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14 DE FEVEREIRO DE 1973 4565

buído através de uma prática que nesta Casa se converteu em tradição; por um direito, enfim, que lhe é reconhecido pelo próprio Regimento já votado por esta Assembleia. E por que é isto assim? Por tão simples, é ociosa a resposta: V. Exa. é um Deputado brasileiro. Acontece que, além dessa qualidade eminente, tem atrás de si uma longa carreira política, rica de experiência, rica de actividade, rica de dedicação à coisa pública, e tanto no âmbito estadual, no grande Estado de S. Paulo, como no plano federal. Vulto que marca nas esferas superiores da política e da sociedade do seu país, tem V. Exa. servido o povo como seu mandatário e defendido os interesses colectivos, e por escolha dos seus pares preside à mais alta assembleia legislativa do seu país, de que é portanto também o primeiro mandatário, e cuja representação, neste momento e perante nós todos, V. Exa. personifica e encarna.
Equivale isto a afirmar que V. Exa. é um qualificado representante do povo do Brasil.
Daquele povo de além-Atlântico em que nós, situados a norte e a sul deste lado do velho mar oceano, encontramos uma comunhão vibrante e profunda no que há de essencial: o apego a uma tradição cristã, assente na mesma raiz; o sangue que jorrou das mesmas veias; a cultura que se inspira dos mesmos valores; uma atitude moral que venera os mesmos ideais; e uma língua de idêntica matriz, que a todos emociona em Camões ou em Manuel Boadeira, que a todos cativa em Eça de Queirós ou em Machado de Assis, que a todos empolga em Camilo ou em Euclides da Cunha, e que a todos arrebata em Vieira ou em Rui Barbosa.

O Sr. Veiga de Macedo: - Muito bem!

O Orador: - Isto é muito belo, e alto, e imenso, e único. Tudo isto, Sr. Presidente Pereira Lopes, seria mais que bastante, mas não é tudo, e no mundo de hoje acaso poderá ser precário se por detrás de tudo não houver uma vontade firme ao serviço de interesses a longo prazo. Para além do que pertence ao âmbito do espírito, e alimenta as inteligências e ilumina a fé, está a realidade poderosa do presente, concreta e positiva, e está sobretudo a visão exaltada do futuro, que só não é profética porque a sabemos antecipadamente exacta. A grandeza e o vigor da continentalidade brasileira e a vastidão do Portugal de aquém e de além-mar são pilares fiadores de que, dentro da construção político-jurídica própria e discricionário de cada um...

Vozes: - Muito bem!
O Orador: -... serão salvaguardados os interesses legislativos dos dois, garantida a ascensão de ambos, assegurado o acesso de um e de outro aos benefícios da cultura, da ciência, do progresso em suma.
Na afinidade dos valores e dos princípios - o culto do direito, o sentido da justiça social, o respeito pela dignidade de cada homem sem olhar à raça, a igualdade de todos perante a lei - encontram o Brasil e Portugal os fundamentos de compreensão mútua; e, Pois que estamos aqui numa assembleia política, cumprirá não esquecer, por outro lado, os instrumentos Políticos e legais que fornecem aos dois países o quadro do entendimento e da colaboração: o Tratado de
Amizade e Consulta, os Acordos de 1967, a Convenção sobre Igualdade de Direitos e Deveres de Brasileiros e Portugueses. E tudo isto, Sr. Deputado Pereira Lopes, é a comunidade luso-brasileira; são aqueles mundos de Portugal e do Brasil que alguns não percebem e que a outros parecem afrontar; são aqueles dois mundos que conseguem transformar sonhos em realidades e em que os homens sabem desencadear aventuras colectivas; são dois mundos que, assentes no passado olham para o futuro e constróem Cabora Bassa e a Transamazónia. Mas se posso falar dos valores que partilhamos, não me caberia falar do que seja próprio à Nação Portuguesa. Já assim não sucede, todavia, no que pertence ao Brasil, porque nesse particular não tenho inibições em dar o meu testemunho.
São já muitas as visitas que em quinze anos fiz ao país de V. Exa., e a derradeira há pouco mais de um mês. E sinto sempre uma comoção renovada, empolga-me sempre uma admiração crescente, dominam-me sempre o fascínio da Guanabara e do Rio, a grandeza de S. Paulo, a vitalidade de Brasília, e por todo o lado, com mística e com fervor, o espírito de bandeira que arrosta com o Planalto, abre o Nordeste e rasga para novas fronteiras económicas, sociais e humanas toda a imensidão que vai de Belém ao Forte do Príncipe da Beira. Não é o Brasil uma grande potência de amanhã: é uma grande potência de hoje: uma realidade que se espraia ante os nossos olhos deslumbrados.
Neste contexto também, e para lá do quadro que procurei esboçar atrás, supomos deste lado do Atlântico que para o Brasil, e até para todo o Ocidente, deverá ter significado uma leal colaboração luso-brasileira: firme, decerto; estável, sem dúvida; alheia a correntes e a interesses que não sejam os de um e de outro, com certeza; e com os seus mundos tão amplos quanto viável, já que perdida para um dos dois países qualquer posição política, económica ou territorial, estaria perdida para ambos, e teríamos ilusão perigosa e amarga se acaso pensássemos que não nos substituiriam outros.

O Sr. Veiga de Macedo: - Muito bem!

O Orador: - No mundo dos nossos dias, afiguram-se em causa todas as coordenadas da vida individual e colectiva. Com dificuldade se entendem as nações, e os próprios homens entre si; e com o desaparecimento das certezas, e na falta de um padrão comum, de valores, surgem mil verdades, tão afirmativas que se excluem mutuamente, tão messiânicas que cada uma procura destruir todas as restantes.
Não será de mais, por isso, que o Brasil e Portugal tentem dar exemplo, harmonioso e construtivo, de concórdia e de colaboração. Ninguém poderá razoavelmente afirmar que as estreitas relações luso-brasileiras, sem par com quaisquer outras, prejudiquem terceiros, ou tenham objectivos hostis a quem quer que seja. Mas se porventura alguns se julgassem afectados ou se sentissem desagradados, então teríamos de buscar o motivo na ilegitimidade dos seus interesses e na improcedência dos seus propósitos. Nem por isso, estou certo, deixaria contudo de prosseguir e crescer a comunidade luso-brasileira.