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1 SÉRIE - NÚMERO 80

Deu ainda entrada na Mesa um voto de saudação à visita do Presidente dos Estados Unidos da América a Portugal, apresentado pelos Srs. Deputados Lucas Pires e outros do CDS.

O Sr. Presidente: - Srs. Deputados, falta ainda anunciar o voto de protesto, segundo pensamos, que vou mandar buscar ao meu gabinete e cujo anúncio será feito oportunamente.
Srs. Deputados, para não atrasarmos os nossos trabalhos, vamos prosseguir a sessão com uma intervenção do Sr. Deputado João Gomes.
Entretanto, e porque necessito de satisfazer outros compromissos, peço ao Sr. Vice-Presidente José Vitoriano o favor de me substituir.

Neste momento, assumiu a presidência o Sr. Vice-Presidente José Vitoriano.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Gomes.

O Sr. João Gomes (PS): - Sr. Presidente e Srs. Deputados: Concluí no passado dia 1 um visita de 10 dias à República Popular de Moçambique, a convite de S. Ex.ª o Presidente Samora Machel, para quem fui portador de uma mensagem escrita do Sr. Primeiro-Ministro, Dr. Mário Soares.
A minha viagem efectuou-se na qualidade de provedor da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, embora, naturalmente, durante a mesma, nunca me tenha abstraído da minha posição de deputado, de membro que me honro de ser deste prestigiado órgão de soberania.
Acompanhou-me o director do Departamento de Apostas Mútuas, Dr. Ricardo Jorge Correia da Fonseca, facto compreensível dadas as excelentes relações que, através dele, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa tem ininterruptamente mantido com Moçambique. A actividade do Totobola por nós ali mantida antes de Junho de 1975 não só nunca parou como, assumida pelas autoridades, após a independência, se desenvolveu, contando sempre com a nossa cooperação humana e técnica, num ambiente que me atrevo a classificar de exemplar. Temos, inclusivamente, fornecido algumas máquinas, após os adequados trabalhos de recuperação, cujo valor, no conjunto e a preços actuais, monta a alguns milhares de contos.
Srs. Deputados, decidi subir a esta tribuna para vos falar do que vi e ouvi durante a minha viagem a Moçambique e do que julgo serem as indeclináveis responsabilidades e a mais correcta atitude de Portugal para com o país-irmão da costa africana do Índico.
Os contactos que me foram proporcionados e as visitas que levei a cabo, especialmente nos campos da acção social, da saúde e da educação, deram-me, penso, uma ideia fundamentada dos momentos graves e difíceis que Moçambique atravessa. E, exactamente por isso, da necessidade de intensificarmos as nossas relações a todos os níveis possíveis e de irmos ao encontro das suas dificuldades, contribuindo para a sua superação.
Na verdade, fui recebido por S. Ex.ª o Presidente Samora Machel, com quem pude conversar durante cerca de meia hora relativamente à situação moçambicana e às relações entre os nossos dois países. E fui recebido também pelos Srs. Ministros dos Negócios Estrangeiros, da Informação, da Saúde, da Educação e das Finanças, bem como pelo secretário de Estado da
Cooperação Internacional.
De quanto me foi possível observar, cheguei à conclusão de que Moçambique vive uma hora de grandes dificuldades, de insegurança e de considerável paralisia. A guerrilha logrou disseminar-se por todo o território, onde opera com enorme impunidade e, seguramente, com o apoio de poderosos meios e de suspeitosas conivências. Permite-se chegar quase à porta das cidades e ataca da forma mais brutal, mais chocante e mais bárbara populações indefesas. Não respeita velhos, crianças e mulheres e revela uma indecorosa febre destruidora das infra-estruturas do país.
Para além das vidas ceifadas, com requintes de malvadez, a guerrilha capricha em arrasar pontes e segmentos de vias férreas, em atacar alvos essenciais à actividade quotidiana de Moçambique e ao abastecimento das respectivas populações. O que significa uma estranha concepção e um surpreendente procedimento se se tratasse de forças apostadas em arvorar-se em alternativa ao legítimo poder constituído.
Não admira, perante o panorama que vos descrevi, a situação de sofrimento, de angústia, de instabilidade e de mal-estar em que vive o povo de Moçambique. Não obstante as riquezas que alberga no seu subsolo e as portentosas potencialidades da nação moçambicana, o povo experimenta situações de atroz carência. A fome é uma realidade, especialmente em certas zonas e a partir de determinado período do mês, quando se extingue por completo a porção do regime de racionamento em vigor. E o sofrimento acentua-se na medida da pobreza e do desfavorecimento, especialmente nas cidades, quando não há possibilidade de recorrer a trocas ou a outras formas de acréscimo do quinhão mensal.
Mas - importa salientá-lo - para além do resultado da guerra avultam no tempo de apuros que Moçambique passa, na fome e nas situações de quase nudez, as calamidades naturais de que o país tem sido vítima: secas prolongadas, alternadas por chuvas diluvianas e por ventos arrasadores.
Particularmente grave é, no entanto, o ambiente de medo que se vive fora das cidades. Populações há que se têm internado na floresta, regressando a um estatuto de vida primitiva, com o cortejo de problemas que tal realidade suscita, nomeadamente de ordem psicológica e de ordem mental. E, garantiram-me, existem comunidades que tendo atingido o limite da resistência à fome se deslocam, em coluna, ao centro populacional mais próximo, no intuito de encontrar mantimentos e apoios. Há cidades inteiras que estão a viver de dádivas e da generosidade de países amigos. É o que se tem verificado com os Estados Unidos da América cujo envio de mantimentos tem ajudado, substancialmente, à manutenção de Maputo. Com efeito, os métodos traiçoeiros usados pela guerrilha, os ataques desenfreados e brutais contra populações indefesas, têm obstado a que estas façam as suas machambas, assegurando a tradicional economia de subsistência.
Apesar do que acabo de dizer encontrei em todos os responsáveis políticos de Moçambique uma enorme serenidade e confiança, uma férrea determinação de ultrapassar os actuais obstáculos e de construir um país próspero, forte e unido. Impressionou-me o espírito de abertura ao mundo, o reconhecimento de erros passados, o desejo de os corrigir e de avançar na senda de um Moçambique novo.
Esta, mais uma razão para que se não alimentem dúvidas nem hesitações. Sei que o Governo Português está