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5 DE ABRIL DE 1972
vernadores em alguns dos seus poderes, de alcance e interesse mais caracterizadamente locais (sobressaindo especialmente a transferência para os governos, ultramarinos da competência ministerial actual em matéria financeira);
2) Reforço do carácter representativo dos órgãos colegiais legislativos das províncias;
3) Alargamento da participação das províncias ultramarinas nas grandes assembleias ou corpos legislativos do Estado;
4) Desburocratização do Conselho Ultramarino pela participação na sua, composição de representantes das províncias;
5) Garantia de representação regional adequada em todos os órgãos consultivos de âmbito nacional;
6) Aumento do grau de descentralização local, no âmbito de cada província.
E a Câmara, dando apoio a uma tal orientação «adequada à evolução das províncias», concordou, no citado parecer, em que era de fazer evoluir o princípio da descentralização, quer provincial, quer local, e o da integração (explicitado pela Lei Constitucional n.° 2100, de 29 de Agosto de 1959), até adquirirem toda a execução de que são susceptíveis, sem contrariarem, respectivamente, a unidade política da Nação e os interesses específicos e particulares de cada um dos territórios de além-mar, e mostrou a sua disposição de bem colaborar na harmonização daqueles dois princípios, que são duas constantes da história da administração ultramarina portuguesa, não obstante em cada época se terem verificado desvios ou más interpretações.
13. Viu-se que ao sistema da monarquia tradicional, ditado pelas próprias necessidades e formulado naturalmente dentro das concepções em que assentava a soberania real e a administração pública e que tinha em conta as respectivas condições geográficas e sociais, sucede uma visão teórica, de base ideológica, e desligada das realidades, certamente, em grande medida, desconhecidas dos que legislavam.
E precisamente o desconhecimento e o consequente desprendimento da realidade que leva, abstraindo dela, a assimilar e a uniformizar teoricamente o que é diferente e mesmo incompatível, sem, aliás, se ter a noção de que se comete terrível violência — a de ir contra a própria natureza das coisas.
E essa visão teórica, embora corrigida pela lição decorrente dos resultados, vai-se mantendo, até que a força da realidade se impõe através da projecção de personalidades como António Enes e Mouzinho.
Mas não basta reconhecer a diversidade de condicionalismos e a consequente necessidade da especialidade das leis e da Administração. Impõe-se igualmente, atendendo ao que é comum, aos elos que ao fim de séculos unem os vários territórios portugueses, fazendo deles uma Nação, defender a unidade nacional.
E preciso encontrar o sistema que, harmonizando os dois princípios, tenha em conta os imperativos da descentralização e da integração.
Esse o objectivo que tem informado a legislação ultramarina deste último meio século.
Trata-se de uma política que se caracteriza precisamente pelo seu carácter dinâmico, já que, segundo os princípios consagrados constitucionalmente, o sistema administrativo deve evoluir em conformidade com o progresso e o estado de adiantamento das populações.
Em harmonia com tal política, foi promulgada a última revisão constitucional, pelo que indispensável é a revisão das normas que definem o regime geral de governo das províncias ultramarinas, de forma a ajustá-las ao texto da Constituição Política. Com esse propósito apresentou o Governo a proposta de lei em apreço.
Como se referiu de início, a revisão do texto fundamental da Nação, incidiu sobre as três grandes linhas de orientação em que tem assentado a política ultramarina — unidade nacional, unificação do direito constitucional e autonomia —, actualizando o respectivo sistema político--administrativo, de forma a pô-lo de acordo com as novas realidades e consequentes exigências políticas e sociais.
A presente revisão da Lei Orgânica do Ultramar ocupa-se precisamente, por forma dominante, destes pontos, reproduzindo alguns dos pertinentes textos da Constituição, de modo a procurar dar realidade ao pensamento definido neste diploma.
14. Mas nenhuma unidade resistirá se não houver um espírito que, realisticamente, respeitando embora o que é diferente, uniformize o que é possível unificar, e uma economia de sentido integrador que tenda a ser a expressão da comunhão solidária de interesses.
Por outro lado, nenhuma autonomia merecerá verdadeiramente tal nome se toda a população não participar da respectiva administração provincial e local.
A Câmara, ao proceder ao exame na especialidade da proposta de lei, terá isto mesmo bem presente e terá de procurar, apesar da inevitável frieza de que naturalmente se revestem os textos legais, que da proposta de lei resulte a força de tais princípios e a fé e a determinação que eles exigem para ser plenamente vividos.
Os países hão-de ser, antes de tudo, vida e realidade.
O Governo e a Administração, no que deve ser unificado (é o caso dos serviços nacionais), não podem estar separados — há que dizê-lo destacadamente.
Uma economia integrada é fundamento indispensável de união e solidariedade — há que realizá-la e a lei tem de o afirmar vigorosamente.
Os órgãos da administração provincial e local têm de reflectir autenticidade — há que encontrar a fórmula adequada aos condicionalismos específicos.
Não podemos contentar-nos com esquemas geométricos e, menos ainda, com a ideia de que os povos não estarão preparados para instituições de predeterminado figurino, e que se tem de continuar a aguardar.
Não são os povos que têm de aguardar, mas as instituições que têm de ser adaptadas, de forma que todos possam participar, na medida do possível e com o mínimo de limitações indispensáveis, na gestão dos negócios públicos.
E dessa crescente participação resultará a experiência que dará preparação e, até, estímulo para melhor adaptação e mais rápida evolução.
Quanto se diz não é novidade, nem nas leis, nem nos pareceres desta Câmara, nem, o que é essencial, nos factos.
A evolução das instituições e da participação das populações na gestão dos negócios públicos não tem cessado.
A capacidade de realização da Nação bem se patenteia através do progresso e desenvolvimento económico e social das províncias ultramarinas, levado a cabo não obstante o tremendo esforço a que obriga a defesa nacional.
E nunca o espírito de unidade nacional terá sido mais fortemente vivido desde Goa cativa até à Guiné em plena guerra, passando por Angola e Moçambique, cuja luta é cadinho onde se forja o futuro.