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15 DE MAIO DE 1985

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O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Anselmo Aníbal.

O Sr. Anselmo Aníbal (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: É mais comum falar aqui das regiões mais distantes do País do que de Lisboa, por muitas e justas razões que todos conhecemos. Mas permitam-me que, hoje e aqui, reflicta sobre Lisboa, sobre os seus 8500 ha de perímetro administrativo, e que se diga que Lisboa está doente. Há uma variada sintomalogia que a identifica como cidade doente e, aliás, isso foi reconhecido em recente Encontro de Autarcas e Quadros Técnicos realizado em Lisboa. Gostaria de transmitir alguns dados desse Encontro e situar alguns dos problemas e reflexões que então se fizeram.
Lisboa é uma cidade doente pela rede intensa de influências que se geram no seu interior no sentido de se ganhar como nunca se ganhou. Dois ou três exemplos. Um que já foi aqui questionado por nós à Secretaria de Estado dos Transportes sem resposta à altura. O Metropolitano, E. P., comprou por 40 000 contos no Lumiar um terreno que foi avaliado oficialmente em 4620 contos e adquiriu uma parcela de terreno ao Luna Parque por um preço 38 vezes superior ao que esta empresa tinha pago, 1 ano antes, ao Jardim Zoológico. Acrescentem-se os problemas com as zonas dos clubes e das urbanizações atingidos pelo Metropolitano, em prioridades de progressão na malha urbana extremamente discutíveis e verificar-se-á, como no Encontro se disse, que parece que anda um metropolitano à solta na cidade de Lisboa, tal o indefinido e o polémico da sua expansão.
Um segundo caso não pode deixar de se reportar à desmunicipalização desregrada que tem conduzido à alienação de vastas zonas como no Alto do Lumiar (300 ha) e no vale de Cheias (104 ha), a pretexto de que as empresas que ficariam donas desses terrenos, construiriam um conjunto de fogos em que também cabiam as populações da Musgueira e Calvanas do Lumiar e da Curraleira e Embrechados no Coval do Pinto. As condições da desmunicipalização destes terrenos de reserva de expansão da cidade são por tal forma lesadoras do património municipal e os preços de transmissão dos terrenos são de tal forma ridículos, reflectindo uma grosseira troca desigual, que as empresas se apressam em ter os terrenos, se apressam nas exigências de alteração de legislação no sentido de isenções fiscais que valeriam mais de 3 milhões de contos e apressam-se a um negócio potencial que representa para si a posse dos terrenos.
Um terceiro caso, o multiplicar de pequenas e médias alterações de volumetria dos edifícios, de mais um andar de aproveitamento indevido de espaço para parqueamento de viaturas. É a construção «à multa», gíria que só por si diz tudo acerca da sua eficácia, que transtorna cálculos, que bloqueia eixos viários, que densifica e degrada.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Lisboa é uma cidade doente pelas opções que sobre o seu tecido urbano se têm consagrado nos últimos anos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Com vastas zonas consolidadas e com um património edificado importante e valioso, é opinião generalizada, e não só da nossa parte, que o presidente do executivo municipal e a maioria «alargada» que suporta as suas decisões, tem apostado na construção de novos edifícios, na demolição e derrocada de muitos e na reabilitação e recuperação de muito poucos dos existentes.
Daqui decorre, como muitos mesmo das cadeiras do PS e PSD reconhecerão, a irrazoabilidade das opções sobre património feitas na cidade. É a demolição de zonas consolidadas e significativas da cidade. O Monumental abate-se, os próprios Prémios Valmor são abatidos. É o facto de peças de um património secular serem ostensivamente deixadas ao inevitável da degradação que a incúria potencia. É um Teatro Taborda, uma interessantíssima peça arquitectónica e quem o visita tem uma imagem de desolação e de abandono.

O Sr. Jorge Lemos (PCP): - É um escândalo!

O Orador: - As suas paredes, lápidas de letras sumidas, de evocação de concertos e récitas, provam o que lá se viveu e o importante não só da rememoração do vivido como do usufruto actual desse espaço actual na freguesia do Socorro. É a indispensabilidade de recuperar integradamente bairros como os de Alfama, Mouraria e Madragoa.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Desenvolveram-se nesta perspectiva importantes acções, designadamente em Alfama, por parte das freguesias de Santo Estêvão e de São Miguel. Criaram-se, por iniciativa dessas autarquias, importantes movimentos de opinião defensores de um património vivo.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - Todas as iniciativas, designadamente através do Programa para a Recuperação de Zonas Degradadas, exigem uma postura diversa do município, um empenhamento de fundo diverso, substantivamente identificado com os interesses populares. O Ministério do Equipamento Social tem de considerar tais núcleos urbanos, como alguns no Porto e noutras cidades, áreas a preservar, merecendo prioridades dos investimentos de recuperação de imóveis.
Lisboa é uma cidade doente pela incapacidade global de gestão do seu planeamento urbanístico, designadamente pela aceitação, em condições incorrectas, de uma terciarização envolvente e avassaladora, que desertifica o espaço urbano que os conduz à periferização os seus residentes e que, em termos de região sobrecarrega de viagens pendulares os operadores de transporte, polarizando-os para zonas restritas da região urbana. Tal terciarização é radicada entre outros factores, na continuada e persistente falta de ligações intermunicipais e regionais, na falta de apoio decisivo aos grandes operadores de transportes nacionalizados, globalmente mal geridos, no isolamento de Lisboa, enquanto município, em relação àqueles que com ele se avizinham e a ele confluem, em termos de emprego e vida global. A menor integração desta variável de um planeamento integrado, que não seja apenas um exercício de estilo, mas um esforço conjunto e inteligente dos órgãos do poder local, é um elemento decisivo para uma nova política regional que equilibre e simetrize o desenvolvimento.