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2796 DIÁRIO DAS SESSÕES N.° 139

vada; multiplicam-se as escolas de primeiras letras pelos pontos mais recônditos do sertão e escolas secundárias em pequenas -e em grandes povoações; promovem-se investimentos vultosos mesmo com os recurso locais; melhoram-se os serviços e procura-se tornar mais densa a rede administrativa; criam-se, enfim, fontes de energia, de que Cabora Bassa é o mais alto expoente.

Na língua dos autóctones do Zambeze, Cabora Bassa significava «acabaram-se os trabalhos» — isto era, a navegação fluvial, que terminava naquela garganta inultrapassável. Mas, como todos sabem, iniciaram-se ali, naquele quadro natural já de si verdadeiramente ciclópico, outros trabalhos de valorização energética em África que dão bem a medida, na era tecnológica em que vivemos, da capacidade realizadora dos Portugueses e da decisão de enfrentarem todos os seus adversários.

Evidentemente, e só temos vantagem em revelá-los para lhes dar remédio pronto -e adequado, há erros cometidos que vêm de longa data; há carências aflitivas não só de recursos materiais para a obra que estamos empreendendo, mas ainda de diligentes, de «quadros», como dizem os Franceses, de técnicos de todas as especialidades, de homens, porque só com eles se constroem os países novos; há ainda atrasos e lacunas de uma administração, que embora séria e por vezes eficiente, não conseguiu até agora a descentralização indispensável, tanto no ponto de vista nacional como no ponto de vista regional.

Um daqueles erros provém da própria evolução administrativa da província no período da ocupação. Moçambique foi, nos fins do século passado e no primeiro quartel deste século, partilhada em retalhos pelas companhias majestáticas, que só procuravam, em grande parte, a satisfação dos seus interesses económicos. Recentemente, com a extinção dos privilégios concedidos à sua última grande companhia — a Companhia de Moçambique —, uniram-se aqueles retalhos. Passou então o território a constituir uma verdadeira unidade administrativa, económica e moral. Ao contrário de Angola, o regime colonial, tal como foi considerado pelas potências europeias com dependências em África, pesou demasiadamente sobre o passado da nossa província da costa oriental. Decerto, por esta razão essencial, «a arrancada» de Moçambique é mais tardia do que a de Angola.

Um segundo aspecto, que tantas vezes testemunhámos nas expansões que ouvimos aos Moçambicanos, é o de o território ainda não dispor das actividade e dos empreendimentos que levem, ao equilíbrio da sua balança comercial. Citando números estatísticos recentes verifica-se, com apreensão, que as importações se situam em valores próximos 7 300 000 contos, enquanto as exportações mal excedem os 4 milhões de contos. Nestas intervêm principalmente os produtos agrícolas característicos da economia dos países tropicais subdesenvolvidos: o algodão em rama, o açúcar, a castanha de caju (de que Moçambique é o primeiro produtor mundial), o chá, as madeiras e a copra. Naquelas, representam índices mais -elevados as máquinas e utensilagem para vários fins, os tecidos de algodão e os vinhos. Mesmo para quem seja leigo nesta matéria, logo reclama solução adequada o estranhe contra-senso de a província comprar no exterior os tecidos fabricados com o próprio algodão que ela cultiva. Todos sabemos, porém, que, com as suas vias de comunicação, Moçambique exporta mais serviços do que matérias-primas . . .

Como aconteceu em Angola, e desde os tempos de Francisco Barreto, uma espécie de Drake português, os primeiros conquistadores e exploradores extasiaram-se com as prodigiosas e, por vezes, mágicas riquezas mineiras do

solo moçambicano. Não eram esperanças vãs, nem miragens de sertanejos consumidos pelas febres, como as realidades do dia presente o estão demonstrando. Ora, em Moçambique ainda não se entrou numa activa fase de exploração mineira. A criação do Plano do Zambeze é uma primeira tentativa de inventariação minuciosa e de extracção rendível do subsolo.

O nosso terceiro ponto de reflexão incide sobre a falta clamorosa de técnicos, sobre que escutámos as mais amargas e justificadas queixas. Num momento em que o território metropolitano, também em vias de desenvolvimento, já não pode dispensar os seus engenheiros, os seus geólogos, os seus médicos e até os seus professores, parece-me — e esta é uma opinião meramente pessoal — que deve competir à Universidade de Moçambique preparar a maior parte dos profissionais aflitivamente necessários nas indústrias e nos serviços. Embora não se ponha eui dúvida a equivalência dos diplomas em todo o território nacional, sempre exigível como no-lo prova a experiência pedagógica do passado, a Universidade deveria possuir uma estrutura e uma organização escolar de acordo com as exigências e as qualificações da economia moçambicana. Sem quebrar a sua filiação académica nas universidades metropolitanas, caber-lhe-ia «personalizar-se» em função da província. É certamente uma problemática que será encarada pela própria Universidade.

O quarto ponto da análise, a que estamos procedendo, diz respeito à Administração. Aqui nesta Casa, e por unas maioria significativa, já demos os passos essenciais para descentralizá-la, em face da revisão da Constituição Política da República Portuguesa. Decerto também nos caberá a adaptação da Lei Orgânica do Ultramar ás novas circunstâncias legislativas. Ainda que mantendo um Ministério próprio de cooperação ultramarina — todas as tentativas de dispersão por outros Ministérios redundariam em fracassos estrondosos —, é indiscutível que os territórios se valorizam na autonomia. Podemos mesmo afirmar, como lição da história, que os progressos espectaculares de Angola e de Moçambique só ,se -conseguiram com -a nomeação de altos-comissários, dotados de larguíssimas atribuições. Mouzinho — o grande Mouzinho — escreve que ao serem cerceadas estas atribuições «mantinham-se de pé todos os erros, todas -as absurdas restrições ao exercício da autoridade do governador, todas as medidas centralizadoras da administração colonial na Secretaria do Ultramar, todas as ridículas tentativas de assimilação». Por sua vez, António Enes acrescenta: «Convenci-me plenamente que a centralização das gerências ultramarinas precisa de ser substituída por um regime em que os governos locais tenham muita liberdade e muita responsabilidade.»

Todavia, a descentralização de poderes terá igualmente de ser observada dentro do próprio território: no governo distrital, na administração concelhia e até ma administração do posto. Se é certo que, em Luanda ou em Lourenço Marques, se levantam queixas pelas demoras arreliantes ou pelas complicações burocráticas emanadas da metrópole, em Sá da Bandeira ou na Beira repetem-se estas lamentações quanto à centralização das capitais da província. Hoje, parece-me incontestável, e como uma premissa para o seu desenvolvimento, que Moçambique necessita de transferir a sua capital para uma povoação pioneira do centro e do interior. Por esse motivo, Lourenço Marques não deixará de ser uma das mais belas e mais prósperas cidades africanas.

Vozes: — Muito bem!