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19 DE NOVEMBRO DE 1971 2795

O Sr. Presidente: — O Sr. Deputado Ávila de Azevedo tinha-me anunciado o desejo de produzir mais considerações, além de apresentar esse requerimento.

Tem a bondade de mandar o requerimento para a Mesa e continua no uso da palavra.

O Sr. Ávila de Azevedo: — Sr. Presidente: Ao regressar de Moçambique, numa verdadeira viagem de informação e de estudo, sou naturalmente levado a revelar as minhas impressões, os meus julgamentos, porventura as minhas críticas. Paio em meu nome pessoal; mas no grupo de Deputados, embora diferenciado pelas suas opiniões e pelas suas tendências, que percorreu os mesmas caminhos pode haver juízos idênticos. Os meus colegas terão decerto ensejo de exprimi-los melhor do que eu. Seguimos todos o programa estabelecido pelo Governo-Geral da província. Não fizemos uma. viagem de recreio — cumprimos uma missão.

Esta missão encontra-se perfeitamente, integraria nas funções e nas responsabilidades que cabem aos representantes da Nação: não se pode ter a percepção do desenvolvimento e das aspirações de cada uma das suas partes sem conhecê-las de visu. Não se descobriu ainda nenhum processo de comunicação humana mais real do que a observação pessoal. Não basta ver pela imagem ou ouvir passivamente. Torna-se indispensável intervir num meio social diferente com os nossos cinco sentidos. Só desta maneira se podem formar conscientemente juízos de valor.

Cumpre-me, em primeiro lugar, manifestar os meus agradecimentos a todos os que intervieram ou facilitaram a nossa viagem. Agradecimentos dirigidos ao Sr. Ministro do Ultramar, Prof. Silva Cunha, que a promoveu. Conheço-o há muitos anos, sempre devotado aos negócios ultramarinos: como' estudante, como investigador, como jurista, como mestre, como administrador e, finalmente, com estadista. E, ao mesmo tempo, um homem de Estado e um esclarecido africanologista. Agradecimentos igualmente ao Sr. Governador-Geral de Moçambique, aos dedicados governadores dos distritos e outras autoridades, aos nossos colegas desta Assembleia que coadjuvaram o Ministério do Ultramar e aos colegas, representantes de Moçambique, que nos deram não só o prazer da sua companhia, mas ainda o contributo dos seus conhecimentos. Não posso ainda esquecer que os encargos da nossa missão recaíram sobre a província. Contraímos assim uma dívida para com ela que só podemos saldar com os serviços que lhe prestarmos.

Para quem conhece longa e pormenorizadamente Angola, como é o meu caso, somos logo sugeridos a estabelecer comparações entre os dois territórios portugueses de África, ambos grandiosos, ambos descobertos e ocupados pelos Portugueses, ambos com um remoto passado histórico. Podia acrescentar, e então anulavam-se as comparações tão repetidas, que são ambos retalhos de um vasto império que Portugal pretendeu construir em África. Moçambique e Angola teriam sido uma Nova Lusitânia se, por um lado, os cinquenta anos de lutas civis em Portugal e, por outro lado, as aspirações imperialistas britânicas não tivessem .destruído o sonho do chamado «mapa cor-de-rosa», em que se empenharam sertanejos, exploradores, estadistas, homens de pensamento e de acção. Poderia ainda salientar que seriam outros os destinos da África. Em vez de países hostis, em que ainda predominam ressentimentos de origem rácica em face da actividade e da ousadia de outros africanos, mas de origem europeia, teríamos, segundo os ideadores do mapa cor-de-rosa, uma África meridional mais compacta, geográfica e politicamente mais bem delineada na índole do processo de convivência racial e no sentido assimilador da cultura portuguesa. Aquele em que somos realmente os mestres de uma experiência secular e ao qual acabarão por aderir os outros povos brancos que, com o seu ingente esforço, a sua capacidade de iniciativa e os seus êxitos técnicos, estão a contribuir para que o continente africano, ao sul do equador, tenha o seu verdadeiro lugar entre as potências evoluídas do Universo.

A viagem do grupo de Deputados da Assembleia Nacional ia Moçambique, graças ao programa organizado pelas entidades locais, cobriu toda a extensão do território português — nove vezes maior, não o esqueçamos, que o do continente europeu. Internámo-nos nas savanas longínquas do interior, já próximas das fronteiras do Oeste, e alongámo-nos por quase toda a linha da costa; atravessámos os rios mais caudalosos e o lago Niassa — um dos maiores lagos africanos; visitámos cidades em turbulento progresso e aldeamentos isolados em regiões quase desérticas; abeirámo-nos das grandes plantações de cana-do-açúcar, de chá, de sisal, de palmares e de cajueiros e também observámos as machambas dos colonos ou dos autóctones; fomos recebidos nos palácios dos governadores, mas igualmente fomos acolhidos em modestas casas de nativos; assombrámo-nos perante gigantescas obras de fomento e assistimos à laboração de muitos empreendimentos de iniciativa particular; deslizámos em estradais de asfalto, mas também calcorreámos picadas e as pistas arenosas que devassaram o sertão africano; participámos no movimento febril dos portos, das complexas encruzilhadas ferroviárias e dos aeródromos; voámos em aviões transcontinentais e conhecemos os sobressaltos e as emoções dos táxis aéreos; convivemos intensamente com pretos, com mestiços, com brancos, com velhos e novos, com católicos, muçulmanos e hindus; instalaram-nos em hotéis, iguais aos melhores hotéis europeus, mas repousámos em velhas residências coloniais ainda do tempo da ocupação. Sentimos o pulsar das primeiras actividades turísticas que irão enriquecer a província e assistimos a manifestações folclóricas bem reveladoras da intuição artística dos povos africanos. Não quero exagerar os meus sentimentos de admiração, nem adiantar comentários que poderão parecer inconsistentes numa digressão tão breve por um país tão extenso e de infinitas possibilidades, mas afigura-se-me que vimos o bastante para fazermos uma ideia de um e antevermos as outras.

Por toda a parte nos apercebemos de uma ânsia de luitia, de um gosto jovem e ardoroso de vencer as dificuldades, de um amor entranhado à terra de Moçambique, e, sobretudo, de uma confiança ilimitada nos seus destinos. Sou optimista: ninguém pode hoje duvidar que o futuro de Moçambique está e estará nas mãos dos Portugueses. Ninguém pode, descrer das esperanças depositadas na convivência racial e na promoção social das comunidades nativas menos evoluídas. Ninguém se arreceia das incertezas e das suspeitas de uma opinião estranha ás realidades do território, fabricada pelos agentes da subversão internacional e por raros, muito raros, moçambicanos que se afastaram do lar português. Moçambique é uma região africana em pleno desenvolvimento.

Criam-se cidades e urbanizam-se povoações que eram ontem aldeolas do mato; inauguram-se novas linhas férreas; apetrecham-se portos; assentam-se pontes; rasgam-se estradas e consolidam-se outras; abrem-se à cultura terrenos incultos; instalam-se novas unidades fabris e aperfeiçoam-se outras; levantam-se edifícios majestosos, quer pela iniciativa do Estado, quer pela iniciativa pri