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24 DE JUNHO DE 1971 2189

O Orador: - Entendem que, como em qualquer Estado de direito, no nosso deve assegurar-se a luta contra o desregramento, a intranquilidade e qualquer forma de desordem ou agitação subversiva através de uma legislação penal adequada, aplicada pelos tribunais, salvas as excepções graves determinantes dos estados de emergência.
Com esta matéria central do projecto liga-se a das alterações referentes aos tribunais, que todos se querem ordinários, ou sejam aqueles em que os juizes gozam das garantias que habilitam o Poder Judicial a ser garante da justiça: a inamovibilidade, a exclusividade de funções e o carácter vitalício.
Todo um sistema de promoções extraordinárias e de nomeações em comissão de serviço ou a prazo fixo foi ignorando e atenuando a garantia da inamovibilidade, simultaneamente diluindo a consciência pública de que só os tribunais ordinários asseguram a independência do judicial frente ao executivo, sem a qual o cidadão fica à mercê deste.
Além disso, sendo, como é e o Governo assim o assinala, a existência de uma competência reservada da Assembleia Nacional uma defesa para os particulares, a inconstitucionalidade orgânica resultante da sua ofensa tem de sair do campo político para o campo jurídico, passando portanto para a competência dos tribunais comuns ou do tribunal de inconstitucionalidade previsto pelo Governo.
Sem isso, aquela reserva, e os particulares que visa a defender, ficarão privados de garantia jurídica.
As alterações referentes à forma de eleição do Presidente da República e ao funcionamento e competência da Assembleia Nacional prendem-se também, em parte, com os direitos individuais, como resulta do que aqui já disse.
A eleição do órgão de soberania que em si concentra os poderes de Estado há-de pertencer aos cidadãos, sem o que não haverá liberdade política e se não respeitará o regime democrático proclamado na Constituição e na Declaração Universal dos Direitos do Homem: por isso aquela assegurava e esta impõe a eleição por sufrágio universal.
Dado o sistema de eleição adoptado em 1959, no qual, além do mais, o número de eleitores de nomeação do Governo e o dos que o não são ficou em grande parte dependente do próprio executivo, pode considerar-se que o nosso sistema passou de democrático a autocrático. Nas suas potencialidades, senão já na sua realização imediata, o modo de eleição retira aos cidadãos o poder de designação do real detentor dos poderes.
E assim é que, já em 1959, o nosso sistema foi aqui qualificado como uma «monocracia», embora bicéfala e moderada. Melhor se diria agora «oligocracia».
Esta situação é suficiente, quanto a mim, para vencer quaisquer questões de tempo, de oportunidade e de conveniência, e, bem assim, para tornar ocioso que se aguarde a lição da experiência.
Se o modo de eleição do Chefe de Estado põe em jogo a liberdade política essencial e os fundamentos do regime, há que encará-lo desde já e que optar imediatamente por um regime autocrático ou democrático.
É certo que somos muito propensos a personalizar as questões, o que inibe que elas sejam postas com a independência e a objectividade necessárias.
No caso presente isso não é possível, já que, além do mais, tendo o actual Presidente da República sido eleito tanto por sufrágio directo como pelo actual modo de eleição, a sua autoridade, a sua representatividade, a sua figura estão necessariamente imunes à discussão da forma de eleição, à qual, de resto, sempre seriam incontestavelmente superiores.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Pelo que respeita à Assembleia Nacional e ao seu funcionamento, procurou-se assegurar a possibilidade de exercício de uma fiscalização real dos actos de Poder, com defesa dos direitos dos cidadãos face ao potentíssimo Executivo, e assegurar ao órgão colegial de representação política a regulamentação de todas as matérias referentes aos direitos e liberdades fundamentais ou com elas relacionados, em tudo quanto não hajam de estar previstos na Constituição.
Só na discussão na especialidade poderá completar-se esta análise, que não ficaria, no entanto, provisoriamente concluída sem anotar que grande número das alterações constantes da «proposta do Governo, designadamente quanto a direitos individuais e competência da Assembleia Nacional, haviam sido propostas em 1959 por Deputados e aqui inexoravelmente rejeitadas, não obstante o empenho e o brilho com que foram defendidas.
Besta, por último, uma referência ao parecer da Câmara Corporativa.
Há que louvar-lhe a ousadia, reconhecer-lhe o desassombro, enaltecer-lhe a capacidade de reconsiderar opiniões anteriores, apontar-lhe o sentido político a dominar o conteúdo técnico.
Quem esperaria ver aí citada a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, ou um autor e uma obra como a de Duverger?
Quem suporia ver aí qualificado de inconstitucional o actual regime de prorrogabilidade indefinida das medidas de segurança ou assinalada a circunstância, pletórica de consequências, de que os actos de instrução do Ministério Público e da Polícia Judiciária são actos materialmente jurisdicionais, não tratando embora do problema de saber se ante o artigo 116.º da Constituição eles não cabem exclusivamente aos tribunais?
Quem imaginaria encontrar no parecer o reconhecimento dos direitos à greve e ao lock-out como meio de realização da justiça comutativa nas relações de emprego e a afirmação de que, entre nós, a denegação de tais direitos é imposta ou explicada pelas circunstância excepcionais de uma economia em fase de desenvolvimento?
Os pontos apontados demonstram suficientemente a ousadia e o desassombro que referi.
Por outro lado, a Câmara Corporativa não hesita em aprovar agora as alterações propostas pelo Governo, que, em 1959, propostas então por Deputados, rejeitara sistematicamente.
A competência exclusiva do órgão parlamentar para a criação de impostos, condenada em 1959 como contrária à tradição e aos interesses nacionais, é agora acolhida como despida de inconvenientes e representando até o regresso a uma tradição constitucional.
Em 1959, a Câmara entendia que a Assembleia Nacional, não devia ser o órgão exclusivamente competente para legislar sobre a nacionalidade portuguesa.

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado: V. Ex.ª excedeu o tempo regimental de vinte minutos, uma vez que é a segunda vez que fala desta matéria. Posso conceder uma prorrogação, mas desejaria que não excedesse o tempo de meia hora, para nos mantermos no quadro do respeito devido ao Regimento.