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2186 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 108

que a minha própria concepção acerca do crucial problema da fixação dos limites das liberdades individuais da natureza política me levasse a desprezar as realidades para enveredar cegamente pelo campo ideológico, seria necessariamente um gesto contrário aos desejos manifestados pelo eleitorado que me elegeu representante nesta Câmara, e que, em grito tão altissonante, se declarou favorável à política de Marcelo Caetano, manifestando, simultâneamente, o seu veemente repúdio pelos perigosos conceitos que o alarmaram e cuja aplicação inexoravelmente nos conduziria a todos, repito, a todos, ao caos. A nossa sobrevivência no ultramar pode estar em jogo, e com ela a estabilidade económica e o progresso social de toda a Nação. Deixarmo-nos seduzir por certas doutrinas, mesmo teoricamente certas, seria perigosíssimo para todos os portugueses no momento presente. Considero acertada e indispensável a prudência com que se caminha no sentido de se alargarem as liberdades- no âmbito da política. Argumentar-se-á que uma constituição tem de ter em vista o futuro, que não pode ser feita, ou simplesmente revista, apenas em função de determinada situação presente ou de determinado Governo ocasionalmente no poder no acto da sua feitura, mas antes tem de justamente prever as mutações que possam surgir e, logicamente, vão surgindo. Mas não se alega também, justamente em defesa da revisão constitucional, a necessidade de a adaptar aos condicionalismos do momento presente? Pois digamos que é justamente em atenção a tais condicionalismos que o meu voto vai, exceptuando evidentemente num ou noutro ponto de menos vital importância, para a proposta do Governo. Mágoa, profunda mágoa, sinto eu por enfrentarmos no ultramar a situação de desassossego, que deve levar os portugueses de cá e lá a considerar perigoso o momento para profundas aberturas no aspecto da liberdade política. Estas poderiam agora redundar numa crescente actividade contra a nossa política ultramarina, actividade, aliás, que já se não circunscreve à simples propagação de ideias, mas vai até à prática de condenáveis actos de terroristas que só diminuem a nossa capacidade de resistência.
Bem gostaríamos que tal situação não existisse. De resto, estou em crer que, na base da própria proposta do Governo, está justamente a situação peculiar do momento presente. Pois que poderia ter levado o Prof. Marcelo Caetano a alterar a sua maneira de pensar relativamente à forma de eleição do Chefe do Estado?
E afirmo que considero o povo português plenamente representado no sistema orgânico actual, pelo facto de votar pela manutenção de tal sistema? Evidentemente que não considero, sobretudo tendo em vista a forte representatividade no colégio eleitoral de elementos de nomeação governamental, o que, necessariamente, lhe tira o carácter universal que devia ter.
Mas eu sou do ultramar e como tal vivo os seus problemas tão de perto e tão intensamente que a sua defesa tem de constituir o primeiro objectivo da minha actuação nesta Câmara. Que a consciência desses mesmos problemas, e da sua incidência no conjunto nacional, me não permite que contribua para o alargamento dos já grandes perigos existentes. Tal seria servir mal Moçambique, seria servir mal o País.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: Com a maior brevidade e clareza que me foi possível, expus a minha maneira de pensar e justifiquei a minha actuação. Estou perfeitamente consciente de ter seguido o caminho menos cómodo, e não me foi fácil concluir por esta conduta, mas a consciência de seguir o caminho recto, alheio a comodidades fáceis é por si só suficiente recompensa. De resto,
sinto-me perfeitamente acompanhado, já que com prazer verifiquei estarem muitos de VV. Ex.ªs possuídos de ideias coincidentes com as minhas.
Sr. Presidente e Srs. Deputados: A análise à proposta e projectos não se circunscreve, evidentemente, aos pontos que foquei. Sinto no entanto que, quanto aos restantes, e apesar do indiscutível grande interesse de alguns, nos quais incluo o projecto n.º 7/X, limitar-me-ei, aquando da discussão da especialidade, a lar o meu modesto contributo, evitando agora roubar o precioso tempo da Câmara. Dou, portanto, o meu voto favorável aos três documentos, repetindo que os considero todos meritórios. Deram eles lugar a uma discussão útil justamente no lugar próprio, emprestando vitalidade a esta Câmara. Qualquer deles tem, aliás, variadíssimos pontos que merecem a minha aprovação.

Vozes: - Muito bem!

O orador foi muito cumprimentado.

O Sr. Sá Carneiro: - Sr. Presidente: O poder que fomos chamados a exercer é um poder constituinte, quase independente do executivo, e próximo do verdadeiramente soberano, no qual radica.
Incumbe-mos preservá-lo e mante-lo liberto da expansão do executivo que a nova sociedade em toda a parte justifica, mias que nem por isso é em si menos avassaladora.
Pertence-nos exercê-lo como quase soberano que é, liberto das conveniências sempre invocadas para limitar a acção de outrem; prestando atenção as opiniões dos outros órgãos de soberania e da Câmara Corporativa, sua auxiliar, mas assumindo a responsabilidade de pensar e tomar decisões que tem de ser só nossas; guiando-nos apenas pelas conveniências presentes e futuras de todos as portugueses, e não apenas dos que nos elegeram; sabendo libertar-nos de todas os pruridos e preconceitos pessoais, já que não estamos a legislar parca individualidades, por mais respeitáveis que sejam, nem para situações, por mais atendíveis que possam ser, imas som para os cidadãos de agora e do futuro, cujo bem nos pertence assegurar através das normas constitucionais.
Exposto o conteúdo do poder exercendo, analisado o contexto em que se insere, já os articulados em discussão estão em boa parte justificados na generalidade das suas normas.
Isso não dispensa, no entanto, a sua analise específica, feita a partir daquele que, como seu signatário, me cabe especialmente justificar na orientação do artigo 37.º do Regimento: conveniência e oportunidade das novas disposições, plano geral do projecto.
Nos seus temas gerais há coincidência entre a proposta e o projecto n.º 6/X quanto à maior parte dos assuntos; assim pelo que se refere aos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, ao alargamento da competência da Assembleia Nacional, às garantias da constitucionalidade das leis.
Como se lê no início do n.º 4 do relatório da proposta, domínio onde ela sugere importantes inovações é o dos direitos individuais.
Nessas inovações importantes vai o projecto mais longe o mais largo, numa linha de correspondência com as necessidades que nesse campo se fazem instantemente sentir.
Já veremos a diferença de grau entre os articulados propostos: de momento salienta-se apenas a coincidência de campos em que a urgente necessidade pública da revisão se faz sentir.