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20 DE NOVEMBRO DE 1986 435

O Orador: - Começando pelo grave e extenso problema do desemprego no nosso país, verifica-se que no Orçamento há apenas uma medida de combate ao desemprego, que é a constante do artigo 17.º, n.º 4, e medida única, aliás, formulada em termos tão restritos e ambíguos que não chega a ser credível, pois limita-se às regiões «com especial incidência de desemprego», e apenas a estas, deixando ao Governo a definição de tais regiões.
Disse aqui o Governo, por intermédio do Sr. Ministro das Finanças, que o seu combate ao desemprego se efectua através da criação de postos de trabalho e de outras medidas que se reflectem no alargamento do mercado de trabalho. Mas, se assim é, como compreender então o que o Governo consignou no citado artigo 17.º?
Passando à segurança social, conclui-se que a percentagem do défice (correspondente aos regimes não contributivo e parcialmente contributivo e da acção social) coberta pela transferência de valores do Orçamento, que era de 35,1 % em 1986, passa a ser, em 1987, de 31,2%, o que significa uma descida percentual de 4,1 % .
Isto não obstante tratar-se de um sector que se reveste da maior importância para as camadas mais desfavorecidas, como é a segurança social.
Por outro lado, o Orçamento para 1987 agrava não só a carga fiscal, como a injustiça fiscal.
Agrava a carga fiscal, em termos reais, em mais 14,1 %, o que é até superior à subida de preços prevista pelo Governo, entre 8 % a 9 %, visto que as receitas, decorrentes dos impostos, passam de 772 milhões e oitocentos mil contos para 882 milhões de contos.
Agrava a injustiça fiscal porque os impostos indirectos, que são, sob o ponto de vista social, mais injustos, aumentam 16,9 %, enquanto os impostos directos aumentam 9,2 %, portanto, cerca de metade.
Aliás, neste valor dos impostos indirectos não está incluído o imposto sobre os produtos petrolíferos (gasolina, gasóleo, etc.), que rendeu, em 1986, 135 milhões de contos, mas que o Governo estima, em 1987, ascender a 150 milhões de contos, ou seja, mais 14 milhões de contos.
Acresce que, a comprovar o agravamento da injustiça fiscal, está ainda o facto de as receitas do imposto profissional e do imposto complementar (este considerado apenas em relação à parte relativa a rendimentos do trabalho) aumentarem 14,1 %, enquanto as receitas dos impostos directos que incidem sobre a propriedade e o capital, como a contribuição industrial, impostos de capital e outros, embora também aumentando, terem um aumento de menos de metade, ou seja, 6,6%.
Verifica-se ainda que o Orçamento, ao distribuir as verbas pelos diversos ministérios, atribuí aos Ministérios da Educação e Cultura, da Saúde, do Trabalho e Segurança Social e da Agricultura os menores aumentos percentuais, o que significa que são estes departamentos respeitantes a áreas essenciais os que são dotados pelo Governo de menores recursos. Áreas essenciais, dissemos, porque, convém relembrá-lo, quer a saúde, quer a segurança social, são direitos constitucionais dos Portugueses.
Finalmente, importa referir o que respeita à política do Governo quanto às empresas públicas.
Em primeiro lugar, deve recordar-se que a Constituição, além de consagrar o «desenvolvimento da propriedade social», alínea e) do artigo 80.º, estabelece ainda que incumbe prioritariamente ao Estado «zelar pela eficiência do sector público», alínea c) do artigo 81.º
À revelia da Constituição, e invocando avultados financiamentos que teria de fazer, tem vindo o Governo a prosseguir uma política de estrangulamento das empresas públicas. Ora, o que o Orçamento evidencia é a falta de verdade de tais afirmações, quer quanto àquilo que o Governo vai buscar às empresas públicas, quer quanto àquilo com que para elas contribui.
Assim, as transferências operadas pelo Governo das empresas públicas, que foram, em 1986, de 31,7 milhões de contos, passam, em 1987, para 48 milhões de contos, ou seja, aumentam 16 milhões e trezentos mil contos.
Por outro lado, as verbas de financiamento das mesmas empresas públicas, que totalizaram 107 milhões de contos em 1986, são, em 1987, reduzidas para 52 milhões de contos, ou seja, menos de metade!
Significa isto que o Governo tem uma estranha forma de zelar pela eficiência das empresas públicas; aumenta o que lhes vai buscar e diminui o que lhes dá! E ainda por cima se queixa!
Sr. Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Há um ponto em que estamos de acordo com o Governo: as Grandes Opções do Plano e o Orçamento espelham a política do Governo, a política real do Governo, que em vez de contemplar as carências e os dramas da população, especialmente das camadas mais desfavorecidas, como o Governo repetidamente tem afirmado, traduz uma orientação de sinal contrário, em benefício das camadas mais favorecidas.
Por isso, o MDP/CDE aqui deixou expresso um ponto de vista crítico e divergente em relação às propostas de lei das Grandes Opções do Plano e do Orçamento Geral do Estado.

Aplausos do MDP/CDE, do PCP e de alguns deputados do PS.

O Sr. Presidente: - Para formular um pedido de esclarecimento, tem a palavra o Sr. Deputado Alípio Dias.

O Sr. Alípio Dias (PSD): - Sr. Deputado Raul Castro, quero colocar-lhe duas ou três questões relacionadas com a sua intervenção.
Citando as receitas constantes do Orçamento para 1987 e procedendo ao seu confronto com as de 1986, V. Ex. º fala no agravamento da carga fiscal.
Quando procedeu a esse confronto teve o cuidado de se certificar se o conjunto de receitas fiscais que estava a considerar para 1987 era idêntico ao que estava a considerar em 1986? Concretizando melhor: teve presente, por exemplo, que em 1986 o IVA não foi arrecadado durante doze meses mas apenas durante dez meses? Teve em atenção que o Orçamento do Estado de 1986 não continha o imposto sobre produtos petrolíferos?
Uma outra questão tem a ver com o agravamento e os malefícios dos impostos indirectos.
Como sabe, esta é uma questão muito discutida, mas hoje, numa filosofia um pouco mais liberal, aceita-se que deixar rendimento disponível na mão dos cidadãos não será tão mau como isso. Depois, cada cidadão será tributado ou não, em função da utilização que fizer desse rendimento. Este é, realmente, um ponto sobre o qual gostaria que o Sr. Deputado reflectisse.