para o grave problema do povoamento do ultramar. Fi-lo em termos de o classificar como questão de âmbito nacional e de primeira prioridade na preocupação dos responsáveis pela manutenção do todo humano e geográfico que constitui Portugal.
Vão passados aqueles anos e pouco se tem podido fazer para organizar esquemas vivos e eficientes que ajudem a fixar povoadores em número adequado e a reagrupar as populações autóctones pela forma mais aconselhável ao seu desenvolvimento cultural, social e económico.
Mas o tempo passou também sobre as camadas que, com particular afinco, trabalham nas escolas para se elevarem socialmente através do ensino; passou também sobre uma estrutura económica que não se desenvolveu a par e passo com as necessidades de se dar um lugar ao sol aos que, em revoadas maciças, se vão apresentando para o pedir.
Poderemos assim concluir que, se os problemas ligados ao povoamento não agravaram ainda os restantes — e receio bem que já assim não seja —, não se simplificaram em coisa alguma com o decorrer destes anos.
Entendo, por isso, ser minha obrigação voltar a chamar a atenção da Camara e do Governo para esta questão, cujo exame julgo ter aqui feito todos os anos.
Com ela comecei esta legislatura. Com ela, possìvelmente, a terminarei.
E que, meus senhores, a vida ultramarina comprova que: sem um esforço concentrado no sentido de haver nas províncias mais povoadores portugueses civilizados; sem uma preocupação semelhante para que nos planos de fomento económico sejam consideradas prioritariamente as coordenadas sociais daquele esforço; sem uma séria e definitiva política de fixação dos militares que queiram ser desmobilizados no ultramar, para o que há que criar condições de atracção....
Vozes: —Muito bem!
O Orador: —.... sem a preocupação nacional de povoar o ultramar — estamos a agravar o risco de, por faltas do passado e de hoje, se perder o sangue que a juventude lhe sacrifica e a herança que os homens de amanhã têm o dever de nos exigir.
Controlada a luta armada contra o terrorismo; vencida a não menos importante batalha contra a dúvida, pela firme e frequente reiteração da política de intransigente defesa do território nacional que Salazar proclamou e que Marcello Caetano reforçou ao confirmá-la; criado o interesse nacional generalizado pelo ultramar, no qual tantas centenas de milhares de jovens já serviram como militares — não devemos permitir demoras ou insuficiências que prejudiquem a grande tarefa da qual depende, na opinião de muitos e à qual adiro, o futuro ultramarino e nacional: o seu povoamento por elementos mais evoluídos, que
auxiliem a,, promoção social, económica e política dos que ainda vivem em fases de civilização mais atrasadas.
A tarefa tem de ser nacional e não só de cada província. Por mais esforços regionais que se façam, os resultados não poderão ser satisfatórios, dada a exiguidade dos meios em relação à grandeza das realizações mínimas essenciais.
Se continuarmos a aguardar que o desenvolvimento económico normal de cada parcela seja o único incentivo à fixação dos portugueses civilizados que para elas se transfiram e ali trabalhem com os autóctones, para com eles desenvolverem o aportuguesamento dos espíritos, das almas e das aspirações, se ficarmos só à espera de que a economia funcione como motor desta obra, então nunca mais a veremos realizar-se na medida indispensável.
Há que planear, para além da economia, com decisão e com arrojo e programar com clarividência. E há que insuflar-se em cada dirigente português — e a todos os níveis —a imperativa necessidade de executar os planos definidos, tendo em conta o ultramar quando se pense na Europa e tendo a metrópole em conta quando do ultramar se trate. Há que impregnar as inteligências e as vontades de todos os responsáveis da coisa pública e das actividades privadas com a imperativa necessidade de se abrirem largos caminhos ao povoamento das províncias ultramarinas.
Quando -assim falo não me refiro — já o esclareci em anteriores intervenções — a embarcar metropolitanos para África, mas sim, também, a promover as condições para, com os portugueses evoluídos (seja qual for a sua cor, origem ou credo, desde que portugueses de vontade e de alma), se conseguir amalgamá-los com os que nesta altura são portugueses de nacionalidade mas ainda o não sejam no seu nível médio de cultura e vida.
A urgente promoção social do homem e da mulher africanos, que tem sido preocupação, a todos os títulos de louvar, e a que tanto se esta dedicando o actual governador-geral de Moçambique, esta promoção social tem de ser feita simultâneamente com o aportuguesamento interior de cada indivíduo e de cada família.
Sem isso, estaremos a construir na areia, no que a Portugal respeita, porque a elevação para formas mais altas e civilizadas da vida humana não terá os alicerces nacionais profundos que permitam, dentro de poucos anos, que aqueles que agora vivem o seu processo de ascensão sejam tão portugueses como todos os outros.
E não se pense que a obra é simples ou fácil. Não é. Póde avaliá-lo devidamente quem se tenha debruçado sobre a questão e sobre os resultados — sucessos e fracassos — ligados à promoção social do autóctone africano na época que vivemos. Do mundo de problemas a enfrentar, quanto a mim, um dos mais imperiosos é este do aportuguesamento simultâneo com a promoção.
Não podemos, para tanto, contar apenas com a acção das escolas ou dos serviços oficiais. Como elemento indispensável a considerar esta o contacto permanente dos que vão subindo a íngreme ladeira do progresso material e mental com os que têm de há muito a vivência portuguesa dos degraus mais elevados. Sem o contacto, sem o exemplo, sem a criação de uma comunidade natural de idioma e de ideias básicas, não o poderemos fazer.
Não bastará criar usos novos ou ensinar as palavras das cartilhas. Ê preciso insuflar nos costumes e nos espíritos um conteúdo cultural e sociológico português que, respeitando embora as ideossincrasias originais de cada grupo, se não perca com o decurso de poucos meses ou mesmo anos e se transmita às novas gerações. E isto não se obterá sem um esforço à escala nacional, de todo o País, para conseguir o povoamento que coloque em presença os