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2536 DIÁRIO DAS SESSÕES N.º 126

tutela jurídica das liberdades fundamentais da pessoa, que é indispensável que os limites sejam os que decorrem das leis penais, aplicadas pelos tribunais comuns; mas a opção está perfeitamente clarificada e a escolha de uma ou de outra das redacções terá as implicações decorrentes das duas posições assumidas no que respeita ao exercício da liberdade religiosa.
A outra consideração é que os limites agora tratados na proposta não coincidem com aqueles que a Constituição impõe, visto que no § único do artigo 46.º da Constituição se exceptuam da liberdade de culto «os actos de culto incompatíveis com a integridade física da pessoa humana e com os bons costumes, assim como a difusão de doutrinas contrárias à ordem social estabelecida». Ora, a ordem social estabelecida assenta no reconhecimento das liberdades da pessoa humana, na aceitação da iniciativa e da propriedade privadas; é coisa muito diversa daquela que agora se propõe como limites ao exercício da liberdade religiosa.
Tenho dito.

O Sr. Oliveira Dias: - Sr. Presidente: A declaração sobre a liberdade religiosa do Concílio Vaticano II assinala essencialmente como limites à liberdade religiosa: a ordem pública e a ordem moral objectiva.
No mesmo sentido se orienta a proposta do Governo, parecendo redundante «a referência final» aos princípios fundamentais da ordem constitucional e aos interesses da soberania portuguesa.
Não estão a observância destes princípios e a salvaguarda destes interesses garantidas pela própria Constituição?
Ou acaso se pretende ir mais longe, conferindo ao Estado poderes de conteúdo não exactamente delimitado que podem pôr em causa o próprio princípio da liberdade religiosa?
Julgo, assim, em qualquer caso, preferível a redacção proposta pelo Sr. Deputado Sá Carneiro e outros Srs. Deputados, que eliminam aquela referência final.
Aliás, o artigo 45.º da Constituição, na actual redacção, não prevê outros limites à liberdade religiosa além dos princípios fundamentais da ordem constitucional, a ordem social, os bons costumes, a vida, a integridade física e a dignidade das pessoas.

O Sr. Veiga de Macedo: - No projecto da proposta de lei (base III) previam-se,- como limites da liberdade religiosa, a vida e a integridade da pessoa humana, os bons costumes, os direitos e os interesses da soberania portuguesa e os princípios fundamentais da ordem constitucional.
A Câmara Corporativa sugeriu algumas alterações acolhidas na proposta de lei. Quem ler o parecer da Câmara ficará esclarecido sobre o alcance das modificações preconizadas, lucidamente justificadas, o que, aliás, se regista nas outras observações nele feitas, com uma clareza e profundidade impressionantes.
Não ouso, pois, acrescentar quaisquer comentários mais ao assunto, mas devo pronunciar-me sobre o problema suscitado pela inclusão do limite relativo à soberania portuguesa.
Reconheço que, numa interpretação ampla, a expressão os interesses da soberania portuguesa» se pode julgar compreendida na que se refere aos «princípios fundamentais da ordem constitucional».
Isso é certo, mas não menos certo é que razões bem fundas e actuais aconselham a que se use de todas as cautelas. Não valerá a pena invocar factos nos últimos anos registados que evidenciam claramente as ofensa» que, à sombra da acção religiosa, se tem praticado contra, a soberania nacional.
Além disso, há confissões religiosas que, entre os seus princípios essenciais, inserem normas de isentado obrigatório que contendem abertamente com direitos fundamentais da vida dos Estados e das nações, pelo que nenhum ordenamento jurídico lógico e coerente as poderá considerar válidas.

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Admiti-las, com ser contrário a princípios irrefragáveis da ordem social estabelecida, poderia ainda concitar muitos a tornarem-se adeptos dessas confissões, não movidos por espírito religioso, mas tão-sòmente pelo propósito de se esquivarem ao cumprimento de deveres essenciais para com a comunidade.
Ainda há pouco, pude ler na revista Itinerarium, de Janeiro-Março deste ano, afirmações do padre António Montes Moreira, em que este problema é proficientemente analisado. Aí, ao aludir-se «à dificuldade em conciliar o preceito da fraternidade universal com o dever nacional e político», afirma-se que «a objecção de consciência radica, por vezes, em pressupostos humanos e pacifistas pouco esclarecidos que minimizam exigências concretas de caridade e justiça para com o próximo imediato» e que «a recusa da solidariedade na força pode levar à solidariedade na injustiça». Mais se diz aí que «a rejeição do serviço militar ... não está isenta de certa concepção desencarnada da vida cristã ...» e que ca salvaguarda da transcendência do cristianismo não pode servir de pretexto para se fugir a sua encarnação nas realidades terrestres, inclusive nas de carácter social e político».

Vozes: - Muito bem!

O Orador: - Considerações idênticas a estas foram por mim feitas nas reuniões da comissão eventual. A elas adito agora, e no mesmo pendor, mais algumas palavras quê me foram suscitadas pela proposta de alteração ao n.º 1 da base VIII apresentada pelos ilustres Deputados Sá Carneiro, Correia da Silva e Finto Balsemão. Nessa proposta eliminam-se as expressões «princípios fundamentais da ordem constitucional ou os interesses da soberania portuguesa», que são substituídas por esta outra: «... as normas legais vigentes».
Devo confessar que estes últimos termos são, em parte, mais compreensivos ou mais amplos, abarcando, por isso, em si, limitações ao princípio da liberdade religiosa mais latas que as previstas da proposta de lei. Na verdade, para se ver que assim é, basta atentar em que dos termos do texto governamental, poderá extrair-se a conclusão, ao menos com força literal, de que será lícito a quem quer que seja invocar a liberdade religiosa para a prática de actos que contrariem as normas legais desde que esses actos não se mostrem incompatíveis «com a vida, a integridade física ou a dignidade das pessoas, os bons costumes, os princípios fundamentais da ordem constitucional ou os interesses da soberania portuguesa».
Por isso, redacção mais perfeita e completa seria a de se inserir no texto, mas sem excluir as outras já nela contidas, a expressão nova da proposta de alteração daqueles Srs. Deputados.
Pela minha parte, nada teria a opor a uma modificação assim concebida. Mas, e especialmente no «ritual momento histórico, não vejo se tome conveniente retirar da norma em discussão os expressões referentes à ordem constitucionais e à soberania portuguesa.

Vozes: - Muito bem!