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12 DE NOVEMBRO DE 1982 343

decadente e não ao proletariado triunfante na Rússia czarista». Como é que V. Ex.» se permite, ao fim e ao cabo, fazer tanta confusão na sua intervenção ligando o aborto ao marxismo!

O Sr. Presidente: - Igualmente para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada lida Figueiredo.

A Sr.ª Ilda Figueiredo (PCP): - Sr. Presidente, prescindo porque numa intervenção que a minha camarada Zita Seabra vai fazer, serão dadas respostas às questões que o Sr. Deputado Barrilaro Ruas levantou.

O Sr. Silva Marques (PSD): - Vai ser difícil, muito difícil!

O Sr. Presidente: - Tem então a palavra o Sr. Deputado Raul Rego.

O Sr. Raul Rego (PS): - Sr. Deputado Barrilaro Ruas, meu amigo, estranhei muito a sua intervenção porque ela è de uma intolerância que eu não estou habituado a ouvir nas suas conversas. Parece que é ditada no facto do Código do Direito Canónico ser o Código de todos os portugueses.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - O nosso Código é o Código Civil.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Nós somos a Assembleia da República, não somos mandatários dos católicos...

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Muito bem!

O Orador: - O Sr. Deputado Barrilaro Ruas é católico, eu não sou e estamos aqui como deputados do povo português.
Pergunto-lhe: acha que o aborto é só um problema católico? Acha que tem de se impor a católicos, ateus, agnósticos, maometanos e judeus - todos portugueses a doutrina católica sobre o aborto? Não acha que o caso do aborto ê tal qual como o caso do divórcio? Será a intolerância católica que deve reger a legislação civil portuguesa?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Acha que no projecto de lei há alguma coisa que obriga os católicos a servirem-se dessa lei?

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - Era só isto que eu queria perguntar a V. Ex.ª

Aplausos do PS e do Sr. Deputado Amadeu dos Santos, do PSD.

O Sr. Presidente: - Tem a palavra, para responder aos pedidos de esclarecimento, o Sr. Deputado Barrilaro Ruas.

O Sr. Barrilaro Ruas (PPM): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Deputados César de Oliveira e Raul Rego: Ouvi com a maior atenção e com eco da amizade que me tributam, que, aliás, retribuo-o, as considerações que tiveram a bondade de me dirigir.
Em relação ao Sr. Deputado César de Oliveira queria dizer o seguinte: a rapidez com que li a minha intervenção, foi lida numa altura em que não estava a pensar produzi-la, provocou, provavelmente, com que o Sr. Deputado não tivesse ouvido melhor as referências que fiz à mulher e entendido melhor o contexto e sentido que dei às expressões «desgraça» - «medo» não empreguei - que tinham que ver com situações, de facto, degradantes, de miséria física e moral, que constituem para esta Assembleia uma das razões de fundo do próprio projecto de lei n.º 309/11, apresentado pelo Partido Comunista Português.
Se há alguma razão para o Partido Comunista Português apresentar este projecto de lei ela situa-se, em parte muito considerável, na descrição, de facto acabrunhante - como eu disse -, de uma situação de miséria moral e física, de dor e sofrimento, que não é apenas das vítimas indesejáveis mas que têm de se repercutir sobre a sociedade inteira dada a solidariedade a que todos nos devemos manter estritamente ligados.
A mulher não é um ser à parte na sociedade e a «mulher-mãe» que entende desistir da dignidade de mãe não é, de modo nenhum, um ser à parte. Quando falei de desgraça disse-o muito claramente pensando naquelas jovens mulheres, ou de um pouco maior idade, que se apresentam defendendo o aborto dizendo «também nós abortámos»... essas não se apresentam perante a sociedade com um título de glória mas com um título à nossa compaixão e a essa compaixão devemos a nossa presença moral.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado, dá-me licença que o interrompa?

O Orador: - Faça favor.

O Sr. César de Oliveira (UEDS): - Sr. Deputado, porque é que há-de ser compaixão e não havemos de ter a consideração que essas mulheres nos merecem por terem tido a coragem de ser verdadeiras, de assumir os actos que praticam sem dar lugar a qualquer hipocrisia.

Aplausos da UEDS e de alguns deputados do PS.

Seja como for, continuo a pensar que o aspecto mais importante da nossa relação para com essas mulheres é o aspecto da compaixão. Compaixão no sentido verdadeiro da palavra, ou seja, «sofrer em conjunto». É esse sofrimento em conjunto que deve levar uma Assembleia como esta a considerar muito seriamente os argumentos apresentados pelo Partido Comunista Português ao apresentar este projecto de lei e muito em especial, em paralelo com ele e no mesmo contexto, os projectos de lei do planeamento familiar e da protecção à maternidade.

Vozes do PPM: - Muito bem!

O Orador: - Por isso procurei dizer, não sei se fui bastante claro, que, para o Partido Comunista Português, uma lógica mais perfeita deveria ter levado a esperar resultados práticos e efectivos dos seus projectos de lei 307/11 e 308/II até ver se seria realmente necessária a desumanização da sociedade portuguesa através de uma lei de legalização do aborto.